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janeiro 17, 2007

Pós-apocalipse, por Rubens Pileggi Sá

pos_apocalipse_17_01.jpg

Jenny Holzer, instalação: Proteja-me do que eu quero

Pós-apocalipse

RUBENS PILEGGI SÁ

Vivemos em um momento da história em que ninguém tem algo a dizer tão profundamente quanto saber que a história só existe na medida em que ela está se fazendo. O debate sobre a questão ambiental é tão urgente que não há quem possa ser levado em consideração sem falar do que está acontecendo agora.

O assassinato de Saddam Hussein é tão cruel quanto o fim do vôo da borboleta durante um dos estrondos que se ouve, todos os dias, provocados pela explosão de dinamites, em uma cidade como Pirenópolis, Goiás, para a extração de pedras, nos morros. Ou as conseqüências do esgoto derramado a céu aberto no litoral do país. O falso dilema da geração de empregos versus preservação do ambiente. Da preservação do ambiente versus o progresso. E do progresso versus a distribuição de renda.

Sterlac, um artista performático australiano, que vem trabalhando há anos na relação entre homem e máquina, nos lança a idéia de que esse tipo de interação está levando o homem para a condição pós-humana. E que um novo conceito filosófico deverá ser pensado, pois toda a filosofia - um pouco mais, um pouco menos - está calcada na biologia.

Depois da morte de Deus, a morte da natureza. O homem já vem sendo morto há tempos, como pode comprovar o neopentecostalismo apocalíptico televisivo e mercadológico.

Aquela ladainha direitista de que os ecologistas defendem as baleias enquanto os seres humanos morrem nas filas dos hospitais públicos já não vale mais no neocapitalismo. Temos ar puro - ainda - para vender. Quem quer comprar?

Se a arte tem a ver com Beleza e ela está incorporada à natureza, por que permitimos a destruição do nosso patrimônio natural? Por que aceitamos entregar o que é belo à exploração financeira? Rios assoreados, peixes mortos pela ação de agrotóxicos, poluição, desrespeito ao ciclo da vida, matança de jovens contra jovens nas favelas do Rio de Janeiro, vingança em nome da justiça, cruzadas "democráticas" contra o "eixo do mal", caça aos terroristas... Já não temos mais nem arte, nem história e nem filosofia porque o homem, a natureza e Deus foram mortos por trinta dinheiros.

Retomando o conceito de pós-humano. O que isso tem a ver com os interesses públicos? Afinal de contas temos cotas de carbono para vender no mercado internacional. Temos locais para estocar lixo dos outros em nossas cidades. E sempre se dá um jeitinho para vender ar-condicionado a prazo no inferno. Inferno que são sempre os outros. Inferno que é a repetição do mesmo. Inferno que também acabará quando descobrirmos que a herança do pós-humano será o pó. E a única coisa pela qual valerá a pena morrer, será pela Beleza.

Posted by João Domingues at 11:34 AM | Comentários(1)
Comments

morrer pela beleza da morte. morrer pelas baleias nas filas de hospital. morrer sufocado de lixo, soterrado na pedreira, esquecido de deus.

Posted by: morrer at junho 6, 2007 4:36 PM
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