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julho 28, 2005
Falta de verba ameaça museu afro, por Fabio Cypriano
Falta de verba ameaça museu afro
Matéria de Fabio Cypriano, originalmente publicada na Folha de São Paulo do dia 28 de julho de 2005
Secretário de Cultura afirma que instituição "contraria a Constituição"
Aberto no dia 23 de outubro do ano passado, no parque Ibirapuera, uma das últimas inaugurações da gestão Marta Suplicy, o Museu Afro Brasil, pode encerrar suas atividades antes de completar um ano. Com patrocínio da Petrobras de cerca de R$ 4,2 milhões, a instituição tem apoio garantido apenas até o próximo domingo.
Segundo Carlos Augusto Calil, secretário municipal de Cultura, em nota divulgada ontem, o museu foi criado "contrariando o que determina a Constituição Federal" e "sem que fossem garantidos à instituição recursos orçamentários ou quadro de funcionários, necessários à sua continuidade e estabilidade".
O secretário de Cultura, ainda segundo a nota, afirma que há três alternativas para a preservação da instituição: a criação do museu, em nível municipal, mediante lei a ser enviada à Câmara de Vereadores, destinando-lhe dotação orçamentária e quadro de pessoal, tornando-se assim um museu municipal; sua criação como uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) ou, ainda, como uma fundação de direito privado a ser instituída a partir da vontade de seu curador, em ambos os casos independente do poder e das verbas municipais.
Em qualquer um dos casos, a solução para o impasse não se resolve a curto prazo, situação que inviabiliza a manutenção de 47 funcionários no museu. Como solução emergencial, no entanto, Calil diz contar com "recursos remanescentes do patrocínio da Petrobras [que] serão aplicados para mantê-lo vivo e bem aberto".
Entretanto, de acordo com Paulo Cauhy, do Instituto Florestan Fernandes, organização responsável pela implantação do museu, "a verba remanescente está empenhada em projetos em curso e, para ser usada na manutenção da instituição, eles precisam ser cancelados e a alteração aprovada pelo Ministério da Cultura e pela própria Petrobras". Caso isso ocorra, estariam disponíveis R$ 115 mil.
"Com esse dinheiro conseguimos funcionar por, no máximo, mais dois meses", diz Emanoel Araujo, criador e diretor do museu, que não vê com bons olhos a proposta da transformação do museu em fundação ou Oscip. "Esse museu trata de um assunto que deveria ser parte fundamental de uma política pública, pois é um tema relevante da nossa história e esse é um país onde essa questão sempre é adiada. Claro que o museu está baseado numa coleção que é minha, mas ele é mais do que isso", afirma Araujo. Mesmo assim, o curador diz que vai resistir: "Só sairemos como Antonio Conselheiro em Canudos: abatidos por canhão".
Enviado por Oliver Cauã Cauê olivercauacaue@hotmail.com
Museu Afro Brasil e CEUS, duas faces do mesmo problema
Parece-me sintomático de uma já conhecida postura política a falta de eficiência com que a secretaria da cultura e a da educação vem tratando os problemas de suas respectivas pastas. Creio que estamos no fundo diante da mesma questão, a sistemática mania de desconstruir o que já foi feito, pouco se importando se existe mérito ou não no já edificado. Vejamos:
A postura do secretário municipal de cultura diante do Museu Afro Brasil ou é de descaso ou é de falta de compreensão sobre a importância de tal espaço. A grande visitação que o museu alcançou em tão pouco tempo já seria motivo suficiente para que a prefeitura procurasse contornar os problemas causados pela maneira como ele foi instituiído. Não fosse a visitação o bastante, vale notar que em pouco tempo o museu tornou-se referência - uma das melhores, senão a melhor do país - sobre a questão da herança cultural africana. Eu mesma estive no museu com diversos pesquisadores do Brasil e do exterior visitando-o e pensando algumas questões que o museu suscita. A implementação da biblioteca tornou ainda maior a sua relevância para a compreensão da cultura nacional.
Se o secretário não consegue perceber tal importância é caso de ir para casa e ficar lá meditando até que consiga compreender isto. Até lá talvez pudéssemos ter na pasta alguém que possa entender o que esta acontecendo e possa trabalhar para regularizar a situação. Se o problema não é de percepção, trata-se de pura e simplesmente desmanchar o que já foi feito para que a atual gestão deixe a sua "marca" na cultura municipal. Se para isso é necessário destruir o que já foi feito com prejuízo para a cidade - ou melhor, para o país - qual o problema? O que realmente conta e fazer notar-se. Num país onde dinheiro viaja até em cueca de assessor parlamentar falta de verba soa como desculpa esfarrapada diante da evidente falta de vontade política em solucionar o problema.
A mesma lógica torta parece estar por trás da questão dos CEUS. Já é bastante estranho colocar uma pessoa que construiu uma sólida carreira na área da saúde à frente da pasta da educação mas todos sabemos que alianças políticas devem ser cumpridas a fim de assegurar a tal governabilidade. Discordando ou não da lógica eleitoreira que levou a construção dos tais "escolões" eles já estão ai, a estrutura já esta montada e nada justifica a desativação gradual dos projetos culturais que lá aconteciam, a não ser as idéias já comentadas no parágrafo acima e o descaso com o dinheiro público, uma vez que edifícios e materiais já adquiridos irão fatalmente deteriorar caso esta situação permaneça.
Com este ponto de vista não pretendo fazer a defesa de tal ou qual partido político. Se há alguma coisa a ser defendida neste instante é a cultura do município, que esta sendo desmantelada rapidamente e sem consideração para com a população, que é quem de fato paga as contas e portanto merece um serviço digno, respeito e um melhor uso de seu dinheiro.
Posted by: Rosana Paulino at agosto 6, 2005 12:54 AM