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novembro 12, 2007
28ª Bienal de São Paulo em brasa
28ª Bienal de São Paulo em brasa
Esta é uma série de reportagens acerca das mudanças na organização e na curadoria da 28ª Bienal de São Paulo
Bienal na mira , por Fabio Cypriano, Folha de São Paulo
Curadores anteriores criticam proposta, por Fabio Cypriano, Folha de São Paulo
"Agora a casa está arrumada", diz presidente, por Gustavo Fioratti, Folha de São Paulo
"Não há tempo para Bienal tradicional", por Gustavo Fioratti, Folha de São Paulo
Bienal de 2008 promete abrir as portas sem expor obras de arte, por Márcia Abos, Globo Online
Novo curador quer colocar a Bienal em "quarentena", por Fabio Cypriano, Folha de São Paulo
Em crise, 28ª Bienal não terá exposição, por Fabio Cypriano, Folha de São Paulo
Bienal na mira, por Fabio Cypriano, Folha de São Paulo
Matéria de Fabio Cypriano, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 12 de novembro de 2007
Curadores, críticos e artistas se dividem em relação à proposta da 28ª edição da exposição, em que não haverá obras de arte exibidas e andar inteiro ficará vazio
A proposta do curador Ivo Mesquita de deixar de organizar a 28ª Bienal de São Paulo num formato tradicional divide o meio artístico nacional.
O projeto prevê em 2008 um andar dedicado a uma espécie de arquivo histórico, com documentos e livros, um andar completamente vazio e o térreo do pavilhão aberto para performances e exibições de vídeos.
"Acho que é um luto internacional, a conclusão de uma administração ausente e desastrada, o Ivo está fazendo o papel de defunto em um enterro, é uma cooptação absurda", diz Nelson Aguilar, curador da 22ª e da 23ª Bienal de São Paulo. "Esse é um problema de cidade, é um erro de todos nós, não só dos conselheiros, as pessoas deviam ir para a rua e fazer alguma coisa."
Já Sheila Leirner, curadora da 18ª e da 19ª edição do evento, apóia o projeto: "Ivo foi um dos responsáveis por nossas bienais, tenho confiança no trabalho e nas idéias dele".
Responsável por uma das edições mais polêmicas da mostra, em 1985, a curadora vê semelhança entre os dois projetos. "De forma simbólica talvez à "Grande Tela", e no mesmo 2º andar, afinal teremos, 23 anos depois, o "Grande Vazio". Nada é mais necessário neste momento do que o vazio e pode ser bem mais difícil lidar com o vazio do que com o cheio."
A proposta de uma "quarentena" para a Bienal agrada alguns críticos e curadores, mas uma mostra sem arte seria o ponto fraco do projeto.
"Dada a crise vivida pela fundação, com dívidas financeiras e simbólicas, como a não-publicação dos catálogos da última Bienal, o que resta neste curto espaço de tempo é propor este "parar para pensar". Cabe sublinhar que a arte vai bem, o público tem comparecido em massa, o que anda mal das pernas é a instituição, mas uma coisa é certa: bienal "sem arte" é triste", afirma o curador e crítico carioca Luis Camillo Osório.
Segundo o curador pernambucano Moacir dos Anjos, "Em Vivo Contato", nome da 28ª Bienal, "poderá redefinir a missão da Bienal na contemporaneidade e recuperar a confiança e o respeito esgarçados em anos recentes".
Edição esvaziada
Mas nem todos os curadores gostam dessa idéia. "Eu preferiria ver trabalhos de arte que tratassem do vazio em vez de encontrar uma Bienal literalmente esvaziada, mas acho que a curadoria encontrou uma saída inteligente. Discutir estratégias das bienais interessa mais aos profissionais da arte do que ao grande público. Espero que a discussão sobre a instituição não ofusque a discussão sobre arte", diz Cauê Alves.
Galeristas também divergem. "Acho admirável o Ivo aceitar e tentar realizar algo viável frente ao caos da administração dessa presidência, mas acho lamentável que seja roubado de nós um dos poucos eventos de caráter internacional do país", diz a galerista Márcia Fortes, da Fortes Vilaça.
Para Eduardo Brandão, da galeria Vermelho, "frente à espetacularização das exposições, acho que é quase óbvio pensar nesse formato, exposições grandiosas estão falidas".
