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dezembro 2, 2008
Em busca do lugar comum, o elusivo território que promete cumprir a promessa de revelar arte por toda parte, por Alberto Simon
Tudo o que você queria saber sobre a Bienal mas nunca teve coragem de perguntar
Teria a maçã de Newton de Lévi-Strauss caído aqui?
Claude Lévi-Strauss contou que antes de aprender a ler ele já era estruturalista, porque quando saía às compras com sua mãe, reconhecia o que havia em comum no bou das placas da boulangerie (padaria) e da boucherie (açougue). A base do estruturalismo é faculdade humana de se reconhecer padrões ou estruturas com maior ou menor grau de semelhança, mesmo quando ocultas sob aparências dessemelhantes: no caso das referidas placas, o componente estrutural podendo ser reconhecível a olho nu até por um pré-escolar. Agora o brasão da Boulangerie Bienal, no Itaim Bibi em São Paulo, requer dessa faculdade um esforço em um grau mais ‘universitário’, para que uma relação com o evento cíclico das artes visuais no Parque do Ibirapuera possa ser estabelecida. Contido no nome do bairro onde se situa a panificadora, está o que aparenta ser um bônus que potencializa as possibilidades de desdobramentos, mas aqui o bi-bi será descartado e não terá o papel chave que o bou-bou teve na formação do menino Claude: bastará a tentativa de se estabelecer uma relação entre a Bienal (pães) e a Bienal (mega-evento dedicado às artes visuais ano-sim, ano-não).
Já se ouviu muito falar que o tatuzão desconstrutivista ‘parece’ ter ‘aparentemente’ esbarrado no fundamento do Edifício Estruturalista, fazendo com que esse perigosamente pendesse para o lado, obrigando os ocupantes do ‘é difícil’ pôr em prática o compulsório plano emergencial do corre-corre. Mas uma vez passado o susto, puderam as neuro-ciências cognitivas experimentais – aquelas de laboratório, com avental e instrumentos sofisticados – demonstrar que a resiliência da construção permite que essa ainda possa, nos dias de hoje, com segurança abrigar a faculdade – que tem 1001 utilidades e é acessível a quem possa interessar.
O fato de Lévi-Strauss ter passado uma fase tão fundamental de sua vida no Brasil – e tendo morado e lecionado site-specifically em São Paulo – talvez justifique a tentativa, ainda que diletante, do uso mais ou menos sistemático de uma metodologia menos recém-transplantada e mais enraizada. Faz parte do código da ‘contemporaneidade’ das artes visuais um estado geral de karaokê que valoriza o amadorismo, talvez por via da legitimação que termos como ‘apropriação’ ou sampling conferem à certas práticas artísticas. Como já dizia Cole Porter:
Good authors too who once knew better words,
Now only use four letter words
Writing prose,
Anything goes.
Um templo? Uma igreja? Não, um prediozinho residencial ao lado da Esfiharia Efendi numa travessa da São Caetano, a rua das noivas desnudadas pelos celibatários seguidores do culto que se criou em volta do milagreiro duchampiano-piano-se-va-lontano, padroeiro dos apropriadores do conceito da idéia do pronto-para-vestir, até.
Como resposta à pergunta sobre origem e razão do nome do estabelecimento, recebi a informação que os atuais donos compraram a padaria há cerca de quatro anos, mas que ela já existe há quase quarenta; além disso, existem outras nove padarias em diversos bairros de São Paulo com o mesmo nome, sem que façam parte de uma rede: motivo e razão da escolha do nome se revelam aqui insondáveis, perdidos na espessa neblina de um passado nada remoto. Minha embarcação estruturalista colide com o iceberg da indiferença dos meus informantes, naufraga em plena maiden voyage.
Em situações assim é difícil resistir ao apelo que uma outra faculdade humana oferece, a de se buscar sentido, de se querer atribuir significados para aquilo que per se somente descreve um fenômeno cósmico, em tempo e espaço: um ponto fixo na elipse que o planeta Terra percorre em volta do sol, isso tudo multiplicado por dois. Dá-se obrigatoriamente de encontro com o aborrecido paradoxo semântico, que instiga raciocínios toscos do tipo “considerando-se que qualquer padaria com um mínimo de auto-estima quer sempre deixar bem claro que ‘pão quente a toda hora’ é de rigueur, por que então?...” ou “na Boulangerie Bienal vê-se claramente um caso de desacoplamento de significante e significado de seu estado bruto, etimologicamente correto (...) é familiar entre nós brasileiros o que bi, tri, tetra ou penta querem dizer; numa vertente paralela, bi, tri, quadri e qüinque não provocam tanta emoção: seria isso sinal de que anda em baixa a nossa tão apregoada latinidad, visto que quando competem entre si as partes da herança greco-romana, pulsa a veia helenística mais animadamente?”.
