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novembro 6, 2007
SOS Parque Lage, por Alessandra Duarte, O Globo
SOS Parque Lage
Matéria de Alessandra Duarte, originalmente publicada no Jornal O Globo, no dia 5 de novembro de 2007
Espaço fará mostra e leilão de 40 obras de artistas brasileiros para ajudar em sua revitalização
A partir de hoje, o público poderá conferir obras de arte que devem ser o início da salvação do Parque Lage. Até o próximo domingo, dia 11, o privilegiado espaço no bairro do Jardim Botânico vai abrigar uma exposição gratuita com cerca de 40 trabalhos de alguns dos principais artistas brasileiros; nesta sexta-feira, as obras serão leiloadas, e a renda, utilizada na revitalização do parque. Esta é a primeira ação da nova diretoria da Associação de Amigos do Parque Lage (Ameav), que assumiu no primeiro semestre de 2007, para sanar as finanças do local, hoje com um déficit mensal de cerca de R$20 mil. O leilão beneficente integra ainda um processo maior de recuperação do Parque Lage e de sua Escola de Artes Visuais, que inclui a ida de recursos do Fundo Estadual de Meio Ambiente (Fecam) para a reforma do espaço, de propriedade do Ibama. A concessão do imóvel federal ao governo estadual, vencida desde maio, também será renovada.
As obras expostas nas instalações do Parque Lage e que serão leiloadas levam a assinatura de um time formado por 37 artistas plásticos contemporâneos, a maioria de reconhecimento internacional, como Tunga, Ernesto Neto (integrante da nova Ameav), Anna Bella Geiger, Adriana Varejão, Beatriz Milhazes, Cildo Meireles, Daniel Senise, Nelson Leirner e Raul Mourão. Os lances mínimos devem ser de R$3 mil, com convites a R$500 (nesta sexta-feira, dia do leilão, a exposição não será aberta à visitação pública).
Como meta, a criação de responsabilidade cultural
Para convencer muitos dos artistas a doarem suas obras para o projeto, a Ameav chegou a levar umas duas horas de conversa com cada um. A resistência a participar é explicada pela situação do Parque Lage nos últimos dez anos: um rombo que faz a administração só conseguir pagar metade de seus custos por mês; a conservação inadequada da estrutura física do imóvel; a falta de condições de ensino, como ausência de computadores e de equipamento audiovisual nas salas de aula; e o imbróglio com o Ibama, já que é permanente a necessidade de renovações da concessão ao estado.
- Nos últimos anos, o Parque Lage foi abandonado pelo governo estadual. E sua Associação de Amigos sempre foi voltada para o próprio parque, sem conversa com a sociedade. Quando os artistas ou colecionadores participavam, era apenas como mecenas, para ajudar com dinheiro o parque e a escola a "irem indo" - ressalta Márcio Botner, diretor da galeria Gentil Carioca e um dos integrantes da nova diretoria da Ameav. - O que mais queremos é, além de obter ajuda financeira, fazer com que as pessoas desenvolvam uma responsabilidade cultural.
- É por isso que pensamos nesse leilão como o primeiro de outros - acrescenta o colecionador Fabio Szwarcwald, outro novo diretor da Ameav (que conta ainda com Paulo Vieira, Jaqueline Vojta e Guilherme Gonçalves; o novo diretor da escola é Carlos Martins), citando mais uma ação planejada pela entidade. - Queremos fazer com que artistas se tornem padrinhos das salas de aula da escola do parque: cada sala levaria o nome de um deles, em troca de ajuda financeira. Isso é feito em muitos museus pelo mundo. Nunca foi pensado para cá porque o Parque Lage nunca foi visto como uma empresa cultural, só como algo dos seus professores e alunos, o que é bonito mas não sustenta.
A relação dos professores com o parque também está na mira da nova diretoria. Até hoje, o Parque Lage nunca trabalhou com professores fixos, contratados. Agora, está estudando a possibilidade de manter o antigo vínculo apenas para parte dos professores, fazendo um contrato de trabalho com outros, para dar mais capacidade de planejamento aos seus cursos.
Os novos ares para o parque vêm ainda da Secretaria estadual de Cultura. A secretária Adriana Rattes, que assumiu há dois meses, planeja transformar a Ameav numa organização social, para que ela funcione legalmente dentro do modelo que Adriana pretende implantar nos equipamentos culturais estaduais: fundações e órgãos que se mantêm públicos, mas que passam a ser geridos por organizações sociais ou por grupos privados.
- As instituições estaduais que funcionam como escolas de arte, como a do Parque Lage, estavam espalhadas pela estrutura do governo. A Escola de Teatro Martins Pena, por exemplo, foi parar na Faetec (Fundação de Apoio à Escola Técnica)! Queremos incluir as escolas nessa nova gestão da cultura estadual - diz Adriana Rattes, adiantando que no início de 2008 enviará à Assembléia Legislativa projeto de lei que cria a possibilidade de gestão pública compartilhada com organizações sociais e entes privados. - No caso do Parque Lage, vamos também financiar sua reforma com verba do Fecam e tentar com o Ibama uma renovação da concessão por mais 20 anos.
Uma das artistas com obras no leilão, Beatriz Milhazes acompanhou de perto o parque por 27 anos. Ela se diz otimista com a ação no local, mas alerta:
- O Parque Lage precisa encontrar uma solução definitiva para a relação com o Ibama. Enquanto isso não for feito, será como gastar energia e dinheiro numa casa que não é sua.