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outubro 18, 2010
Leve-me para ver o grande espetáculo no Queens, por Roberta Smith, The New York Times
Texto de Roberta Smith originalmente publicado no New York Times em 27 de maio de 2010
Artistas emergentes no P.S. 1 MoMA
Para obter o efeito completo de "Greater New York", o circo multimídia de arte nova que se apoderou do P.S. 1 MoMA em Long Island City, Queens, libere sua agenda, arrume tampões de ouvido, e seja grato por toda e qualquer substância e revelação que venham ao seu encontro.
Esta mostra, uma investigação acerca de artistas pouco conhecidos e emergentes trabalhando em Nova York, foi criada em 2000 e é montada a cada cinco anos. Mais do que outras versões, a atual é uma bem-vinda sacudida no mundo da arte de Nova York –em escopo, ambição e diversidade de coisas que dá a você para pensar a respeito. Espalhando a obra de 68 artistas por um prédio imenso, "Greater New York" conduz à impressão de que ser jovem e fazendo arte nesta cidade é uma coisa maravilhosa.
Mas se a mostra tem alguns estimulantes pontos altos, eles parecem menos abastecidos por arte do que por uma energia artística difusa, compartilhamento inspirado de poder curatorial e um otimismo inexplicável. Talvez o entusiasmo derive de se ver o maior e mais flexível espaço de arte contemporânea em Nova York ser posto em uso tão extensivo. Muito freqüentemente, porém, "Greater New York" provoca a sensação de uma miragem, com ausência de evidências concretas. Tem obras potentes, mas nem de longe o suficiente delas.
A mostra foi organizada por Klaus Biesenbach, diretor do MoMA P.S. 1 e curador-chefe geral em sua instituição parente, o Museum of Modern Art; Connie Butler, curadora-chefe de desenhos no MoMA; e Neville Wakefield, conselheiro curatorial sênior do MoMA P.S. 1. Ela expressa aprovação, da boca para fora, a todas as pedras de toque do momento: arte feita coletivamente, o efêmero, participação do público, temática política, arte como vida, arte como documentário, arte como interação social.
A principal missão de "Greater New York" parece ser provar, a partir do interior, não apenas que a performance art é o meio dominante do nosso tempo mas também que aspectos dela se infiltraram em todas as outras formas, inclusive aquela da própria exposição de arte.
Dominada por vídeos, abarrotada de performances e pontuada com outras obras que estão em processo de alguma forma, "Greater New York" tem algo de uma estrutura organizacional mutante, viral. Alguns dos artistas selecionados convidaram colaboradores para trabalharem com eles, ou recomendaram outros para o programa de performance da mostra. A programação de oito páginas menciona leituras de poesia, artistas em residência (e horário comercial), performances colaborativas, encontros de grupos, estúdios e ensaios abertos, e "um longo happening experimental". Começa a soar um pouco como acampamento de verão.
Vista da instalação timecompressionmachine (2010), de Franklin Evans
Contribuindo, além disto, para toda a atividade, cinco curadores independentes vão organizar, cada um, uma mostra de cinco semanas dentro da mostra durante os quatro meses e meio de duração de "Greater New York". (Infelizmente, a primeira, "As Baterias de Bagdá", uma exposição coletiva de múltiplos meios abrangendo várias gerações, organizada por Olivia Shao, é muito palidamente conceitual.) Os curadores também, talvez por preguiça, cooptaram algumas individuais recentes em galerias, movendo "Greater New York" para longe de sua tradição de descobrir artistas. Mas, neste caso, as fotografias anti-Cindy Sherman de K8 Hardy e a instalação imersiva de pintura e desenho de Franklin Evans são pontos altos, assim como o são esforços por Tommy Hartung e Leidy Churchman.
É raro ver uma mostra que deposita tanta fé nos artistas —ou que canaliza a generosidade, a imaginação, a paixão e a destreza social deles com tamanha habilidade— enquanto presta tão pouca atenção às obras de arte em si. Há galerias demais com praticamente nenhum incentivo a parar e olhar. É difícil sentir qualquer necessidade para fazê-lo quando os curadores não parecem ter olhado, ao menos não com prolongada franqueza, rigor e curiosidade desinteressada. O aspecto mais pesaroso é a pintura, a maioria da qual é realmente "pintura", abordada com ironia e pressionada em direção à escultura, ao vídeo ou à performance. O sr. Churchman é o único pintor que se sustenta. Aqui ele se move com facilidade do falso-naïve dos desenhos homoeróticos em madeira para a pintura-como-performance-como-exorcismo dos vídeos para as esculturas de mesa sem perda de concentração.
Vários trabalhos escultóricos vão se modificar de forma perceptível conforme a exposição progride. O Bruce High Quality Foundation, o coletivo de arte mais em voga atualmente, encheu uma galeria com pedestais de escultura brancos e imaculados de diferentes tamanhos. Eles estão disponíveis para escolas de arte se substituídos por outros, velhos e usados. Por agora os pedestais disparatados parecem uma escultura de Sol LeWitt em rebelião.
