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novembro 9, 2007
Um espaço em busca da identidade perdida, por Suzana Velasco, O Globo
Diretor do Centro de Arte Hélio Oiticica reconhece dificuldades, mas diz que local voltou ao 'ritmo normal'
Matéria de Suzana Velasco, publicada originalmente no Segundo Caderno do Jornal O Globo, no dia 8 de novembro de 2007
Com a mostra de fotografias de José Oiticica Filho, o Centro de Arte Hélio Oiticica (CAHO), inaugurado em 1996, voltou a ter uma programação de destaque, que sobressai depois da escassez de exposições nos últimos dois anos. O centro voltou ao debate na semana passada, quando o crítico de arte do GLOBO, Luiz Camillo Osorio, elogiou a alta qualidade da mostra, lamentando que não haja público para apreciá-la, já que o centro, nos últimos anos, não tem exposto com regularidade o acervo de Hélio Oiticica privado, pertencente à pela família do artista, que desde 1981 comanda o Projeto Hélio Oiticica ou de outros artistas. A crítica de Osorio foi rebatida por César Oiticica, irmão de Hélio, no último sábado, e agora é respondida pelo crítico do GLOBO (leia a carta).
O centro foi criado para abrigar o escritório do Projeto Hélio Oiticica e expor freqüentemente as obras do artista. A promessa não cumprida de uma reserva técnica para os trabalhos de Oiticica fez com que a família retirasse as peças dali, em 2002, e construísse sua própria reserva. Não deveria haver qualquer prejuízo para a programação do CAHO, mas essa retirada coincidiu com o declínio na freqüência das mostras.
Diretor do centro desde 2003, Luciano Figueiredo - excurador do Projeto Hélio Oiticica - admite que nos últimos dois anos a programação contínua foi interrompida, devido a uma redução no orçamento da secretaria das Culturas, impedindo a realização de exposições e a publicação de livros.
- Com a exposição de José Oiticica Filho, o centro supera o período difícil por que passou e retoma o ritmo normal, com a previsão de novas exposições de obras inéditas de Hélio Oiticica e outras de artistas internacionais, com programa a ser anunciado em breve - promete Figueiredo.
Procurado pelo GLOBO para falar da atual situação e dos rumos do centro, o secretário municipal das Culturas, Ricardo Macieira, não deu entrevista ao jornal, limitando-se a enviar um e-mail burocrático: "O Centro de Arte Hélio Oiticica nunca esteve abandonado. Nos últimos dez anos, foram realizadas 170 ações culturais importantes para a cidade do Rio de Janeiro: 35 lançamentos de livros; 94 palestras, seminários e cursos; e 41 exposições (...), consagrando o CAHO como um dos mais importantes espaços culturais do Rio de Janeiro dedicado às artes visuais (...)". À lista de mostras realizadas, seguem-se considerações sobre a importância de José Oiticica Filho.
De 2005 para cá, CAHO abrigou apenas duas mostras
Figueiredo, diretor do CAHO quando o centro foi criado, desligouse do espaço em seis meses, voltando a ele em 2003, a convite de Macieira e César Oiticica.
Sua gestão começou com a mostra "Hélio Oiticica: cor, imagem, poética", que ficou um ano e meio cartaz, seguida da retrospectiva de François Morellet, e de "Cosmococas", de Hélio Oiticica e Neville D'Almeida, em 2005. A partir de então, o CAHO só cedeu espaço para galerias de arte do Rio realizarem a exposição "Arquivo geral", no ano passado, e agora abriga a mostra de José Oiticica Filho.
- Um contrato intitulado "termo de permissão de uso" previa a implantação de reserva técnica a ser construída pela secretaria de Cultura da época (de quando o centro foi criado, em 1996) para abrigar o acervo de obras de Hélio Oiticica. Como isso nunca se deu, desliguei-me do CAHO - diz Figueiredo.
- Após o desligamento, a secretaria continuou a ignorar os termos do contrato, desvirtuou por completo os objetivos principais do CAHO e negligenciou o apoio ao acervo de obras de Hélio Oiticica, de propriedade de César e Claudio Oiticica.
O que tanto Figueiredo como César Oiticica rebatem é o argumento de que a retirada das obras da reserva do CAHO tenha relação com a falta de atividades do local. Segundo eles, não faz diferença a localização do acervo, mas sim o modo como ele é utilizado. César conta que tenta captação de recursos na Lei Rouanet para montar uma exposição dos penetráveis de Hélio Oiticica: - A mostra do José Oiticica Filho estava programada há três anos, mas custa R$ 250 mil. Nem a prefeitura tem todo o dinheiro nem nós conseguimos captar tudo. Eu mesmo anunciei exposições que não foram realizadas - reconhece.
- O centro não foi construído com dinheiro público para abrigar a obra do Hélio. A prefeitura estava com um elefante branco, um prédio bonito e restaurado. Surgiu a idéia de abrigar o escritório e o acervo do Projeto Hélio Oiticica, que estava num apartamento alugado no Flamengo. Mas o contrato da prefeitura nunca nos obrigou a manter as obras lá.
Além da falta de verbas, a maior parte das obras de Oiticica estava sendo restaurada no Museu de Houston, que prepara um catálogo raisonée do artista. Depois seguiram para a Tate Modern, em Londres, que acabou de realizar uma grande exposição de Oiticica.
Agora, as obras voltam ao Projeto Hélio Oiticica.
- Preferia fazer como a Tate, mas primeiro há que se equacionar as políticas públicas de artes plásticas e conseguir dinheiro.
Vai mudar o governo, vão botar outro cara lá. E tem tudo pra dar errado, porque os governos não têm continuidade das políticas - diz César.