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setembro 25, 2013
Clemens Krauss por Felipe Scovino
Clemens Krauss, Galeria Laura Marsiaj, Rio de Janeiro, RJ - 04/09/2013 a 10/10/2013
FELIPE SCOVINO
As figuras que habitam as pinturas de Clemens Krauss não possuem rosto. Não conseguimos identificar quem são elas. Em muitos casos, apenas distinguimos o gênero. Mas essa suposta negação, nos faz crer que elas podem ser qualquer uma de nós. Há uma identificação às avessas. Ao obliterar o rosto enquanto possível foco da composição e dar ao óleo um tratamento borrado e impreciso, Krauss desvia a nossa atenção para o que é frequentemente visto como o centro psicológico da composição – o rosto humano – para outras partes e características da pintura. Suas pinturas parecem se desfazer, ao mesmo tempo em que apontam uma dinâmica própria e veloz ao óleo. Por outro lado, o artista promove uma concentração da tinta que faz com que a pintura ganhe um efeito óptico, como se ela estivesse saltando do plano para o espaço e quisesse conquistar uma tridimensionalidade. Esse acúmulo de óleo nos permite visualizar o modo como o artista traça suas linhas e constrói, com gestos vigorosos e tinta encorpada, uma atmosfera que remete a trágica contingência do sujeito. A ideia de incerteza que ronda a pintura de Krauss cria um diálogo perfeito com o vídeo ER, feito em parceria com Benjamin Heisenberg. O filme documenta a vida de um personagem fictício conhecido como ER. Ele é um menino, descrito como psicopata, que chantageia seus pais com explosões de raiva e simulação de ataques epiléticos. Com tomadas feitas de forma amadora e uma edição que remete a colagens (circunstâncias que podem ser encontradas em sua pintura, em especial no tom “errático” que neste suporte pode ser revelado na desordem ou no “desfazer” dos corpos), uma voz gerada por computador relata a estória do menino, mas em várias passagens, o áudio não corresponde ao texto. Além disso, a total falta de emoção na voz digitalmente gerada contribui para criar a atmosfera de estranheza e dúvida. Um sentimento de hesitação sobre a pessoa descrita aos poucos consome o espectador, e nessa experiência que Krauss está interessado: pôr em dúvida as nossas certezas sobre o mundo, e afirmar a obra de arte como um enigma, uma imagem que necessita a todo o momento ser revelada e refletida pois as suas significações estão sendo constantemente refeitas.