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fevereiro 29, 2016
Programa Curador Visitante: Depois do futuro na EAV Parque Lage, Rio de Janeiro
Com trabalhos de 39 artistas, brasileiros e estrangeiros, a exposição discute a noção de futuro que se encontra tanto nas teorias estéticas e culturais como nas práticas artísticas contemporâneas
A Escola de Artes Visuais do Parque Lage inaugura no próximo dia 4 de março de 2016, às 19h, a exposição Depois do futuro, com curadoria de Daniela Labra, convidada por Lisette Lagnado, diretora da EAV, para a quarta edição do programa Curador Visitante. Nascida em Santiago de Chile, em 1974, e radicada no Rio de Janeiro, Daniela Labra leva para a EAV Parque Lage o desdobramento de sua pesquisa de pós-doutorado junto ao núcleo de investigação N-Imagem da Escola de Comunicação da UFRJ (ECO/UFRJ), em que relaciona teorias estéticas e culturais que examinam a noção de futuro e as práticas artísticas contemporâneas que “acenam para futuros possíveis”. Serão cerca de 60 trabalhos de 39 artistas, alguns estrangeiros, que trarão para o público “questões tão variadas quanto o lugar da arte na pós-modernidade, os processos de construção da sociedade brasileira ou, ainda, a discussão da arte como produto de consumo em um cenário regido pelo imediatismo”, conta a curadora. Ela ressalta que “apesar da carga teórica, as obras não pretendem servir de ilustração”. “A exposição analisa um panorama de indefinições detectadas diariamente”, diz. O programa Curador Visitante consiste em convidar curadores residentes no Rio e atuantes no circuito da arte para que realizem uma exposição que mescle trabalhos de artistas já reconhecidos com o de estudantes da EAV.
Os artistas participantes são Alice Miceli, Cristiano Lenhardt, Daniel Beerstecher, Daniel Escobar, Franz Manata e Saulo Laudares, Gustavo Speridião, Guto Nóbrega, Irene de Andrés, Joana Csekö e Pedro Urano, Jorge Menna Barreto, Julia Rometti, Laercio Redondo, Lia do Rio, Leonardo Herrera, Maria Thereza Alves, Pablo Lobato, Pedro Victor Brandão, Ricardo Càstro, RunoLagomarsino, Tamíris Spinelli, Teresa Margolles, Tiago Rubini, Traplev, Zé Carlos Garcia, além de Amanda Copstein, André Queiroz, Brenno de Castro, Caroline Pavão, Dani Ferreira,Emília Estrada, Felipe Ferreira, Fernanda Andrade, Isis Passos, João Paulo Racy, Manoel Manoel, Mariana Kaufmann e Ana Matheus Abade, que estudam na EAV Parque Lage. Daniela Labra convidou para serem suas assistentes na curadoria as também estudantes Aline Baiana Cavalcanti e Emília Estrada.
“Depois do Futuro” abrangerá uma programação paralela aberta ao público com conversas e debates com acadêmicos, ativistas, artistas e livre pensadores que irão refletir sobre processos e metodologias de criação, educação e circulação da arte, bem como “diversas questões relevantes à sociedade que atingem a própria ideia de extinção e preservação de nossa espécie em corpo, alma e herança cultural”.
CENÁRIOS DE FUTURO
A exposição será acompanhada de um tabloide, com uma entrevista de Daniela Labra dada a Lisette Lagnado, resumida a seguir. Daniela Labra destaca que a curadoria de “Depois do futuro” foi “específica para o Parque Lage”. “Propus pensar o que é autoria, pensamento crítico, formato artístico e ensino de arte em um cenário cultural, social e político hoje tão complexo quanto instável”, diz, acrescentando que buscou também mostrar como essas práticas “respondem aos cenários de futuro que se apresentam empiricamente, com perspectivas muito preocupantes de escassez de água, comida, pandemias, guerras étnicas, entre outros aspectos”.
A noção de futuro trabalhada pela curadora é a da “utopia modernista em processo de esfacelamento e descrença”. “O futuro não mais como avanços e progresso da civilização ocidental, mas como imagem nebulosa em que a vitória do homem culto sobre a natureza ou a selvageria dos povos conquistados não se deu como predicado por um pensamento europeu iluminista”, explica.
Daniela Labra comenta que a exposição reflete “um conjunto significativo da rede de trocas” que se estabeleceu a partir de dinâmicas de estudos que desenvolve há cinco anos, na orientação a grupos de pesquisa artística. Os alunos inscritos em seu curso na EAV Parque Lage se reuniram com ela durante o mês de dezembro nas Cavalariças, “como um grande laboratório que permitiu testar no espaço alguns trabalhos prontos e promover rodas diárias de conversas”. Com os artistas convidados, ela buscou “costurar um diálogo entre as obras, como se fosse um texto que responde aos temas”. “Construir essas relações entre as obras é uma das responsabilidades imprescindíveis do trabalho do curador: dar coerência, na montagem, à escolha das obras”, destaca.
