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agosto 29, 2007

Entrevista de Vik Muniz a Marcelo Rezende

earthwork_poitinghand.jpg

Entrevista de Vik Muniz a Marcelo Rezende

[Marcelo Rezende] - A exposição de seus trabalhos em São Paulo acontecem no mesmo momento em que finalmente a mostra "Tropicália" chega ao Brasil, no MAM-Rio. Parece sempre haver uma espécie de "ansiedade da continuidade" em relação à Tropicália e as gerações posteriores, como se fosse um movimento capaz de conter também o futuro. De que modo você se posiciona em relação a essa "descoberta" da produção cultural brasileira por meio da Tropicália? O que pode haver de fato e estratégia de mercado em relação ao Tropicalismo e arte contemporânea brasileira, no momento mesmo em que uma artista como Dominique Gonzalez-Foerster trabalha também com a idéia de "tropicalidade", e idéias como "nacional" e "popular" são postas em xeque?

[Vik Muniz] - Nos últimos anos, o re-descobrimento da produção cultural brasileira da década de sessenta, vem alimentando uma infinidade de projetos internacionais sobre o tema. Enquanto este fragmento importante da nossa cultura se torna finalmente parte do discurso da arte internacional, é necessário ressaltar a superficialidade e leviandade com que o assunto do tropicalismo vem se demonstrando como a porta de entrada sem trinco para a cultura brasileira. A critica Americana e Européia, hoje em dia, é incapaz de escrever um só artigo sobre qualquer artista contemporâneo nacional, sem mencionar sem a menor razão, o nome da Ligia Clark ou do Helio Oiticica. A Ligia e o Helio se transformaram na Carmem Miranda e no Pelé das artes plásticas no circuito internacional. Outro dia um critico Americano escreveu um artigo enorme sobre o meu trabalho e a minha relação com a tropicália. Muito embora eu tenha feito amor pela primeira vez ao som dos mutantes, e ter lido tudo que o Torquato Neto jamais escreveu, o meu trabalho foi mais influenciado pelo Chacrinha do que pelo Helio Oiticica. A frustração do intelectual nacional com a arrogante ignorância do estrangeiro para com sua cultura se traduz na maneira ansiosa e superficial com que esses pacotes culturais se organizam.

Gostaria que voce comentasse o processo conceitual da série Pictures of Pigment, que parece trabalhar em dois planos: o primeiro, uma constante em seu trabalho, uma "reapropriação" do material - um modo de dar a ele um novo uso, logo, um novo sentido. Ao mesmo tempo há um outro grau de apropriação, o da história da pintura. De que modo a "apropriação" é para você uma ferramenta, do mesmo modo que o "ilusionismo"? De que maneira essas duas idéias se relacionam?

As imagens de pigmento são um exercício em ambigüidade. Apesar de todos os avanços científicos, fenômeno da cor continua escapando toda e qualquer explicação lógica. O assunto já foi obsessão de filósofos e cientistas de Platão à Hurvich passando por Goethe, Descartes, Berkley e muitos outros. Nem mesmo o complexo mapeamento neurológico que vem sendo realizado nos últimos anos conseguiu remover a névoa de especulação epistemológica que o assunto produz. A cor é uma das raras flores que continuam sobrevivendo no vasto e árido deserto de ignorância que separa a mente do fenômeno. Para o artista que explora a cor em seus aspectos mais práticos, o assunto da cor é como o da brochada: quanto mais se discute e se explica, pior fica. Eu como não tenho problemas nem com cor, nem com impotência, resolvi trabalhar com a noção estéril da cor objetificada, da mesma maneira que trabalhei com a idéia da cor como linguagem na série que mostrei quando representei o pais em Veneza. A diferença desta serie está na materialidade da cor e de todas as implicações que a idéia oferece. Esta relação do material com a idéia visa a imitar o problema da cor em sua raiz conceitual mais básica. Quanto à temática, escolhida como contrapartida para o material, eu tenho que primeiro esclarecer que não se trata de apropriação, mas de copia. Apropriação é o ato conceitual de assumir a autoria sobre um ícone já existente enquanto a copia é simplesmente um exercício de adaptação técnica e conceitual à evolução histórica de um gênero ou de uma imagem. A apropriação tem a ver com originalidade enquanto a copia tem a ver com individualidade.

junk_narcissus.jpg

No meu trabalho, tanto o material como o tema são coisas facilmente reconhecíveis ou banais, assim o foco fica voltado à relação entre estas duas coisas. O processo artístico consiste na maneira criativa com que o tema se integra ao material e vice versa. De um lado o espectador negocia com a obra com toda a bagagem de conhecimento pratico que ele traz da sua experiência interagindo com materiais e do outro, de toda sua memória visual, e isso inclui a história da arte.

Que aproximações ou distâncias você estabelece entre "The Beatiful Earth" e "Pictures of Pigment"?

