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novembro 23, 2014
Telefone sem Fio: do Oiapoque ao Chuí por Luciana Magno e Solon Ribeiro
Telefone sem Fio: do Oiapoque ao Chuí
LUCIANA MAGNO E SOLON RIBEIRO
Antes de colocar o pé na estrada, de percorrer, por carro/casa/estúdio-móvel, aproximadamente 6.000 km por rodovias e hidrovias do Norte ao Sul do país, uma única certeza era nossa fiel companheira a bordo: a impossibilidade de decifrar racionalmente o enigma de um Brasil. “Brasis” poderia ser então a sua denominação mais justa, uma pista, um mapa, uma indicação da pluralidade a que estávamos a ser inseridos.
A rota vertical foi desenhada da maneira que a gente pudesse percorrer e documentar minimamente um pouco de cada uma das cinco regiões políticas do País através de 32 cidades* entre os estados do Amapá, Pará, Maranhão, Tocantins, Goiás, Distrito Federal, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Para entendermos a geografia extra política, optamos por uma metodologia não específica, não definida nem definidora. Transcender o campo teórico se fazia necessário para um outro saber. Um jogo. Ser levado pelo acaso, um acaso a que procurávamos e não somente dos deixávamos ser atingidos. Dessa forma, a geografia do corpo a corpo se mostrou mais do que uma ferramenta útil na descamação dos enigmas e sim um posicionamento preciso aos embates contínuos dos percursos. Um correr risco. Um estar aberto para não decifrar e ser devorado.
Começamos o traçado no Oiapoque, a primeira cidade ao norte do País, e findamos no Chuí, A cidade situada no extremo sul brasileiro, tendo como pontos de fricções de fronteira a Guiana Francesa e Uruguai. A língua portuguesa ao norte permanece mais intacta que ao sul, no Chuí onde uma espécie de portunhol ecoa pela cidade dado ao transito livre de pessoas e mercadorias estabelecida pelo acordo do Mercosul. Ao Norte, como toda a historia vem apresentando sobre a região amazônica, a questão fica um pouco mais violenta. Ilhados por um rio, os amapaenses e brasileiros de vários lugares do país que migraram para aquela região na promessa do ouro e de uma vida melhor, não possuem o mesmo transito livre que a Guiana francesa. E a carne e o suor continuam a ser atrativos do país tropical abençoado por Deus e pelo HIV.
Todos os meios tecnológicos utilizados durante o projeto para a sua documentação se revelaram aquém da complexidade da grandeza a que ele ia se desvendando, como um filme que se vive dentro do filme, aquilo que no momento final não é exposto na tela. Toda documentação pode ser acompanhada no site http://lucianamagno.com/telefonesemfio/ onde um mapa interativo com demarcações das 32 cidades pode ser acessado, assim como em breve o documentário resultado final do projeto. No site se revela um não lugar, não lugares, os séculos parecem ter deixado o homem cansado de tantas informações. A vida brilha mais forte do que o cinema 3D. Talvez a única função do artista hoje seja inventar. Uma outra linguagem. Nesse tempo da invenção, a linguagem é inventada durante o percurso, em conjunto com os interlocutores do Brasil, ao vivo. O On line é um outro tempo.
E Porque o encontro com o outro é sempre delicado, sutil e enigmático, vai indicando caminhos a serem percorridos. A Trilha musical torna o tempo ameno. Entre chuvas, sóis e névoas o retrato vai se colorindo. Um outro índio, embates de produção de alimentos e uso da terra, invenções de crenças, desmatamentos, a utopia plantada no planalto central, a oficina do teatro do prazer. Ao sul outras experiências orgânicas, um projeto pós modernista, uma obra aberta. Sorrisos de Alice, cidades no Brasil tentando decifrar-se a si mesmas.
Luciana Magno e Solon Ribeiro
*Oiapoque, Calçoene, Ferreira Gomes, Macapá, Belém, Mãe do Rio, Ulianópolis, Açailândia, Imperatriz, Montes Altos, Araguaína, Guaraí, Paraíso do Tocantins, Alvorada, Porangatu, Barro Alto, Brasília, Pirenópolis, Araguari, Uberaba, Ribeirão Preto, São Paulo, Registro, Barra do Turvo, Curitiba, Florianópolis, Arroio do Silva, Gravataí, Porto Alegre, Santa Vitoria do Palmar, Pelotas e Chuí