Tendo adquirido um estabelecimento com tradição, reputação e clientela, os novos donos não viram necessário colocar em questão a viabilidade do nome, muito menos investigar a sua validade trinta e seis anos após a sua fundação. A “bienal” do brasão vira emblema que não quer contradizer o frescor do pão da hora, anunciando “pão quente a cada dois anos”: como tantos outros nomes de estabelecimentos, edifícios, marcas e modelos de bens de consumo (assim como títulos de obras de arte), ele evoca, ‘aponta para’ ou ‘remete a’, sem ter que representar factualmente qualquer relação entre duas coisas. A evocação pode evocar meramente uma imagem ou sensação sem nenhum significado, ou seja, ela pode evocar um significado vazio de significado. Para ilustrar: o escritório de despachante chamado “documenta” é menos só evocativo e exemplo de auto-referencialidade funcional.
Obra assinada pela dupla Amador & Severo, de inspiração visivelmente franklloydwrightiana, o Museu Aberto de São Paulo foi imediatamente interditado pela prefeitura após a sua inauguração, ocasião atendida por alguns milhares de visitantes que presenciaram as performances “Despindo-Armani-Prada: descendo a rampa até a calçada” e “Vestindo blusa preta, dormindo na sarjeta” da top Lisa de Garment. Apelidado pela população paulistana de ‘cubo branco’ e pela crítica especializada de ‘rectum’, a controvertida obra aguarda o parecer da comissão que investiga irregularidades estruturais na construção que radicaliza o conceito de transparência e permeabilidade nas instituições públicas. Setores da sociedade representantes do neo-liberalismo, críticos da política de reserva de mercado que incentiva a produção do ‘similar nacional’, fazem uso freqüente dessa obra como metáfora ‘quando querendo explicar exatamente aquilo o que eles estão querendo dizer’.
Um contexto que possibilite que se enxergue a Bienal e a Bienal em perspectiva - e a partir daí eventualmente de se estabelecer um link - pede um reconhecimento da topografia e um mapeamento em escala maior da situação geográfica encontrada: ambas a padaria e a instituição se situam dentro do perímetro urbano da cidade de São Paulo, que como tantas outras pelo mundo afora, toma diariamente um banho de imersão em seus caldos de fabrico próprio, vindos esses tanto ‘direto da fábrica’ quanto ‘direto da roça’ e compostos dos lugares-comuns, estereótipos e clicheés que povoam as suas mitologias.
Estando delineados os contornos do macro, parte-se em seguida em busca do micro, zoomando-se agora em direção ao Parque do Ibirapuera: aqui se encontra de forma exemplar o que se denomina de oposições dentro de um sistema constituído de partes simétricas que identificam a estrutura do mito, um must em qualquer investigação estruturalista: a representação da oposição feminino-masculino, ou seja, a Oca e a Bienal do Oco – mas, de novo, isso seria apelar para o impulso de se fazer trocadilho fácil e explorar uma ‘sacadinha’, algo incompatível com o fetiche que eu mantenho com a noção de rigor metodológico e nada condizente com o pastiche de artista conceptuelle com postura críptica, dentro do qual a minha persona pública insiste em me aprisionar.
“Abordada a questão de inflamabilidade, fez-se o uso subversivo da ação hidratante sobre a combustão, com a finalidade de enfatizar as profundas ramificações contidas na prática de extinguí-la”. Nossa cultura, artística e linguística, passa por um momento de auto-emulação, com o fim de serem reexaminados seus conteúdos já exauridos de rótulos. A estrutura que serve de invólocro aparentemante resiste a toda sorte de abalos e encontra-se assim na privilegiada posição de poder conservar intacta a sua fachada.
Nunca me interessei pelos convites (sejam esses publicados como anúncios no jornal, distribuidos na forma de folderzinhos ou ainda pintados em letras grandes diretamente no local onde o motivo do convite se encontra em exposição) que me sugerem, em tom afirmativo: “visite apto. decorado”. Se sinto curiosidade em ver como os outros moram, de espiar para dentro das casas, não tenho particular interesse pela encenação da moradia modelo; prefiro visitar o “apto. não decorado” e caso sentir necessidade, “dar asas à imaginação” ou também não imaginar a nada, seguir com os olhos o percurso rasteiro do rodapé, até que esse, abrupto, colida com o batente. Não sei bem a que ou a quem se refere o termo horrore vacuum, mas seja o que for, ao menos tipograficamente sinto-me apto a dizer que não me inspira pavor (ha!).