Entre os artistas, a divisão de opiniões também ocorre. "A idéia de um pavilhão vazio já é em si uma grande atitude artística conceitual", diz Paulo Climachauska. "É uma ampliação no entendimento do que é uma bienal, um movimento importante em favor da reflexão e uma afirmação a respeito do papel da instituição na cidade e no circuito artístico internacional", defende Carla Zacagnini.
Maurício Dias, da dupla Dias & Riedweg, é um dos críticos ao projeto: "Em São Paulo não faltam bons simpósios e praças vivas, o que falta é vigiar e conter a sucessão de erros administrativos e políticos da Fundação Bienal".
"Acho que um processo de reflexão pode ser bom, mas pensar criticamente a partir de documentos históricos, espaços vazios ou abertos à participação requer tempo e intensidade de trabalho e deveria ser um pressuposto para a realização de uma mostra de arte do porte da Bienal e não estar no lugar desta", afirma a artista paulistana Carmela Gross.
Contudo, segue ela, "enquanto os artistas e suas obras aparecerem como figuração fantasmática dentro uma estrutura fortemente armada em termos não-artísticos, acho difícil avançarmos".
Curadores anteriores criticam proposta, por Fabio Cypriano, Folha de São Paulo
Matéria de Fabio Cypriano, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 12 de novembro de 2007
Equipe responsável por edição de 2006 reclama de falta de publicações
Co-curadora espanhola ainda não recebeu por sua participação; "Obrigação era terminar o processo da 27ª Bienal", diz colombiano
A equipe curatorial da última Bienal de São Paulo, "Como Viver Junto", critica a instituição por iniciar um novo projeto sem ter concluído o anterior.
"Antes de começar qualquer outro projeto, inclusive a participação nas Bienais de Valência e Veneza, a obrigação da Fundação Bienal era terminar o processo da 27ª Bienal", afirma o colombiano José Roca, um dos co-curadores da mostra.
Para a curadora geral da 27ª Bienal, Lisette Lagnado, "é inadmissível que ainda se mantenha uma administração desacreditada, que não conseguiu honrar suas dívidas para com a última edição da Bienal. A falta de tempo e de dinheiro é conseqüência de uma incapacidade de captar recursos".
Quase um ano após o fim da mostra, os curadores aguardam as publicações programadas. "Até agora não se publicou o catálogo, parte da proposta de Lisette e do time curatorial, pois havia artistas que teriam participação apenas no projeto editorial. Tampouco se publicou o texto dos seminários, um espaço de discussão e reflexão da 27ª Bienal", diz Roca.
Participante da organização de várias bienais, a co-curadora espanhola Rosa Martinez diz ter sido a primeira vez que enfrentou situação parecida.
"Parece-me muito triste que a instituição mais prestigiada da América Latina esteja passando por essa crise lamentável, na qual se misturam corrupção, má gestão e falta de respeito aos trabalhadores. Não sou a única a não ter recebido os honorários, há dívidas com outros co-curadores e artistas. Isso não é só um problema econômico, mas de falta de ética institucional."
Mesquita, porém, é poupado das críticas. "Ainda bem que surgiu um profissional competente para aceitar a missão de dar continuidade a um evento historicamente tão importante. Se a instituição conseguir recuperar sua reputação internacional, terá valido a pena", diz Lagnado. Ele também é apoiado por outros curadores da Bienal anterior. "É uma proposta radical, mas coerente com este momento", diz o alemão Jochen Volz.
"Ela me parece bastante pertinente para um ano em que a Bienal está com o orçamento apertado e atravessa uma crise de identidade. O que me parece belíssimo, porém complicado para uma bienal sem muitos recursos, é o projeto de se retirar os vidros do piso térreo", diz Adriano Pedrosa, co-curador de "Como Viver Junto".
Na história das Bienais de São Paulo, a próxima terminaria um ciclo: "A 25ª e a 26ª mostraram os limites do modelo bienal em sua vertente espetacularizante, enquanto a 27ª sofreu as conseqüências institucionais de tentar recriar sua estrutura; já a 28ª tem a oportunidade de mostrar a instituição em toda sua nudez, literal e metaforicamente", avalia Roca.
