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setembro 24, 2009
Ao debruçar no tempo... , por Marília Sales
Especial para o Canal Contemporâneo
Como causar estranhamento no sujeito contemporâneo que está inserido em um contexto complexo do espaço urbano? A estrutura da megalópole sorve com avidez qualquer sinal de subjetividade, bombardeia de informações – sons, imagens, notícias, propagandas – a ponto de apagar as especificidades dos lugares, do sujeito, da cultura.
A produção apresentada por Esteban Pastorino na exposição Argentina Hoy no CCBB-SP (2009) provoca o olhar para uma percepção pausada do fluxo contínuo de informações da cidade - nos cansamos de afirmar e teorizar que a forma comum e aprendida da vida contemporânea não nos a deixa perceber - direcionado por suas intervenções nas imagens.
Um conjunto de imagens fotográficas em grande formato que apresentam uma paisagem urbana clicada de um ponto aéreo. Grandes construções, transportes e objetos que aparentam brinquedos. Num rápido olhar as imagens se apresentam como registro de maquete reforçado pelo efeito desfocado em suas bordas.
A região central da imagem é bem definida e no entorno falta foco. A proporção dos elementos das imagens provoca uma confusão de idéias sobre real e simulacro. A representação da paisagem, um lugar ideal quase utópico, desprovida de vida humana, um ambiente frágil.
Os elementos da cidade estão grifados pela negação, as imagens não apresentam a profusão de informações de uma metrópole. Percebe-se um percurso de construção da visualidade que não nos ensina a ver a cidade, mas a compreender o papel que desempenha enquanto veículo comunicativo da cultura – idéia proferida em artigo por Lucrécia D’Aléssio Ferrara.[1]O artista escolhe uma área a ser registrada e insere no seu olhar fotográfico o acaso: uma série de imagens aéreas feitas por uma câmera acompanhada de um controle remoto presa a um papagaio. A câmera em uma pipa é uma maneira de estender o olhar - idéia vinda desde o surgimento da fotografia, a máquina como extensão do olho.
Embora a fotografia não precise mimetizar a realidade, quando nos deparamos com uma imagem fotográfica de uma paisagem, em algum momento pensamos sobre o ponto de observação do artista / fotógrafo. Um ponto de vista apressado, ordenador do mundo na medida do homem.
A estrutura da imagem contemporânea, distinta da modernidade pela articulação entre linguagens de várias naturezas, não se limita ao domínio do tempo e espaço, a palavra de ordem desde as vanguardas é subversão. Artistas se debruçam sobre o tempo que pulsa e brincam com a cadência que determina a fruição do espaço. Ainda não se esgotou o debate sobre o estatuto do signo fotográfico e ainda há muito por dizer.
//[1]// In: Lucrécia D’Aléssio Ferrara. Cidade e Imagem: entre aparências, dissimulações e virtualidades. Revista Fronteiras – estudos midiáticos Vi(1), Unisinos: janeiro/junho 2004