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maio 2, 2005
Menos é mais por Rubens Pileggi Sá
Menos é mais
RUBENS PILEGGI SÁ
"América do Sal
América do Sol
América do Sul"
extraído do poema "hip, hip, hover", de Oswald de Andrade
Condensar - Na tradição dos poetas concretistas (movimento literário lançado na década de 1950), menos é mais. Ou seja, contra a falácia caudalosa dos xaroposos poemas sentimentais, a secura e a linguagem sintética dos signos gráficos produzindo uma linguagem verbal, vocal e visual (verbi-voco-visual) de alta voltagem mental. Afinal, para esses poetas que se apropriaram do pensamento de que poesia é coisa, matéria, menos é mais. Ou, como colocado por Ezra Pound, em seu "abc da literatura", poesia em alemão é "dichten", cuja tradução, em latim seria, "condensare", condensar, em português. Ou seja, linguagem sintética, concisa.
Estética oriental - Em matéria de saber fazer render mais com menos, os japoneses são mestres. Seja na agricultura, fazendo render o máximo com um mínimo de terra, seja na indústria, diminuindo o tamanho dos aparelhos eletrônicos, aos bonsais, que são árvores minúsculas e até os hai-kais, um tipo de poema de apenas três versos, mas extremamente ricos em significação. Significação que chega ao extremo, no caso da pintura, onde o vazio é sempre um lugar a ser contemplado e não a ser preenchido, como se faltasse algo ao espaço.
A estética oriental muito influenciou a arte ocidental, desde os impressionistas, que compravam e admiravam as gravuras japonesas e não há movimento artístico de vanguarda, desde então, que não apele para a síntese, em seus programas e manifestos. Da Bauhaus ao minimalismo.
Mínimo múltiplo comum à arte - Se a escola Bauhaus, criada na Alemanha antes do nazismo, tinha por compromisso padronizar e racionalizar a produção, para facilitar o acesso à massa, o minimalismo, nascido nos EUA, por sua vez, tinha por princípio atingir o grau zero de toda a informação, para se chegar a um "mínimo múltiplo comum" de toda operação estética, em oposição à ironia da "pop art", que era o movimento dominante da época. De todo modo, qualidade e quantidade nem sempre caminham, exatamente, juntas.
De Leonardo da Vinci, sabe-se apenas de um pouco mais de uma dezena de quadros. E, ainda assim, a maioria sem terem sido terminado. A Mona Lisa é um deles. E quem há de negar-lhe a genialidade?
Mondrian, que é um dos mais influentes artistas da primeira metade do século vinte, quis chegar à essência do quadro, pintando apenas quadrados com as cores básicas (amarelo, azul e vermelho) mais o preto e o branco, criando o movimento chamado Neoplasticismo.
Mas é na frase do pintor russo Maliévitch, a época da revolução bolchevique - que pintava quadrados brancos sobre telas brancas - que vem à tona, hoje, por trás de todo esse discurso estético sobre menos é mais: "não mais pintar para a burguesia". Era preciso inventar outros parâmetros também no campo na ação artística. E pensar o espaço - delegado apenas ao funcionalismo arquitetônico - tornava-se uma função também da pintura e da escultura.
Campo ideológico - Decorre, então, desse discurso sobre a experiência do espaço, que a questão não se esgota apenas no campo estético, artístico, mas, também, do trabalho envolvido no fazer, seja ele de que ordem for - assentar uma argamassa ou criar um conceito. Porque não se trata apenas em fazer algo, mas de saber o que se está fazendo, ter consciência desse ato. O trabalho não se justifica apenas pela quantidade gasta de energia para ser realizado, nem, hoje em dia, de sua aparência externa, simplesmente. Ele precisa ser sustentado pelo que tem a dizer quando vem a público. Quais são as suas conseqüências em relação ao meio onde é produzido, por exemplo. Senão, torna-se como o rico fazendeiro justificando seu latifúndio em nome do trabalho árduo de anos e anos de labuta, em um país onde a ganância gera a fome de milhões de pessoas e a concentração de terra é a maior do planeta.
Rubens Pileggi Sá é artista, escreve na Folha de Londrina e publicou o livro Alfabeto Visual, a venda na Livraria do CANAL.
Não concordo: Acho que é exatamente esse eterno discurso por trás da arte contemporânea que a tem tornado esse amontoado de lixo coordenado por bulas presas a um artista, muitas das vezes egocêntrico e vaidoso, e que faz com que cada vez mais a arte esteja longe das pessoas. Longe e fria.