“O conjunto tem um caráter político, quase virulento, reunindo figuras destacadas no ‘nicho’ da arte política, como a mexicana Teresa Margolles e a brasileira radicada em Berlim, Maria Thereza Alves. A maioria dos trabalhos discute de modo direto questões problemáticas do presente, embora haja alguns contrapontos mais poéticos mas não menos contundentes, como os objetos de parede em madeira e plumas naturais de Zé Carlos Garcia e a escultura tecnocientífica “Equilibrium”, de Guto Nóbrega. Certas obras serão "infiltradas", usando colunas da entrada ou trocando as tampas de privadas, propostas do jovem Felipe Ferreira, que coleciona esse mobiliário kitsch decorado com paisagens artificiais. Há trabalhos que conheço há anos, como “WeSupport” [Nós apoiamos, 2007], de RunoLagomarsino, e “Donde nada ocurre” [Onde nada acontece, 2012] da espanhola Irene de Andrés. Apresentá-los aqui me dá grande satisfação”, comemora Daniela Labra.
Ela observa que no início de seu trabalho como curadora, em 2005, uma das exposições que mais a marcaram foi “Populism”, curada por Lars BangLarsen, Cristina Ricupero e NicolausSchafhausen, no StedelijkMuseum, em Amsterdã, que “abordou o populismo como fenômeno na política contemporânea”. “Os trabalhos eram ora ácidos, ora discursivos, todos engajados; e havia muitos artistas jovens ao lado de artistas consagrados como Cildo Meireles e Sarah Morris”. “Aquele evento me influenciou tanto que, de certo modo, a exposição ‘Depois do Futuro’ pode ser interpretada como uma resposta a ‘Populism’, dez anos depois”, afirma.
Indagada por Lisette Lagnado sobre críticas de que as exposições de arte estão cada vez mais populistas, Daniela Labra diz que este fenômeno “tem a ver com todo um cenário de espetacularização da cultura”. “Os museus e eventos de arte precisam de números e os patrocinadores querem resultados. Assim, ‘efeitos especiais’ ou selfiesdiante das obras expostas são estimulados por ações educativas que não aprofundam as questões trazidas pelos artistas. O conteúdo fica em segundo plano. Até as Bienais internacionais funcionam para promover governos, corporações e fundações geridos por fundos privados e públicos. Me pergunto se haveria diferença entre as noções de populismo das exposições e a dita popularização da arte. É algo a se refletir”, diz. “Em países onde a educação básica é tão desvalorizada, e o público das artes visuais tão reduzido, é importante que haja mais acesso aos museus e centros culturais porque estes podem de fato promover experiências de qualidade – embora, no geral, as instituições sejam precárias. Porém, percebo que muitas vezes o público é tratado de modo infantil, induzido a ‘entender’ as obras, e não a refletir e construir seu próprio ponto de vista crítico. É essa condução do olhar e do pensamento que é populista e empobrecedora. Os artistas que convidei não trabalham de forma alguma nesta chave. Pelo contrário, são críticos desse fenômeno”, ressalta a curadora.
Daniela Labra nasceu em Santiago de Chile, em 1974, e vive no Rio de Janeiro. É curadora independente de artes visuais, crítica de arte e pesquisadora, pós-doutora na ECO/UFRJ com o projeto “Depois do Futuro: Ruínas e reinvenções da Modernidade nas artes contemporâneas” (2015), com bolsa CAPES, doutora em História e Crítica da Arte pela PPGAV EBA/UFRJ (2010), mestre em Artes pela Universidade Estadual de Campinas (2005) com graduação em Teoria do Teatro pela UNI-RIO (1998). Desenvolve projetos de curadoria, escrita crítica e pesquisa na área de artes visuais, com ênfase na produção contemporânea, atuando principalmente nos temas: arte brasileira contemporânea, sistema da arte global, arte e sociedade e performance arte. Professora de Teoria e Arte Contemporânea na EAV Parque Lage, Rio de Janeiro. Atualmente colabora como crítica de artes plásticas no jornal “O Globo” e também com a plataforma de pesquisa http://globalartarchive.com/project, coordenado pela professora Anna Maria Guasch Ferrer, da Universitat de Barcelona. Mantém desde 2004 a página www.artesquema.com.
Suas curadorias selecionadas são: “Daniel Escobar/ Seu Lugar é Aqui, Seu Momento é Agora”, Santander Cultural, Porto Alegre (2014); “Berna Reale/Vazio de Nós”, MAR, Rio de Janeiro (2013); “Travessias”, Bela Maré, Rio de Janeiro, 2011; “Festival Performance Arte Brasil”, MAM Rio de Janeiro (2011); “Festival Performance Presente Futuro”, Oi Futuro Rio de Janeiro (2008-2010); “Mostra Verbo”, Galeria Vermelho, São Paulo (2005-2007); “Investigações Pictóricas”, MAC Niterói (2009); “Espaços Reversíveis”, Museu Histórico de Santa Catarina, Florianópolis (2008); “Fabulosas Desordens”, Caixa Cultural Rio de Janeiro (2007); “Perambulação”, II Bienal Internacional de Arquitetura de Rotterdam, Holanda (2005); O Artista-Personagem, Centro Mariantonia, São Paulo (2005).