"Agora a casa está arrumada", diz presidente, por Gustavo Fioratti, Folha de São Paulo
Matéria de Gustavo Fioratti, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 10 de novembro de 2007
O jeito foi embarcar no espírito de um velho ditado otimista que diz: "Há males que vêm para o bem". O presidente da Fundação Bienal de São Paulo, Manoel Pires da Costa, assumiu, em entrevista coletiva na sexta, que a crise de 2007 -sua administração teve de responder a uma série de denúncias ao Ministério Público- pesou na decisão de aceitar a proposta de curadoria de Ivo Mesquista, uma bienal sem artes plásticas.
No entanto, para o presidente, mesmo tendo surgido de um "verdadeiro vendaval", o projeto é "extremamente moderno".
Ivo Mesquita, também presente na coletiva, deu continuidade à defesa da idéia. Ele acha que o modelo da Bienal de Veneza, referência mundial das bienais, envelheceu.
"Os museus, galerias e espaços culturais, muito deles criados no entorno das bienais, já estão fazendo um papel muito parecido. As bienais precisam apontar um novo caminho."
Mesquita disse ainda que essa "reflexão" seria proposta mesmo no caso de haver tempo para o planejamento de uma bienal convencional. "É um projeto que eu faria de qualquer maneira. Uma espécie de grande conferência, para pensar de forma profunda."
A mostra de 2008, para o curador, funcionaria, portanto, como um "hiato" necessário para colocar os velhos padrões em xeque. "Não dá mais para seguir um modelo do século 19 em pleno século 21", disse.
"Acho que o modelo da primeira Bienal, de 1951, com sua proposta de lançar nossos artistas no exterior, já está logrado, já foi realizado."
Em relação à dívida financeira da Bienal com artistas, profissionais técnicos e diversas instituições, que participaram da última edição da mostra, Pires da Costa prometeu pagá-las até o fim do ano. Já sobre o catálogo da 27ª edição, diz que ele acabou de ser editado e está sendo impresso.
"Tive de enfrentar um verdadeiro vendaval, responder denúncias ao Ministério Público, conversar com autoridades, com o prefeito, com o governador. Mas agora a casa está arrumada e já estamos passando por um período de tranqüilidade", disse.
"Não há tempo para Bienal tradicional", por Gustavo Fioratti, Folha de São Paulo
"Não há tempo para Bienal tradicional"
Matéria de Gustavo Fioratti, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 10 de novembro de 2007
Para Pires da Costa, presidente da Fundação Bienal, projeto que descarta exposição é "extremamente moderno"
Pires da Costa afirma, em coletiva, que "falta de tempo no fim foi positiva, pois vai permitir reflexão sobre o papel da Bienal"
O presidente da Fundação Bienal de São Paulo, Manoel Pires da Costa, afirmou ontem que não há tempo para a realização de um projeto para a Bienal Internacional de Artes de 2008 no modelo usado para mostras anteriores. "Nosso tempo não é escasso a ponto de não podermos fazer uma Bienal, mas também não é suficiente para fazermos uma Bienal tradicional."
Segundo o presidente da fundação, esse foi um dos fatores centrais para a decisão de escolher um projeto -assinado por Ivo Mesquita, curador-chefe da Pinacoteca do Estado- que quebra uma tradição de mais de 50 anos: desde 1951, a Bienal se dedica a abrir espaço para artistas plásticos, nacionais e estrangeiros, das mais diferentes vertentes; para 2008, a curadoria deixa esses artistas em segundo plano. O projeto prevê um andar dedicado a uma espécie de arquivo histórico, com documentos e livros, um andar completamente vazio e o térreo do pavilhão aberto para performances, exibições de vídeos ou até mesmo festas. A programação ainda não foi definida.
Ao justificar sua escolha, Pires da Costa também se propôs a discutir o papel da Bienal Internacional de Artes de São Paulo, reafirmar sua função de apontar novos rumos no meio artístico. "Essa falta de tempo no fim foi positiva, pois vai nos permitir uma reflexão, não só sobre o papel da Bienal, mas sobre o papel das 200 bienais espalhadas pelo mundo. Todas elas estão procurando um caminho. Nós vamos fazer alguma coisa diferente. Considero o projeto do Ivo [Mesquita] extremamente moderno", disse.
