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fevereiro 17, 2005
Gênios do lugar-comum
"In Absentia M.D.", de Regina Silveira: trabalho em que se vê a sombra projetada do trabalho de outro artista e o pedestal nu.
Gênios do lugar-comum
RUBENS PILEGGI SÁ
Pressão criativa e lugar-comum - Em uma entrevista realizada alguns anos antes de falecer, o compositor Tom Jobim disse que a encomenda era uma excelente musa, referindo-se ao fato de ter de trabalhar sob a pressão de um prazo, para determinado fim - uma propaganda comercial, por exemplo. Coisa que, a principio, parece tão distante do que esperamos que venha a ser a arte.
Principalmente quando se fala em um autor do quilate de um Tom Jobim. "Chavão abre porta grande", já cantou Itamar Assumpção. Ou seja, às vezes, usar um chavão, fazer parte do senso comum, viver um padrão estabelecido, pode ser, também, algo com alguma serventia para a criação artística. Mesmo parecendo um contra-senso, já que na cabeça da maioria das pessoas, arte e originalidade, ou arte e genialidade são quase sinônimos, como se o talento criativo estivesse em uma ordem superior do mundo. Mas nem sempre é assim. Ou, quase nunca é assim.
O rastro antes do passo - O fato é que ninguém cria do nada. Ninguém inventa algo novo e original sem que haja condições sociais e produtivas para que essa criação venha à luz. Talvez seja mais fácil dizer que as coisas querem ser criadas, inventadas, do que pensar que alguma coisa nova e diferente nasceu da cabeça de algum gênio inspirado.
Melhor imaginar que tudo o que existe já existiu, em outro tempo e dimensão do espaço. E tudo o que temos a fazer é seguir as linhas do já está escrito. Como se nossos passos já tivessem deixado rastros atrás de si antes de termos andado naquele caminho. Mesmo que nos recusemos a caminhar, ou que nos rebelemos contra o que já está escrito. Como já refletiu o poeta e filósofo Hölderlin, há mais de dois séculos atrás: "os filhos inventam os pais".
Questão cultural - O plágio, a cópia, a citação e a referência estão sempre à mão para serem usados, manipulados. Vivemos na época onde muita coisa já existe. E tudo em excesso. Então, combinar uma coisa à outra, muitas vezes em relações insólitas, a princípio, pode ser muito mais interessante que tentar "reinventar a roda". Ou, reinventar a roda sobre o banquinho, como já fez Duchamp, no começo da arte do século 20.
No livro e no filme "A Sociedade do Espetáculo", seu autor, Guy Debord, coloca que "o plágio é necessário. O progresso supõe o plágio. Ele se achega à frase de um autor, serve-se de suas expressões, apaga uma idéia errônea, a substitui pela idéia correta."
Não é à toa que a cultura do RAP se apropria do que já foi gravado e remixa sons e imagens de autores diversos, criando algo ao mesmo tempo familiar e estranho.
Novo e usado. Melhor, ousado, porque embaralha as cartas do que é registro de patentes e direitos autorais. Agora, com a internet, onde uma montanha de informações está disponibilizada, então, nem se fale!
O roubo como arte - Em outra entrevista, desta vez entre o jornalista Nelson Sato da Folha de Londrina e o cantor e compositor João Donato, este lançou pérolas de lugar-comum sobre criação e invenção na música que deixaria qualquer purista corado de vergonha. Falando sobre uma música sua que Caetano Veloso usou, colocando-lhe letra, mas sem lhe dar os devidos créditos, Donato, ao invés de se passar por indignado, disse que isso era comum acontecer. Explicou que Nana Caymmi, filha de Dorival Caymmi, um dia perguntou ao pai se tal música tinha sido composta por ele e o músico baiano simplesmente respondeu que não, mas que assumia a obra. Ainda nessa entrevista com Donato, foi dito que uma vez ele ligou para o maestro Tom Jobim perguntando o que ele estava compondo no momento e o gênio teria simplesmente respondido: roubando algumas melodias.
Como desfecho dessa deliciosa entrevista, Donato resume que "o artista jovem copia, o artista maduro rouba".
Bem, depois que as próprias pessoas que consideramos gênios dizem esse tipo de coisa, parece que a culpa por não ter originalidade nenhuma vai embora e o que fica é o sabor de apreciar algo que está ao alcance de todos, independente de anjos, inspiração divina ou seja lá o que for. E que a pressão, o plágio, a encomenda e o roubo podem até tornar-se trabalhos bastante criativos, também.
Rubens Pileggi Sá é artista, escreve na Folha de Londrina e publicou o livro Alfabeto Visual, a venda na Livraria do CANAL.
NA VERDADE TUDO SE TRANSFORMA.