Foi curadora residente nos programas: ScottishSculpture Workshop (SSW), Lumsden, Escócia, em 2013, no IASPIS, em Estocolmo, em 2007; e no FRAME, em Helsinki, em 2005.
CURADOR VISITANTE
O programa Curador Visitante consiste em convidar curadores residentes no Rio e atuantes no circuito da arte, para que acompanhem a produção dos estudantes da EAV e realizem uma exposição mesclando seus trabalhos com o de artistas já reconhecidos. “Ao convidar agentes do sistema da arte – críticos, escritores e curadores – a fazerem curadorias experimentais nos espaços do Parque Lage, o programa Curador Visitante garante uma fluidez entre o período de aprendizado e a inserção profissional dos alunos, e ao mesmo tempo oferece a esses curadores a possibilidade de exercer um trabalho piloto, de caráter experimental, inserido em âmbito educativo”, diz Lisette Lagnado, diretora da EAV Parque Lage. Ela ressalta que o programa reafirma a EAV “como laboratório de prática e reflexão curatorial para profissionais em início de carreira”. A exposição inaugural foi “Encruzilhada”, com curadoria de Bernardo Mosqueira. Após “A Mão Negativa”, com curadoria de Bernardo de Souza, os demais curadores visitantes de 2015 serão Daniela Labra e Marta Mestre. Os curadores de 2016 já estão sendo convidados e serão anunciados em breve.
PROGRAMAÇÃO PARALELA
“Depois do Futuro” abrangerá uma programação paralela aberta ao público, em que acadêmicos, ativistas, artistas e livre pensadores irão refletir sobre processos e metodologias de criação, educação e circulação da arte, bem como “diversas questões relevantes à sociedade que atingem a própria ideia de extinção e preservação de nossa espécie em corpo, alma e herança cultural”. A Escola de Artes Visuais do Parque Lage entregará um certificado de presença aos participantes que frequentarem todos os debates e palestras. Por conta desta programação, excepcionalmente a exposição estará aberta em algumas segundas-feiras, das 14h às 19h.
4 de março, sexta-feira
19h às 22h – Jam session e instalação: “Fogueira”, de Isis Passos
Área verde EAV Parque Lage
23h – Happening-festa “A Igreja Maravilhosa”, de André Queiróz
Local a ser definido no Centro da Cidade
11 de março, sexta-feira, das 19h às 20h30
Conversa entre Daniela Labra, curadora visitante, e Lisette Lagnado, diretora da EAV Parque Lage
Salão Nobre da EAV Parque Lage
18 de março, sexta-feira, das 20h às 22h
Cine Lage com projeções dos filmes “Homenagem a Matta Clark” (2015), de Joana Traub Csekö e Pedro Urano, e “Ventos de Valls” (2013), de Pablo Lobato
Pátio da Piscina, EAV Parque Lage
11 de abril, segunda-feira
17h às 19h – Debate – O Brasil contemporâneo e a causa indígena: uma conversa a partir da instalação “O artista como bandeirante”, de Maria Thereza Alves.
Participação de Poty Poran, índia da etnia guarani e professora da Escola Estadual Indígena Guarani Gwyra Pepó, na aldeia Tenode Porã, São Paulo, e convidados
Salão Nobre da EAV Parque Lage
19h30 às 21h – Palestra e lançamento do livro “Entre monstros e quimeras. Reflexões sobre arte, biologia e tecnologia”, de Raquel Rennó Nunes, professora da Universidade Federal do Recôncavo Baiano, e Guto Nóbrega, artista e pesquisador da UFRJ
Salão Nobre da EAV Parque Lage
12 de abril, terça-feira
18h às 19h – Performance “Cartas na mesa”, de Ricardo Càstro
Cavalariças, EAV Parque Lage
19h30 às 21h – Palestra e debate “Contracultura no Brasil: utopias e legados”, com Frederico Coelho, escritor e historiador da PUC-RJ
Salão Nobre da EAV Parque Lage
25 de abril, segunda-feira
17h às 18h30 – Performance “Gordura trans # 5”, de Tamíris Spinelli
Área verde da EAV Parque Lage
19h às 20h30 – Palestra e debate: “O Fim do Amor”, com Charles Feitosa, filósofo, professor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Uni-Rio).
Salão Nobre da EAV Parque Lage
26 de abril, terça-feira
16h às 18h30 – “Poéticas e políticas do corpo em ação”. Fórum de discussão sobre arte, performance e gênero, com Tamíris Spinelli, artista e ativista, Caio Riscado, pesquisador em performance e estudos de gênero, e convidados
Salão Nobre da EAV Parque Lage
19h às 20h30 – Palestra de encerramento “As muitas mortes da arte”, com Marisa Flórido, curadora independente, crítica e professora do Instituto de Artes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
Salão Nobre da EAV Parque Lage
1º de maio – domingo
15h – Performance “Cartas na mesa”, de Ricardo Càstro
Cavalariças, EAV Parque Lage