Sobre a falta de tempo hábil, o presidente da fundação diz que 2007 foi um ano atípico, em que teve de responder várias denúncias relativas a sua administração, principalmente sobre a contratação de parentes para prestação de serviços à fundação e de uma empresa da qual é sócio, a editora TPT Comunicações, para produção de produtos da Bienal. O Ministério Público considerou que negócios entre a empresa de Pires da Costa, a TPT Comunicações, e a Bienal não trouxeram prejuízos à fundação.
Sobre as dívidas da fundação (cerca de R$ 3 milhões), Pires da Costa prometeu quitá-las até o fim do ano. A crise financeira também foi citada como um dos motivos da escolha do projeto, que, segundo o presidente da fundação, deve ter orçamento menor do que as mostras de anos anteriores.
"Cara a tapa"
Sentado a seu lado durante a coletiva, Ivo Mesquita diz que espera reações dos mais diversos tipos à sua idéia de curadoria. "Estou dando a cara a tapa", diz. "Mas espero que as pessoas se manifestem mesmo, espero um grande debate sobre o trabalho. Estou propondo um vazio, um hiato que funcione como um tempo de reflexão. Ou uma quarentena, por isso a Bienal vai ficar em cartaz por 42 dias." Em tom de brincadeira, Pires da Costa disse esperar uma divisão de opiniões no exterior. "Serão 20% contra a proposta e 80% a favor".
Durante a coletiva, Ivo Mesquita também foi questionado sobre uma possível rejeição do meio artístico a uma parceria assumida com uma administração que respondeu a tantas denúncias e que ainda tem dívidas financeiras com artistas chamados para a última Bienal. "Espero que falem na minha cara e não pelas costas. Sou um profissional técnico. Posso responder apenas pelo meu projeto, que é propor um espaço para reflexão", disse.
Bienal de 2008 promete abrir as portas sem expor obras de arte
Matéria de Márcia Abos, publicada originalmente no Globo Online, no dia 9 de novembro de 2007
A maior Bienal de Arte da América Latina está doente e vai passar literalmente por uma quarentena em sua próxima edição. O diagnóstico e a prescrição são do próprio curador da 28ª Bienal Internacional de São Paulo, Ivo Mesquita, que anunciou nesta sexta-feira que a mostra abrirá as portas ao público em outubro de 2008 sem expor uma única obra sequer. É polêmica à vista.
- Estou propondo um debate, chamando para uma conversa. Resolvi assumir e dar a cara para bater. É uma Bienal bastante polêmica e entendo se ela for controversa. Não haverá exposição no sentido formal. Odiaria ter que fazer uma exposição tampão, convidando artistas sem fazer uma pesquisa. Tive dez meses para preparar a Bienal, quando o prazo normal é dois anos. Fiz o que pude no tempo que tenho - disse Mesquita, que é o atual curador da Pinacoteca do Estado de São Paulo.
De acordo com o projeto de Mesquita, a 28ª Bienal vai durar 42 dias - o período clássico da quarentena. O térreo e o primeiro pavilhão do prédio serão transformados em uma praça. Os caixilhos e vidros que fecham a rampa de descida e o térreo serão removidos, seguindo o projeto original de Oscar Niemeyer. Nestes espaços, podem acontecer performances, concertos, apresentações de teatro, exibições de cinema e vídeo e shows. O segundo pavilhão estará totalmente vazio. O terceiro andar vai abrigar uma imensa biblioteca, contendo os arquivos de todas as Bienais de São Paulo desde a primeira, de 1951, e catálogos com informações sobre as cerca de 200 bienais de arte que existem hoje no mundo.
- A Bienal é um modelo de exposição do século XIX e estamos no século XXI. É preciso parar e repensar o que este modelo está fazendo e que tipo de imagem de arte ele passa. Será um exercício de reflexão sobre qual o lugar da Bienal hoje. Não acho que o modelo esteja esgotado, mas que ele precisa ser revisto. Estou propondo uma reflexão. Sei que estou fazendo uma curadoria mão pesada, pois teremos uma única instalação, que será o próprio prédio da Bienal, reformado segundo a proposta original de Niemeyer, e o imenso vazio do segundo pavilhão - explicou Mesquita.
