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junho 26, 2018
Estratégia para o desafeto por Renata Laguardia
O projeto Estratégia para o desafeto começou durante minha estadia na França. A minha constante sensação de não-pertencimento, de falta de lugar e da perda de sentido da palavra “lar”, me levou a colecionar fotografias de imóveis à venda e para alugar, em sites de classificados online. Esses ambientes frios, vazios e sem-afetos me fizeram desenvolver uma série de pinturas onde retrato os ambientes das fotografias com chãos vermelhos, anunciando uma violência pungente.
Com a minha volta ao Brasil, a pesquisa toma outros rumos e adquire novos significados, uma vez que a noção de pertencimento aqui é mais alcançável. Desenvolvi pinturas que retratam detalhes banais de casas: descargas, pias, maçanetas… comecei a desenvolver uma iconografia da morada, baseada em noções coletivas e individuais do conceito de lar. Esse interesse foi tocando diversos pontos, desde as flores que cultivamos entre quatro paredes, até quartos que, ainda que mobiliados, revelam pouca ou nenhuma individualidade e afetividade. Em outros casos, com o design antigo dos móveis, estes quartos podem nos remeter ao passado e nos fazerem relembrar casas de familiares antigos que frequentamos. Me interessei também pelo que frequentemente vemos envolta às casas, para a proteção contra o outro: grades, cacos-de vidro, cercas elétricas.
A parte do projeto em que me encontro é a de frequentar perícias requisitadas pelo governo a assistentes sociais. Tenho comparecido a algumas visitas às casas de pessoas em situação de elevada pobreza, para que, após avaliadas, possam receber ajuda do governo. Fotografo esses ambientes e tento explorar seus mais diversos aspectos. Acredito que a noção plena de casa se afirma aí: desde os móveis, às roupas-de cama, aos porta-retratos na parede, às bagunças ou organizações.
Acredito que essa exposição é uma briga entre o afeto e a estratégia para o desafeto. As pinturas juntas, como palavras, formam um léxico próprio e podem ser interpretadas como frases.
Renata Laguardia, graduada em 2013 emArtes Visuais pela Universidade Federal de Minas Gerais, com habilitação em pintura. Em 2017 conclui seus estudos de mestrado na Ecole Européenne Supérieure de l’Image, na França, com menção honrosa da banca. Já participou de 5 exposições individuais dentre elas “Nem tudo tem que ser pra sempre”, que expos na biblioteca Epifânio Dória em Aracaju e na Casa Fiat de cultura em Belo Horizonte. Expôs também a série intitulada “O que não é vasto é raso” no Memorial Minas Gerais Vale em belo horizonte. Dentre as diversas exposições coletivas que participou, destacam-se o Prêmio Diário Contemporâneo na Casa das Onze Janelas em Belém, Douze façons remarquables d’utiliser une brique, no Centro de Arte Contemporânea Les Bains Douches em Chauvigny, Limitrocidade na Aliança Francesa e Habiter la frontière no Confort Modern. Realizou também a exposição “Occuper l’Amovible” em decorrência de uma residência de duas semanas no Espace 23 em Poitiers. Desde 2013 suas obras fazem parte do acervo da galeria Celma Albuquerque em Belo Horizonte.