Foi com essa inclinação natural, ou seja, de simpatizante, que visitei a 28ª Bienal e, sem querer entrar em detalhes ou acionar de novo o interruptor liga/desliga dos jogos semânticos, achei o projeto um acerto em cheio, literalmente.
Há no entanto um detalhe que exige o olhar mais atento: o segundo andar, com sua escala monumental e concepção fundamentada no austero rigor do serialismo (que aqui categoricamente não faz concessões ao ornamento), nunca deixa de causar forte primeira impressão; já numa segunda visita, despontam o que me parecem ser inconsistências na realização do projeto: enquanto as duas fileiras centrais de colunas, que percorrem a extensão longitudinal do andar, não poderiam de forma melhor expressar a sua função de pilares de sustentação, as outras duas fileiras, alinhadas paralelas entre as centrais e as fachadas, demonstram, após mais atenta inspeção, terem sido ditadas pelo impulso maneirista; enquanto a duplicação enfatiza com veemência o rigor serial, ela simultaneamente renega, com igual veemência, esse mesmo procedimento: com a intenção de representar o enunciado less is more, acaba inadvertidamente balbuciando “pão pão, queijo queijo”; e visto que, quase integradas na fachada, encontram-se, discretas, colunas menores, deveriam ser essas justamente as que, se maiores, compartilhariam a sustentação da estrutura, podendo dessa forma manterem-se fiéis ao princípio que guiou o projeto, por via do ato de abster-se da necessidade de causar estardalhaço. O genuíno exercício da abstinência engendraria o equivalente do efeito que, sabidamente, a prática do jejum voluntário consigo traz.
Pois desabaria a estrutura sob seu próprio peso com outra distribuição dos alicerces, deixando em seu rastro, uma vez baixada a poeira, a montanha de escombros que pomposamente jazeria sobre a sua própria fundação? O similar nacional do ground zero? O chão agraciado com o alvará de permissão do uso do termo de appellation contrôlée, já que haveria de ser o segundo mais antigo do mundo?
Então não seria hora também de se reinterpretar o significado do MASP, de se tentar dar novas leituras a essa que é expressão máxima do vão livre? São questões que valem ser debatidas: mas quem garante que o resultado de tanto debate não seja uma 29ª que atulhe de novo o pavilhão até a borda com quadros, estátuas, televisores e instalações em geral?
Localizadas em meio a um oásis de tranqüilidade, envoltas por bosques, lagos, alamedas arborizadas e ciclovias, as icônicas edificações podem ser rapidamente acessadas desde o Aeroporto de Congonhas pela via expressa que tangencia o complexo. Os bairros vizinhos de Villa Nova Conceição, Moema e Villa Mariana oferecem inúmeras opções nas compras, na gastronomia aventureira e cultura ‘white-trash’. Contando com vagas para mil e tal automóveis, o complexo atrai semanalmente milhares de visitantes que aqui encontram o ar puro, lazer e ambiente relaxante que a vasta expansão verdejante propicia. Enquanto isso, o isolamento acústico de última geração do esguio pavilhão (à esq. na foto) permite que os debates e controvérsias que ocorrem no seu interior possam se desenrolar acirradamente e atingir os altos níveis de decibel condignos do teor passional daquilo de que se trata, do que é objeto ou matéria de consideração, atenção e interesse.
O papai noel da contemporaneidade trocou o trenó eurocentrista pelo conceito de caminhãozinho globalizado com o fim de ressaltar os deslocamentos causados pela prática da delivery em sites pré-especificados, onde o encontro-confronto com o público promove a interação e participação.
O que salta aos olhos, tanto na vernissage da Bienal quanto na da anual SParte, realizada no mesmo pavilhão, é o efeito do massivo boicote convocado por certos membros da nossa sociedade em relação a esses eventos: os descendentes dos africanos que, escravizados no continente, foram atraídos para essas margens pelo aceno sedutor da tão almejada Carta de Alforria, o ilusório green card do Brasil colonial, o elusivo green card do Brasil Imperial; a morosidade do aparato burocrático dos respectivos poderes vigentes acabou por transformar a promessa em armadilha fatal, e é compreensível que permaneça algum resquício de ressentimento por parte dos descendentes; mas perde-se novamente a chance de um diálogo com a sociedade como um todo, e disso resulta um quadro geral de vernissage desprovido de qualquer contraste, já que é ocupado na totalidade da sua metragem quadrada pela cor branca, fenômeno que não se poderá corrigir com uma simples ‘photoshopada’, clicando-se consternadamente no sub-menu ‘ajustes’ do menu “imagem”: as três funções semelhantes, com diferentes graus de complexidade que estão à disposição do usuário no sub-menu - “brilho/contraste” (opção adequada aos iniciantes), “níveis” (para iniciados) ou “curvas” (a favorecida pelos usuários advanced) – não poderão remediar a ausência do preto (e nem tampouco de quaisquer tons pardos) que fariam do quadro geral mais “representação nacional” e menos um mero reflexo de seu auto-retrato falado.