A escolha do curador e do projeto da 28ª Bienal sofreu uma atraso de mais de um ano devido à profunda crise pela qual passa a atual administração da Fundação Bienal de São Paulo, presidida por Manoel Pires da Costa. Ele foi acusado de nepotismo ao contratar a seguradora na qual trabalhava seu genro, e uso da Fundação em benefício próprio, por usar serviços editora da qual é dono para prestar serviços à Bienal.
Alguns artistas até hoje reclamam que não receberam pagamentos da Fundação e um dos catálogos que trata dos seminários ocorridos na 27ª Bienal ainda não foi publicado. Manoel Pires da Costa passou a maior parte da entrevista de apresentação da 28º Bienal defendendo-se destas acusações, que segundo ele são quase todas mentirosas e motivadas por objetivos políticos de adversários que queriam seu cargo. Disse que foi inocentado das denúncias pelo Ministério Público.
- A Bienal de São Paulo tem graves problemas institucionais e de gestão, mas é a segunda maior e mais antiga do mundo. Sua importância permite que ela lance luz a todas as outras bienais do mundo. É tão importante quando a Bienal de Veneza - explicou Márcio Doctors, curador da Fundação Eva Klabin.
Doctors apresentou uma proposta para ser o curador da 28ª Bienal, mas acabou retirando sua candidatura. Chegou a cogitar fazer a curadoria em conjunto com Ivo Mesquita, dividindo a Bienal em doia períodos: a primeira parte em 2008, que abrigaria seminários e debates, e a segunda em 2010, quando aconteceria a exposição de fato.
- Não quero ser lembrado como o curador da Bienal que não fez uma exposição, por isso desisti da curadoria. A fragmentação do projeto original esvazia a noção de vazio criativo, fazendo com que o vazio seja sinônimo de nada - disse, explicando ainda que seu projeto visava preservar a Bienal em um momento de crise. No entanto, ele acredita que a fragmentação do conceito original em dividir a Bienal impedirá a compreensão do público.
- Tendo o projeto completo, as pessoas entenderiam o conceito. O segundo pavilhão vazio seria até uma afirmação de força. Com o projeto fragmentado, perde-se a clareza do conceito - concluiu.
Novo curador quer colocar a Bienal em "quarentena"
Matéria de Fabio Cypriano, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 8 de novembro de 2007
Ivo Mesquita diz que, com seu "gesto radical" de deixar vazio um andar do evento, pretende pôr em xeque a história da instituição
Conselheiros dizem que a proposta apresentada fere o estatuto da Bienal, que prevê a realização de exposição de artes plásticas
Ao deixar um andar inteiro do prédio da Bienal de São Paulo vazio, o curador Ivo Mesquita pretende causar uma pausa na história da instituição. "É uma quarentena, suspende-se um processo para colocar tudo em xeque. Creio que, do ponto de vista da imagem, é um gesto radical, que será bem acolhido", disse Mesquita, por telefone, de Buenos Aires, sobre o evento previsto para entre outubro e dezembro de 2008.
Ontem, conselheiros da Fundação Bienal se manifestaram contra a proposta de Mesquita, pois ela não seguiria o estatuto da Bienal, que prevê em seu objetivo a "exposição de artes plásticas". No projeto de Mesquita, "Em Vivo Contato", anunciado anteontem, em vez de uma mostra no formato tradicional, prevê-se um ciclo de seminários que irá durar 40 dias, além de uma praça para concertos e performances, e um andar que se transformará em biblioteca e arquivo.
"Meu projeto é esse, e é preciso entender que não há tempo para fazer uma exposição, pois é preciso pesquisa. A Lisette [Lagnado] fez o que considero uma boa bienal, pois teve dois anos para pesquisa a partir de um projeto", disse Mesquita.
Um dos curadores convidados a apresentar um projeto para a 28ª Bienal, Mesquita não entregou o projeto no tempo previsto. "Dois dias antes de encerrar o prazo, recebi uma carta da presidência pedindo para manter as representações nacionais e me posicionei contra essa imposição", afirmou. O único a apresentar o projeto foi Marcio Doctors, que desistiu ao saber ser o único candidato.