Eu acho que esta estória começou depois de eu ter lido o livro maravilhoso do Phillip Ball a respeito da história da invenção da cor. Quando a gente pensa em cor imediatamente a gente separa suas características principais; ou a se pensa em luz ou em material. Isso sempre me fez imaginar um paralelo com o paradigma Einsteniano das propriedades da luz como onda ou partícula. O livro de Ball me fez pensar na cor escavada das profundezas escuras, carregada em sacos sobre costas suadas, moída sobre a força de maquinas pesadas, raspada de conchas de raros moluscos ou colhida de plantas que só crescem em grandes altitudes. Enfim coisas que a gente ignora enquanto escolhe uma camisa ou chupa um pirulito. A idéia de trabalhar com pigmento puro, com a cor com toda sua bagagem material vem dai. A parte mais conceptual da idéia vem de uma briga que eu tive com um pintor amigo meu que criticava com certa razão, a impossibilidade da reprodução e consequentemente, da produção da cor verdadeira através da fotografia. O problema de seu argumento, é que ele usava a pintura como exemplo do contrario. Eu disse a ele que mesmo o pintor, pinta com cores que mudam depois que secam. E a não ser que o pintor trabalhasse com pigmentos soltos e secos, ele estaria pintando às cegas. Obviamente a fotografia não resolve o paradoxo da cor real, mas como todo bom paradoxo, faz você pensar sobre a coisa por um bom tempo. A série culminou com esta série de paisagens que eu estou mostrando em São Paulo. Imagens estilizadas da terra feitas com terra, com uma terra linda, boa idéia.

Essa cor vibrante que vem da terra, faz pensar em tudo que vem da terra, bonecas Barbie, estações espaciais, carros de formula 1, néon, trufas, vibradores e cadeiras eletricas e por isso esta série está relacionada com as fotos de sucata e com os desenhos gigantes que eu tenho feito em Minas e na Amazônia. Beautiful Earth é uma exposição que combina estas três series sob o tema da entropia e das relações invisíveis entre a matéria, o objeto e a imagem.


Marcelo Rezende é escritor e curador. Autor do romance Arno Schmidt (Planeta, 2005) e do ensaio Ciência do sonho - A imaginação sem fim do diretor Michel Gondry (Alameda, 2005). Co-curador da exposição Comunismo da Forma (Galeria Vermelho, São Paulo, 2007) e da mostra À la Chinoise (Microwave International New Media Arts Festival, Hong Kong, 2007).

Posted by João Domingues at 11:42 AM | Comentários(5)
Comments

Que satisfação ler uma entrevista inteligente na imprensa cultural brasileira! Coisa rara. Longe dessas papagaiadas que lemos por aí, de Daniéis Pizas, Toninhos e outras mentes retrógradas e obtusas voltadas ao passado. Parabéns ao Canal por publicar.

André Cardoso
São Paulo-SP

Posted by: Andre Cardoso at setembro 6, 2007 8:48 AM

Que satisfação ler uma entrevista inteligente na imprensa cultural brasileira! Coisa rara. Longe dessas papagaiadas que lemos por aí, de Daniéis Pizas, Toninhos e outras mentes retrógradas e obtusas voltadas ao passado. Parabéns ao Canal por publicar.

André Cardoso
São Paulo-SP

Posted by: Andre Cardoso at setembro 6, 2007 8:48 AM

Massa! massa mesmo!! Super bacana a entrevista com Vik, esse cara e mesmo papo firme!! Mora!!
Os discursos de arte contemporanea brasileira se limitou em Ligia e Helio, e um monte de babosera para encher a linguiça.
Que pena que o Velho Guerreiro não esta mais ai para jogar bacalhau, abacaxi etc., em seu publico.
Mas em compensação!! os jornais e outras midias estão ai para nos atirar estas Linguiças Contemporaneas na cabeça!!!
Não precisamos de falsos intelectuaisque se estruturam na historia da Arte Internacional para defender nossa Arte brasileira! ela é muito mais complexa do que imaginamos, ela esta ligada a nossa cultura popular! e nossas experiencias! e nosso conhecimento de Arte de Sobreviver!
Oque é legal deste entrevista com o Vik é; que ele se defende com suas experiencias, e não com as experiencias de falsos intelectuais.
Bravo!! Marcelo!!
por publicar esta entrevista

Edgard Soares

não as esperiencias da Historia da Arte Internacional!!

Posted by: Edgard Soares at setembro 10, 2007 6:44 AM

Massa! massa mesmo!! Super bacana a entrevista com Vik, esse cara e mesmo papo firme!! Mora!!
Os discursos de arte contemporanea brasileira se limitou em Ligia e Helio, e um monte de babosera para encher a linguiça.
Que pena que o Velho Guerreiro não esta mais ai para jogar bacalhau, abacaxi etc., em seu publico.
Mas em compensação!! os jornais e outras midias estão ai para nos atirar estas Linguiças Contemporaneas na cabeça!!!
Não precisamos de falsos intelectuaisque se estruturam na historia da Arte Internacional para defender nossa Arte brasileira! ela é muito mais complexa do que imaginamos, ela esta ligada a nossa cultura popular! e nossas experiencias! e nosso conhecimento de Arte de Sobreviver!
Oque é legal deste entrevista com o Vik é; que ele se defende com suas experiencias, e não com as experiencias de falsos intelectuais.
Bravo!! Marcelo!!
por publicar esta entrevista

Edgard Soares

não as esperiencias da Historia da Arte Internacional!!

Posted by: Edgard Soares at setembro 10, 2007 6:44 AM

isso e uma idiotice

Posted by: vitoria at março 18, 2010 4:08 PM
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