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agosto 22, 2012
Arte Contemporânea: Marcelo Solá por Enock Sacramento
Arte Contemporânea: Marcelo Solá
ENOCK SACRAMENTO
Texto originalmente publicado no livro Arte Contemporânea, da editora Alexa Cultural, em 2011.
Em seu “Para não se esquecer”, Clarice Lispector afirma que “o que atrapalha ao escrever é ter que usar palavras”. E que, se pudesse escrever por intermédio do desenho, jamais “teria entrado pelo caminho da pala¬vra”. A declaração, feita por uma das mais significativas escritoras da língua portuguesa no Século XX, fala da sedução e da fluidez do desenho, de seu poder de síntese, de dizer muito com pouco, e remete à sua vocação de confundir-se com o desejo. Com efeito, a raiz de desenho e desejo é a mesma: designio.
O artista goianiense Marcelo Solá é, sobretu¬do, um desenhista que utiliza com frequência vários materiais na fatura de seu trabalho: grafite, óleo, esmalte sintético e spray. Em seus trabalhos inclui com frequência palavras e números. Afirma: “Quando estou escre¬vendo, estou desenhando, e quando estou desenhando, estou escrevendo”. Ele realiza, a seu modo, o ideal de Clarice, mas não abre mão da palavra como desenho na construção de sua gramática visual. Com linhas, cores e ritmos, ele desenvolveu uma linguagem vi¬sual que o destaca no panorama do desenho contemporâneo brasileiro.
Esta linguagem geralmente assenta-se no uso, sobre um fundo claro, de podero¬sas manchas negras que se articulam com campos de cor vermelhos – que às vezes escorrem como sangue - laranjas e de outras cores e que dialogam com grafismos que remetem a construções, plataformas, becos, escadas, janelas, aviões. Neste contexto, Solá inclui códigos, às vezes invertidos, e palavras reveladoras de seu desejo de lançar mão de todos os recursos para captar e transmitir significados.
O desenho de Marcelo Solá remete a um abismo, um vazio absoluto e ilimitado no qual parecem estar inseridos, em estado de pré-existência, pessoas, coisas, animais, concei¬tos. Mas não se trata do caos primordial que teria dado origem ao mundo primitivo, mas de um outro do qual se originaria uma nova cidade. Quando Solá desenha, uma forma pede outra, ou uma palavra ou uma cor, num ato de automatismo psíquico. Ele quer entender o espaço por meio do desenho. O artista desenvolveu uma linguagem e articula formas, cores, ritmos e texturas de forma pessoal, resultando uma obra plástica per¬feitamente identificável. Solá é também um adepto da monotipia, gênero situado entre a desenho/pintura e a gravura, e no qual revela domínio e segurança. Seja qual for o meio de que utiliza, Solá trabalha com formas caóticas, mas com notável coerência plástica.
Sua carreira teve início em 1900, quando participou da II Bienal de Artes de Goiás, que lhe valeu prêmio de Viagem a Paris. Desde então sua obra esteve presente em numero¬sas exposições coletivas, entre elas a Bienal Internacional de São Paulo de 2002 e realizou 20 individuais.
Enock Sacramento, Arte Contemporânea. São Paulo: Alexa Cultural, 2011.
"Sua carreira teve início em 1900"?!
Wow...então o Marcelo não aparenta ter nem um décimo da idade!