"Nós dois fomos procurados por conselheiros para reapresentar juntos um projeto, e achei que seria uma boa idéia. Em meu primeiro projeto, eu já previa um ciclo de seminários", disse o curador. Na última segunda, Doctors renunciou ao cargo, deixando Mesquita sozinho. Sem a lista de convidados definida, o curador indica como pretende usar a praça: "Imagine um espetáculo do Ivaldo Bertazzo, uma procissão do Zé Celso Martinez Corrêa, ou um show do Fischerspooner".
Mesquita assume a 28ª Bienal em meio a uma crise financeira da instituição, que não pagou grande parte dos gastos da edição passada, inclusive com curadores estrangeiros, nem tem previsão de publicação do catálogo do ciclo de seminários. Isso não pode afetar a imagem da instituição? "Não sei, mas vou verificar", disse o curador. O presidente da Fundação Bienal, Manoel Francisco Pires da Costa, realiza hoje à tarde entrevista coletiva na qual se pronunciará sobre o assunto.
Em crise, 28ª Bienal não terá exposição
Matéria de Fabio Cypriano, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 8 de novembro de 2007
Seminários irão ocorrer em 2008; mostra não vai seguir modelo usual
Estão previstos concertos, performances e andar inteiro vazio no pavilhão; Ivo Mesquita foi anunciado ontem como curador
A 28ª Bienal de São Paulo, que será realizada entre outubro e dezembro do próximo ano, não terá uma exposição no formato usual e um andar inteiro do edifício projetado por Oscar Niemeyer ficará vazio durante os dois meses do evento.
O curador Ivo Mesquita foi anunciado, ontem, como responsável pelo projeto, denominado "Em Vivo Contato", que prevê ainda um ciclo de conferências, uma praça, no térreo, para encontros e acontecimentos, como performances e concertos, e outro andar composto por uma biblioteca e um arquivo. Desde a primeira edição, em 1951, é a primeira vez que uma Bienal deixa de expor obras.
O processo de seleção do curador desta edição foi bastante tumultuado. Diversos curadores foram convidados a apresentar um projeto e se recusaram a entregar -entre eles Mesquita, que chegou a ser o responsável pela 25ª Bienal, e no centro de uma polêmica com o então presidente, Carlos Bratke, em 2000, saiu do posto.
Para a 28ª Bienal, apenas Marcio Doctors entregou um projeto para a instituição. Ao saber que havia sido o único, recusou-se a continuar no processo, mas, acatando um pedido do presidente da instituição, Manoel Francisco Pires da Costa, aceitou realizar um projeto em parceira com Mesquita.
Na última segunda, Doctors renunciou ao cargo, afirmando que o projeto proposto não seria cumprido na íntegra, pois ele teria um segundo momento, em 2010, com uma mostra que tivesse o vazio como tema.
"Propusemos deixar o segundo andar vazio, no próximo ano, para simbolizar a crise pela qual atravessa a instituição", disse Doctors à Folha.
Além do prazo exíguo para a organização da Bienal, diversos curadores não aceitaram participar em razão dessa crise. A atual presidência da Bienal esteve envolvida em várias polêmicas, neste ano, e chegou a assinar um ajuste de termo de conduta com o Ministério Público, por cometer irregularidades com a publicação "Bien'Art" e a contratação de parentes de Pires da Costa.
Financeiramente, a Fundação também atravessa dificuldades, pois ainda não pagou grande parte dos gastos com a 27ª Bienal, realizada no ano passado, como os de transporte ou os honorários da curadora espanhola Rosa Martinez, além dos catálogos da mostra não terem sido publicados.
No projeto divulgado ontem pela Fundação Bienal, Mesquita, que se encontra no exterior, afirma que "faltando menos de um ano para a próxima edição, não é mais viável montar uma grande exposição nos moldes habituais". Ainda de acordo com o projeto, "a Bienal precisa de um momento para reflexão, para sistematizar conhecimento e pertinência, uma vez que seu modelo original parece criticamente exaurido".
Ironicamente, as galerias paulistanas que organizam a mostra "Paralela", evento simultâneo à Bienal, já têm um curador, o mineiro Rodrigo Moura, e a exposição está sendo preparada. Contudo, sem uma exposição na Bienal, galeristas avaliam que o afluxo de curadores e colecionadores estrangeiros caia sensivelmente, colocando em questão a própria "Paralela".
O responsável pela 28ª Bienal de Arte de São Paulo, Ivo Mesquita, pretende organizar o evento de uma maneira diferente: uma bienal sem obras de arte. Sua proposta provocou um interessante debate.
