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fevereiro 27, 2015
Paisagens Não Vistas - Marcos Chaves por Ligia Canongia
Paisagens Não Vistas - Marcos Chaves
LIGIA CANONGIA
Parcela considerável da obra de Marcos Chaves pode ser compreendida como um paisagismo contemporâneo, dada a imensa produção do artista voltada para a paisagem e as cenas urbanas. Não se trata, obviamente, do paisagismo da tradição, como o das pinturas contemplativas do Renascimento e das paisagens clássicas de Poussin. Tampouco se reporta às telas românticas de Turner e Delacroix, envolvidas por percepções interiores e impulsos passionais.
O enfrentamento da paisagem se expande desde Cézanne, tornando a natureza não mais um objeto a ser contemplado, mas a razão para instaurar a unidade homem-natureza que requer o sentido crítico do olhar e o fundamento moral da relação do homem com seu meio. Com a modernidade, o surgimento das metrópoles e a expectativa das massas, a paisagem deixa de ser o lugar utópico e meditativo da era pré-industrial, passa a constituir domínio ideológico diverso de um mero espaço físico e exige algo além de visões elevadas.
A relação de Marcos Chaves com a paisagem enfatiza a observação moral moderna; mais ainda, evoca aspectos culturais e políticos que as paisagens e o espaço urbano escamoteiam em suas formas imediatas de aparição. Em todo o conjunto da obra, marcadamente crítica, o artista acrescenta sentidos mordazes e ácidos à vida cotidiana, numa produção que ironiza, a um só tempo, a estética da contemplação, a mirada turística e o poder público.
A função ética da obra do artista, que se justapõe a seus aspectos formais, atesta sua atenção aguda aos subtextos das formas e ações corriqueiras, propondo, ao invés, releituras críticas da realidade. Permeada pela ironia e o humor, “Paisagens não vistas” investiga o contexto da natureza no mundo contemporâneo, desmistificando sua lógica histórica, suas convenções e formalidade.
A exposição traz um conjunto vasto de trabalhos, de 1990 aos dias de hoje, realizados em fotografias, objetos e vídeos. Com ela, sublinha-se o caráter lúdico e político tão peculiar ao artista, cuja lógica transversal surpreende sentidos e valores desconcertantes nas cenas e coisas ordinárias do mundo.