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outubro 13, 2004
Papel de Bienal é mostrar o novo - Romí de Liz entrevista Ivens Machado
Entrevista de Romí de Liz, "Papel de Bienal é mostrar o novo", publicada originalmente no Diário Catarinense, no dia 7 de outubro de 2004.
"Papel de Bienal é mostrar o novo"
Entrevista: Catarinense Ivens Machado, que representa o Brasil na mostra paulista, diz que Santa Catarina não privilegia a arte
Romí de Liz
O artista plástico catarinense Ivens Machado foi o escolhido para representar o Brasil na Bienal de Artes de São Paulo. Com 37 anos de carreira artística, desenvolvida principalmente no Rio de Janeiro, ressente-se em nunca ter apresentado suas peças em Santa Catarina - e não é por falta de vontade sua, frisa.
Nesta entrevista, o ilhéu fala sobre as críticas que os curadores da Bienal têm recebido pela seleção de poucos trabalhos de artistas conhecidos e desfia sua verve sobre as peças de outros representantes mundiais, que cercam a sua obra. Como sempre faz, Ivens deverá vir rever a família e descansar em Florianópolis, no final do ano, período em que deixa a arte um pouco de lado e mergulha no mar da Praia do Campeche.
A obra da Bienal
- É um tipo de trabalho que venho fazendo há anos. Há a incidência da madeira, que sempre usei, mas antes não era com este tipo de insistência, com esta intensidade. Essa acumulação é um trabalho novo, apesar de muitos artistas trabalharem este conceito. A escultura trabalha com a transformação, redesenha e também dialoga com o espaço em torno.
Artistas reconhecidos
- Se formos falar sobre as críticas à Bienal por não ter artistas conhecidos, é um ranço meio acadêmico. Na verdade, tem muitos artistas conhecidos, o que não tem são muitos artistas bons. Isso é uma coisa da Bienal. Se fizer um paralelo entre o meu currículo e o que os críticos e os jornalistas creditam como conhecido, eu sou muito conhecido. Sou um artista da maior importância no contexto da arte brasileira e mesmo no contexto da arte internacional, mas eu não sou o nome da onda. Veja os artistas que foram escolhidos para as salas especiais, como o Barrio, por exemplo, e a Bia Milhazes, que dentro do campo da pintura, representa na Bienal o melhor trabalho. São pessoas da maior importância, mas a imprensa é muito débil, só reconhece aquilo que já se conhece. Não se pode reduzir a arte brasileira, internacional, a 10 nomes.
As peças
- O que está sendo mostrado na Bienal é uma tragédia. Se pegar a área onde eu estou, só há trabalhos insignificantes em torno. Lúdicos, como o Fusca que parece que vai fazer um rali em cima da minha peça, depois o do dinamarquês do outro lado. Aquilo tudo é insignificante, deveria estar no parque, para brincadeira. Papel de Bienal é mostrar o novo. E exposição de históricos não é papel da Bienal, é papel de museu.
Incentivo à arte
- Santa Catarina, como cultura - embora existam artistas muito importantes - se colocou fora do mapa. É um governo que não privilegia a arte, que não trabalha em cima desta imagem. Diria que o Estado está fora do mapa. Eu, casualmente, sou catarinense, mas não tive nenhuma ajuda, nem nada. Nunca fiz exposição no Estado, nem a última montagem, que estava no Estado ao lado, pôde ser viabilizada. Imagina se o governador fosse meu antagonista, mas ele é meu primo (em terceiro grau). Na verdade, SC nunca privilegiou, infelizmente, não só artistas, como não privilegiou arte. Isso é uma coisa que sempre aconteceu. Tem um museu (Masc) com um projeto que não se realiza porque não há dinheiro.
A cultura em SC
- Este governo, especialmente, acha que, porque deu uma certa relevância à dança, já pagou o seu compromisso com a cultura. O que é uma pena. Na verdade, é um governo que não sabe dançar, porque está engessado por uma idéia inculta. Isso se deve, especialmente, às pessoas que cercam o governador. Fazendo um paralelo com o Paraná (não tenho nada a ver politicamente), mas a ênfase que ele tem dado à arte fez com que o Paraná, e Curitiba especialmente, entrasse no circuito nacional. Florianópolis não está em circuito nenhum, nem turístico, porque o governo não sabe a importância da imagem visual. É claro que, para este investimento, não só financeiro, falta também vontade política. O Luiz Henrique teria esta visão, porque já percebeu como foi significativo o trabalho que fez em Joinville. Se ampliasse isso, o Estado se integraria numa coisa nacional.