O que é arte? Esta pergunta de quatro vocábulos já rendeu milhares de definições, centenas de livros e milhões de frases. Desde Aristóteles a arte ocupa o centro das cogitações e das discordâncias filosóficas.
Qualquer mortal que quiser definir o vocábulo "arte" irá penetrar numa floresta conceitual escura e será obrigado a atravessar um verdadeiro pântano de dúvidas. Caso vença todas as dificuldades ficará na alça de mira de todos que já percorreram o mesmo caminho e chegaram a destinos diferentes.
Não sou suficientemente atrevido para adentrar nos domínios da "arte". Sem ofender animais, vegetais e minerais, a única coisa que arrisco dizer é o seguinte: "arte" é um produto da atividade humana. Mas nem por isto todos os seres humanos são ou podem ser considerados "artistas".
O "artista" é uma espécie de xamã. Ambos exercitam a habilidade de transformar seus sentimentos e pensamentos em textos e objetos capazes de se tornarem objeto do desejo ou reflexão das outras pessoas. Por mais que não possamos compartilhar as experiências subjetivas de ambos, sabemos que alguém merece ser chamado "xamã" ou "artista" pelo simples fato de provocar alguma reação dentro de muitas pessoas. Mesmo que estas reações sejam qualitativa e quantitativamente diferentes.
Nas sociedades tribais o xamã ocupa um lugar de destaque. O mesmo destaque que os artistas e candidatos a artistas têm e pretendem ter nas sociedades que se autodenominam modernas.
Pelo pouco que estudei de antropologia descobri que os xamãs não estão isentos de trabalhar para manter seu próprio sustento ou, no mínimo, seu trabalho é manter as tradições e a coesão do grupo a que pertencem. Muitos artistas e candidatos a artistas acham que não precisam trabalhar e que o Estado tem a obrigação de sustentá-los.
O Estado não produz valor, apenas arrecada tributos. A massa de recursos gerenciada pelo Estado é muito, muito, muito, muito, muito maior do que a maior de todas as fortunas privadas existentes em qualquer sociedade politicamente organizada. Assim, desde que surgiram como resultado das guerras napoleônicas os Estados têm sido assediados pelos os artistas e candidatos a artistas (alguns dos quais estão menos preocupados com a "arte" do que com um meio de vida, como se o Estado pudesse ou devesse ser uma espécie de mecenas). Mas os recursos estatais para o financiamento e difusão da "arte" são limitados porque existem outras obrigações que o Estado tem que cumprir. É aí que a porca torce o rabo!
Que "arte" deve o Estado prestigiar? Quem são os artistas ou candidatos a artistas que merecem ser financiados pelo Estado? Quais são os critérios para escolher quem será o responsável pela administração dos recursos públicos destinados à arte e aos artistas e candidatos a artistas?
Para responder a pergunta proposta pelo JD eu precisaria estar em condições de responder as dúvidas que me surgiram. Confesso, entretanto, que não tenho competência para tanto. A única coisa que me ocorre dizer é a seguinte.
SE A BIENAL NÃO TIVER OBRAS DE ARTE NÃO IREI VISITÁ-LA!
Fábio de Oliveira Ribeiro
Eu, ibdem!!!
Posted by: GB at novembro 16, 2007 9:58 PMsugiro que o curador da 28ª Bienal de SP inclua nos temas de reflexão: ética, postura profissional e gestão de recursos públicos, assim como algum encontro que busque resgatar os aspectos inovadores da curadoria da 27ª Bienal que não foram devidamente reconhecidos, ao contário...
é saudável fazer justiça de vez em quando...
é importante esse "minuto de vazio"! pode ser pleno de potencialidades!
Posted by: Fabiana Eboli Santos at novembro 27, 2007 12:19 PMO "vazio" não para falar que é contemporâneo, mas sim um tempo de reflexão que cada observardor vai perceber, acho que o estar no vazio no momento trará um sentimento conceitual de um pequeno periodo de reflexão para si.
A ideia do vazio criará uma grande conceito paradoxo que pode trazer um momento de liberdade ou de fustração, isto só depente do extase da sensação.
Celestino Neto
Posted by: Celestino Neto at outubro 19, 2008 8:44 PM