Não obstante causar impressão de estar um tanto gasta, a manifestação de autonomia ortográfica característica da era pós-colonial encontra seu paralelo no fim das arcaicas representações nacionais, que impuseram o seu ‘diktakt’ nas primeiras 26 edições da mostra. Segundo declaração de Severino O’Connor, porteiro do Oropa, exerceu o cálculo papel mais relevante do que considerações ortográficas quando do planejamento da edificação, que se mantém erguida graças à sólida fundação do projeto que não previu a necessidade de garagem, sinalizando falta de visão por parte dos empreiteiros (cegueira pela qual os atuais moradores pagam um preço alto).
Em recente entrevista comemorativa do centenário de seu nascimento à revista “Applause” (a edição brasileira da “Wishful Thinking”, conhecida como o órgão de imprensa high-brow par excellence do mundo anglo-saxão - a versão nacional sendo mais hi-gloss, e por razões desconhecidas chegando às bancas desprovida do famoso centerfold) Claude Lèvi-Strauss (que é membro do tradicional clã que continua detendo majoritariamente as ações do império que controla a griffe de denim que simbolizou a revolução dos costumes a partir da década de 60 do século XX) demonstrando ter conservado intacta a pose do franco-atirador condecorado, afirmou que ainda sente saudades do Brasil e se mantém antenado em relação a tudo quanto é assunto referente a essa grand nation (sic). Num desvio (a calmaria fazendo com que o bate-papo fosse - por se encontrar à deriva - parar no assunto ‘28ª’), Lèvi-Strauss declarou, com sua notória acidez, que “abriu-se mão da datada bienal encenação da grandiosa ópera buffa “La Biennalle” - o ‘dramalhão épico’ do inesquecível Cicillo Matarazzo - invariavelmente realizada com o esplendor dos cenários e figurinos das mais aclamadas griffes, para que no fin de siècle (com pequeno atraso), cedesse-se a vez ao neo-existencialismo, na forma da tragédie lyrique “Tudo o que você queria saber sobre a Bienal mas nunca teve coragem de perguntar”, o work-in-progress emaranhado em espinhoso processo de soul-searching. Mas um erro tipográfico marginal na tradução do libreto levou ao palco, ao invés disso, a clássica dobradinha de matinée dominical, as operetas “Cavaleria rusticana” e “Pagliacci” (essa com enfoque mais direcionado ao público infanto-juvenil), ambas vocalizadas com o alto teor do ardor que efetivamente causa o espalhafato que mantém a audiência longe da tentação do cochilo restaurador. E quem esperava, como eu, uma leitura contemporânea dos ‘topo de linha’ “Tristan und Isolde” ou “La Bohème”, um “Il Guarany” ou “Porgy and Bess”, ou ainda uma versão enxuta do melodrama gay “Moses und Aaron”, deve ter ficado (como eu), um tanto atônito. E o sentimento de validação, que a garantia do retorno do dinheiro do ingresso conferiria ao público pagão, não poderá jamé ser realizado, visto que hoje em dia a entrada é pela Franca”.
Continuando, o mestre ancião, agora visivelmente empolgado, com viço nos olhos e fala pontuada pelos rrrrrrrrrrr de seu staccatto metralhante, disparou que “a cabeçada que o Zidane deu no Matarazzi foi o ato mais heróico que testemunhei nos últimos cem anos: ele abriu mão de tudo, da copa, da glória, só para defender a honra da irmã. É um prato cheio para qualquer libretista.
Em recente entrevista comemorativa do centenário de seu nascimento a um canal de televisão espanhol, respondendo à pergunta “como decifrar signos, sin ser sábio competente?”, Lévi-Strauss disse que “creo que sea lo mismo que volver a los 17, después de vivir um siglo”. O que soa aos nossos ouvidos como declaração imbuída de sabedoria poética se revela, após rigorosa análise acústica, como forma elegante que o mestre encontrou para evadir a pergunta.