Posted by: FABIO ALVES at fevereiro 19, 2005 4:06 PMO RASTRO ANTES DO PASSO
O FATO É QUE NINGUÉM CRIA DO NADA. Sim, é muito dificil criar sem estar de porte de um considerável 'Data bank' que alimente nossa imaginação e sem termos estado em contacto com precedentes objetos de contemplação ou reflexão que nos instiguem a traçar relações ou paralelos. NINGUÉM INVENTA ALGO NOVO E ORIGINAL SEM QUE HAJA CONDIÇÕES SOCIAIS E PRODUTIVAS PARA QUE ESSA CRIAÇÃO VENHA À LUZ, Sim, é dificil ser criativos e inventivos se o ambiente onde nos desenvolvemos como espectadores tende a perpetuar em nossos olhos a areia grossa da ignorância que nos impede a visão criativa de nosso entorno e de nós mesmos. TALVEZ SEJA MAIS FÁCIL DIZER QUE AS COISAS QUEREM SER CRIADAS, INVENTADAS, DO QUE PENSAR QUE ALGUMA COISA NOVA E DIFERENTE NASCEU DA CABEÇA DE ALGUM GÊNIO INSPIRADO. Sim, as idéias estão no ar e os artistas como antenas do incosciente coletivo, ou melhor pára-raios do gênio (comum) humano, estão sempre mais aptos à captação de idéias das quais a humanidade carece refletir neste ou naquele momento.
MELHOR IMAGINAR QUE TUDO O QUE EXISTE JÁ EXISTIU, EM OUTRO TEMPO E DIMENSÃO DO ESPAÇO. E TUDO O QUE TEMOS A FAZER É SEGUIR AS LINHAS DO JÁ ESTÁ ESCRITO. COMO SE NOSSOS PASSOS JÁ TIVESSEM DEIXADO RASTROS ATRÁS DE SI ANTES DE TERMOS ANDADO NAQUELE CAMINHO. Sim, porque as perguntas fundamentais e existenciais sempre serão as mesmas. Só que sempre revisadas de maneira nova e evolutiva (ou involutiva
,de acordo com a capacidade imaginativa de tal ou tal época.
QUESTÃO CULTURAL - O PLÁGIO, A CÓPIA, A CITAÇÃO E A REFERÊNCIA ESTÃO SEMPRE À MÃO PARA SEREM USADOS, MANIPULADOS. O plágio e a cópia estão sempre à mão para serem manipulados pelos preguiçosos e/ou os sem tempo ou sem erudição que os alimente na imaginação. A citação e a referência estão à mão talvez mais como um intrumento de apreço e aplauso pela precedência do sensível achado intelectual. VIVEMOS NA ÉPOCA ONDE MUITA COISA JÁ EXISTE Melhor imaginar que tudo o que existe já existiu, em outro tempo e dimensão do espaço.
E TUDO EM EXCESSO Ou quem sabe tudo excessivamente banalizado por uma divulgação massiva porém epidérmica. ENTÃO, COMBINAR UMA COISA À OUTRA, MUITAS VEZES EM RELAÇÕES INSÓLITAS, A PRINCÍPIO, PODE SER MUITO MAIS INTERESSANTE QUE TENTAR "REINVENTAR A RODA". OU, REINVENTAR A RODA SOBRE O BANQUINHO, COMO JÁ FEZ DUCHAMP, NO COMEÇO DA ARTE DO SÉCULO 20. Sim, por estas e outras, é mais fácil e mais ligeiro se ater e louvar o truque do que penetrar e descascar os mistérios da metáfora. Pois é nela que se cozinha com arte o dictum poético.
Como desfecho acrescentaria que O ROUBO COMO ARTE faz sentido ou se faz premente quando na solicitante carreira da atualidade o artista se vê sem tempo ou garra para cultivar mais alongadamente sua imaginação ou se vê exausto de múltiplas demandas: inúmeras exposições em um só ano acompanhadas de repetidas viagens de negócios, isto sem falar no constante 'Lobby'. Daí então recorre ao plágio, na certeza de que este será minimizado facilmente pela reputação de sua assinatura ou pela preguiça e desatenção intelectual dos que por volta a arte administram.
Para citar aprópriadamente Renzo Piano, uma pessoa a quem considero gênio: -"Passei cinquenta anos da minha vida me preparando para a arquitetura que invento hoje."
Porque, no entender de Renzo Piano, cada projeto é uma resposta sentida ao gênio/espírito de tal ou tal espaço e resultado do estudo detalhado que cada situação requer, alimentado por todas as prévias experiências, conhecimentos e maturações internas advindas das batalhas com seu próprio anjo/ego.
Posted by: regina vater at fevereiro 19, 2005 6:06 PM