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julho 17, 2015
Um olhar mais sensível para o mundo por Felipe Scovino
Um olhar mais sensível para o mundo
FELIPE SCOVINO
As exposições de Sylvia Furegatti, Hebert Gouvea e do Pparalelo possuem em comum o caráter de se constituírem como ações colaborativas, entendendo o processo artístico como um processo de doação entre sujeitos. Quero afirmar que entendo as criações poéticas aqui exibidas como corpos metafóricos, e mais do que isso, como entidades orgânicas que precisam estabelecer redes de troca para se constituírem finalmente como presença no mundo.
Com base nesses modelos tangíveis de sociabilidade, os artistas buscaram reorientar sua prática, sem abdicar da expertise técnica ou da produção de objetos em especial nos casos de Furegatti e Gouvea, em direção a um processo de troca intersubjetiva. Os desenhos sob a “pele” das plantas, em meio a um arquipélago, põem em suspenso o tempo e o espaço do museu pois nos é sugerido o convívio e a descoberta com aquele coletivo orgânico assim como acontece com o aspecto de camuflagem, reflexo e jogo óptico que paira sobre as estampas de diferentes matrizes, criando um diálogo arquitetônico com o espaço e o corpo do espectador.
Em todas as três exposições, o interesse foi diminuir o estranhamento e acentuar práticas colaborativas desafiando a territorialização da identidade convencional com uma compreensão plural e polifônica do sujeito. Ao enfatizarem que o Pparalelo não é um coletivo de artistas mas um corpo mutável que se faz através de ideias e da doação de todos que participam em torno daquele projeto momentâneo, ficamos diante de um dilema importante para as artes visuais na contemporaneidade: os participantes do Pparalelo, fixos ou temporários, acabam por afirmar que o artista não atua como “artista político”, mas como um artista que “faz arte politicamente”. Se pensarmos numa função para a arte, ela reside precisamente na sua habilidade de desestabilizar e criticar as formas convencionais (ou distorcidas) de representação e identidade. Portanto, ficaram evidentes nas ações colaborativas desses artistas que a arte não tem, de fato, qualquer conteúdo positivo, mas é o produto de uma forma intensamente somática de conhecimento: a troca de gesto e de expressão, e as complexas relações que regem a comunicação entre os indivíduos e a maneira pela qual elas são registradas no corpo.
O efeito da prática da proposta colaborativa, tanto espacial quanto processual, assim como o aspecto de organicidade que compõe os trabalhos desses artistas são elementos que refletem sobre um estado que se converte de forma cada vez mais madura sobre o caráter interdisciplinar da arte, isto é, perceber o fenômeno artístico não apenas como um objeto estético mas fundamentalmente como um estímulo que gera um grau de autorreflexão sobre o estado das coisas no mundo. Perceber a delicadeza e a qualidade corpórea das plantas ou dos tecidos e chamar a atenção para a própria troca como práxis criativa e elemento de câmbio social nos permite ao menos ter uma visão menos dura sobre a realidade, torno o nosso olhar mais sensível ao que acontece ao redor. E isso definitivamente não é pouca coisa.