Enquanto isso, da padaria recebo um telefonema me avisando que eles não pretendem abaixar o preço do pão durante a 28ª, porque “pão não é artigo de promoção”. Andei pensando em encomendar da Bienal um bolo todo coberto de velinhas ‘Guarany’ para a festinha de aniversário de 100 anos de Claude Lévi-Strauss, que ainda sente saudades do chorinho, da batucada, do futebol, da boa pinga e da cerveja estupidamente gelada que ele consumia em grandes quantidades nas animadas baladinhas da FUVEST que ele ajudou a fundar nos anos 30; não fiz a encomenda ainda, porque acho que por enquanto ainda vou andar pensando, a pé, de condução, de táxi.
Na minha última andança, refletindo sobre a prática contemporânea de se atribuir a motéis e estabelecimentos gastronômicos um punhado de estrelas, pensei na idéia de aplicar eu mesmo esse sistema de categorização às exposições temporárias, e tendo em mente a 28ª, comecei a contar um por um os dedos das minhas mãos; perplexo diante das cifras astronômicas que a contabilidade pré-aritmética fez com que girassem ao redor de minha cabeça, corri afoito ao karaokê para cantar “Anything goes”; num lapso inexplicável, em completo descompasso com o chorinho que saia dos auto-falantes, bradei retumbantemã:
“eu te darei o céu meu bem...”
“Ponto: sem linha nem plano”, intervenção do artista franco-capixaba Viktor
Khasbulatov. Realizada em São Paulo, a ação resgata a tradição
bandeirante de se espetar no chão um pau descascado para demarcar
trilhas de leito carroçável no interior do Brasil. Distribuídos aleatoriamente
pela cidade e encontrados facilmente através de consulta no mapa cedido
gratuitamente pela instituição que financiou o projeto, pode-se também
ligar os pontos impressos no plano com lápis ou caneta: os que o fizerem
encontrarão as 26 letras do alfabeto, que serviram de inspiração para o
projeto de distribuição dos ‘pontos: sem linha nem plano’ pela metrópole
paulista.
Modern Times, Modern Art: onde ontem se lia “Boulangerie Bienal”, lê-se
hoje “La Écriture du Pain Contemporain”. Convidado a opinar sobre esse
tópico - nos dias de hoje tão em pauta - o autor dos guias “Tristes Trópicos”
e “O cru e o cozido” (sempre entre os ‘top ten’ nos rankings do turista ‘ecopremium’
e do gourmet natureba), respondeu, visiblement irritado: “Tão
querendo jogar farinha pra cima de moi?” E continuando, em tom
professoral: “deixa eu te explicar uma coisa, e presta bem atenção: a
estrutura do edifício da civilização judeo-cristã repousa unicamente sobre o
fundamento de pedra mó na qual uma gangue de manos profetas pixou o
seguinte dito: ’no pain, no gain’. Para evitar que o mal-entendido se repita,
lê-se hoje em dia na placa do lado de fora do edifício: ‘aviso aos srs.
pixadores...bláblá...entidade...fundação...doação...pintura...dinheiro...etc’”.
Já sem saco para ‘bolar’ nova legenda, apropriei-me de frase pronta do texto acima: a imagem fica menos só evocativa e serve como exemplo de auto-referencialidade funcional: a era do fac-símile cede a vez à era do spam.
Alberto,
Não sei se você é sábio, mas é competente!
Obrigada por me ajudar a decifrar signos...
Rosário
Posted by: Maria do Rosário Souza at dezembro 8, 2008 11:16 AMSimon,
Ontem à noite pude ler seu texto completamente. Vibrei na freqüência de seu pensamento mega master “plus” desconstrutivista ao expor um tremendo excesso de referências, embora eu não entenda muitas delas...óbvio! Nunca tive muita paciência com o sentido subjetivo de geração de idéias que o desconstrutivismo se governa e se apóia, mas sei que sempre se obtém um sentido através deste tipo de leitura e o resultado pode até ser...invejável!
Mas gostei de sua forma tão presente e, ao mesmo tempo, tão ausente, retratando que a Bienal foi uma "festa grande" e sem sentido para muitos artistas, ou ainda que a organização do evento não atingiu o objetivo proposto.
Muito bom! Se a nossa mídia não fosse tão antiquada e cheia de censura e sua matéria fosse publicada em algum jornal brasileiro, com certeza você atingiria o objetivo de mostrar, tanto para o mundo artístico quanto aos compradores de obras de arte, de que a Bienal foi abortiva...rs
E agora, não fique sorrindo para o meu comentário e nem me ridicularize, afinal não sou artista, tenho pouco conhecimento de pintura, embora goste de tocar piano, hoje em dia sou mais lógica, gosto de “0 ou 1” ou “zero ou um”, entenda como quiser, assim me despeço, como leiga no assunto,
Eu, Cris!