Outros trabalhos em processo são muito devedores da desgastada fórmula da xícara de chá forrada de pele: combinar objetos ou materiais que não são freqüentemente encontrados juntos e esperar que as pessoas digam wow. David Brooks juntou de maneira séria um pedaço de floresta tropical típica e o inundou com concreto —algo entre um Robert Smithson indoor resumido e uma paisagem por George Segal— em protesto pela destruição da natureza pela indústria. As plantas cobertas vão morrer e se decompor, desmoronando em uma espécie de happening em câmera lenta.
Em um registro mais luminoso, Saul Melman está dourando o há muito ocioso aquecedor do prédio com folha de ouro. David Adamo cobriu o chão de uma galeria com tacos de beisebol, arranjados perfeitamente em fileiras, ponta com cabo, e apropriadamente batizou o resultado "Untitled (Rite of Spring)" [Sem título (rito de primavera)]. Atravessar esta superfície é algo de um ato de equilíbrio da parte do espectador, e ao final da exposição terá uma cor completamente diferente.
Still do vídeo Grayscale (A Video in Three Acts) (2009-10), de Deville Cohen
Nada disso oferece a vídeo, performance e fotografia muita competição. Alguns poucos dos trabalhos nestes meios são relativamente elaborados, ainda que feitos com uma objetividade faça-você-mesmo. A videoperformance de 18 minutos de Deville Cohen, "Grayscale (A Video in Three Acts)", certamente uma paródia de Matthew Barney, centra-se em uma trupe de homens vestidos de mulher em saltos improvisados que descobre usos inesperados para material de escritório e inspiração surpreendente nos elementos básicos de um lava-rápido. "Ascent of Man", do sr. Hartung, um tributo à famosa série da BBC, é maravilhosamente poético e utiliza jogos de mesa improvisados com resultados alternadamente grandiosos e cômicos.
Porém, em sua maioria, os melhores esforços nestas mídias são mais elementares, compartilhando um impulso de revelar processos básicos: vida sendo vivida ou arte sendo feita, e a vulnerabilidade que ambos exigem. Um dos exemplos mais intensos e perturbadores é o trabalho de Leigh Ledare, que utiliza fotografia e vídeo para documentar sua relação altamente erotizada com a mãe e os efeitos disso em sua própria sexualidade. O sr. Ledare está fazendo um espetáculo sensacional de si mesmo e de sua claramente perturbada progenitora, mas ele também está nos levando a fundo à escuridão e tormento que movem muitos artistas.
Da mesma forma sem rodeios é a incrível acumulação de fotografias de A. L. Steiner, que cobre duas amplas paredes com imagens de vida e amor lésbico, uma concatenação agressiva e celebratória intitulada "Angry, Articulate, Inevitable". A obra aplica o ideal minimalista do "apenas uma coisa depois da outra" a unidades de informação altamente pessoais. Uma abordagem similar se encontra no evocativo filme de 16 minutos de Dani Leventhal, uma seqüência de cenas curtas, quase de instantâneos fotográficos, intitulada "54 Days This Winter 36 Days This Spring for 16 Minutes".
Unbranded: Reflections in Black by Corporate America 1968-2008, de Hank Willis Thomas
Em outros casos, a estrutura é ditada pela realidade, como no imponente mas também tedioso "China Town", de Lucy Raven, uma animação fotográfica com áudio que acompanha a produção de fio de cobre das minas de Nevada às fábricas da China, e no processo revela paisagens devastadas e vidas reduzidas pelo poder bruto e a escala imensa da indústria. "Unbranded: Reflections in Black by Corporate America 1968-2008", de Hank Willis Thomas, apresenta 41 pares de fotografias, classificadas de forma sucinta, que revelam um outro tipo de desolação: o desempenho da publicidade negra ao longo das últimas quatro décadas.
Em uma das peças mais itinerantes da mostra, o artista de videoperformance Ryan McNamara, que tem corpo de dançarino e senso musical, mas nenhum treino, vai usar as galerias como um estúdio de dança. Rodando com uma barra móvel e um espelho, ele vai ter aulas com profissionais de dança de todos os tipos (clássica, moderna, exótica) ou apenas alongar-se e praticar. Em qualquer um dos casos, visitantes podem observar ou participar.
"Make Ryan a Dancer", como a obra docemente corajosa do sr. McNamara é intitulada, é uma de várias aqui que examinam a distinção entre amador e profissional. Naama Tsabar realiza algo similar, além de mais gritante, com duas impressionantes placas de alto-falantes de oito pés de altura que ela chama de paredes-falantes. Visitantes podem dedilhar as várias cordas de guitarra amplificadas que correm de cima abaixo e por trás destas placas. É aqui que entram os tampões de ouvido, especialmente se você quer ver qualquer coisa nas imediações.
"Greater New York" é como o proverbial córrego: sempre em fluxo. Você vai querer colocar seus pés dentro mais de uma vez.
Tradução de Juliana Monachesi