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março 11, 2013
Circuitos cruzados: o Centre Pompidou encontra o MAM, São Paulo
Cinco videoinstalações históricas de nomes como Nam June Paik e Bruce Nauman se relacionam com obras de artistas contemporâneos brasileiros na mostra Circuitos cruzados: o Centre Pompidou encontra o MAM
Exposição com curadoria de Paula Alzugaray e Christine Van Assche aborda questões políticas e subjetivas como identidade, simulação, confronto e vigilância no diálogo entre os acervos do Pompidou e do MAM
O Museu de Arte Moderna de São Paulo abre sua programação de 2013 com uma exposição que possibilita novas leituras de seu acervo por meio do diálogo com cinco videoinstalações históricas da coleção do Centre Pompidou (Paris). Circuitos cruzados: o Centre Pompidou encontra o MAM traz cerca de 50 obras de artistas como Nam June Paik, Bruce Nauman, Cildo Meireles e León Ferrari e tem abertura no dia 22 de janeiro (terça-feira), a partir das 20h. O patrocínio master é da Biolab e o patrocínio é da Leroy Merlin. Além das cinco videoinstalações do acervo do Pompidou, será exibida na abertura Norte sul leste oeste, obra comissionada com recursos do Núcleo Contemporâneo do MAM ao norte-americano Tony Oursler, que consiste em uma projeção de rostos falantes nas árvores do Parque Ibirapuera, gerando a sensação de que as próprias árvores estão falando com o público.
A exposição resulta de um processo iniciado em 2008, quando Paula Alzugaray foi convidada para atuar três meses como pesquisadora no Service Nouveaux Médias (o acervo de novas mídias do centro de arte francês), do qual Christine Van Assche é curadora. A parceria possibilitou criar uma exposição inédita e exclusiva para o MAM com peças históricas do acervo do Pompidou, trazendo à tona um debate que utiliza os diferentes suportes e as diferentes temáticas presentes na seleção como base para evidenciar tópicos como identidade, cidadania, geopolítica, simulação, confronto e vigilância.
Na definição de Christine Van Assche, a participação do Pompidou na mostra “consiste numa escolha precisa de obras dos anos 1960-70 nas quais o dispositivo, o vídeo, a imagem em movimento, o som no espaço e o circuito fechado são utilizados por artistas minimalistas e conceituais [...]. Estas obras estabelecem relações com trabalhos contemporâneos da coleção do MAM, que datam dos anos 1970 até hoje, mesclando todas as áreas e suportes”.
Segundo Paula Alzugaray, “a diversidade de llinguagens e suas relações com o vídeo foram o primeiro aspecto que norteou a seleção de obras do acervo do MAM. O trabalho com palavraschave [...] permitiu flexibilizar fronteiras entre mídias e, assim, contemplar na curadoria obras de todos os suportes”. Essas palavras-chave que serviram como premissas de pesquisa e conexão entre ambos acervos estarão espalhadas pelas paredes do espaço expositivo, “convidando os visitantes a estabelecer suas próprias teias de relações entre os conceitos e as obras” (Paula Alzugaray).
São essas cinco videoinstalações de grandes dimensões que servem como condutoras do projeto expográfico, formando cada uma núcleos com as obras do MAM com as quais se relacionam. O primeiro deles baseia-se na obra The American Gift (1975) de Vito Acconci, que em sua disposição espacial remete à ideia do Cavalo de Troia, daí seu nome, trazendo consigo a problemática do encontro entre culturas e da colonização e pós-colonização. A obra entra em diálogo com trabalhos de Anna Bella Geiger, Lenora de Barros e a dupla Mauricio Dias e Walter Riedweg.
No segundo núcleo, o centro é o dispositivo Interface (1972), de Peter Campus, em que o espectador tem projetada sua imagem real e, simultaneamente, um duplo quase espectral, numa abordagem de questões sobre percepção identitária e representação. A instalação Amnésia (1991), de Rosângela Rennó, é das obras que se relacionam com a videoinstalação.
A obra de Dan Graham, Present Continuous Past(s) (1974), explora o conceito do cubo branco imersivo, no qual o espectador é gravado e vê sua imagem reproduzida várias vezes, o que o torna ao mesmo tempo objeto e visualizador da obra. O Rio (2006), de Artur Lescher, é um dos trabalhos que permeiam o núcleo.
Uma das obras emblemáticas de Bruce Nauman, Going Around the Corner (1970) também parte do cubo branco, que aqui não permite imersão, mas se fecha ao espectador, mantido ao redor dele. Câmeras de vigilância posicionadas nas quinas superiores do cubo captam a imagem do público e reproduzem em um dos monitores posicionados nos cantos e no chão. A curadoria selecionou, entre outras, a instalação Inmensa (1982), de Cildo Meireles, para estabelecer paralelos.
Finalmente, o coreano-americano Nam June Paik figura na mostra com a filosófica Moon is the Oldest TV (1965), em que televisores reproduzem um simulacro das variações das fases da Lua, na verdade uma construção técnica a partir do sinal eletrônico emitido pelos monitores catódicos.
Felipe Chaimovich, curador do MAM, ressalta um outro aspecto da mostra, a “evidenciação da sensação de vigilância que as obras trazem em si”, pelo próprio caráter de reprodução da imagem do público nos monitores e pela própria natureza do vídeo, que pressupõe o registro de todas as atividades ocorridas em seu escopo e, com isso, possibilita um controle e uma opressão de atividades não incluídas na normatividade cotidiana.
Pelas diversas indagações que a exposição traz e por seu ineditismo, Circuitos cruzados dá ao espectador a chance de levar para o cotidiano e o mundo em que vive uma visão ampliada de questões da atualidade.
AS CURADORAS
Christine Van Assche é belga e curadora-chefe do Service Nouveaux Médias do Centre Georges Pompidou, de Paris, para cujo acervo adquiriu mais de 1.800 trabalhos de nomes como Nam June Paik, Chris Marker, Dan Graham, Bill Viola, Stan Douglas, Aurélien Froment, Douglas Gordon, Hahn, Mona Hatoum, Pierre Huyghe, Zineb Sedira, Steve McQueen e Bruce Nauman. Fez a curadoria de diversas mostras ao redor do mundo, entre elas Tony Oursler : dispositifs no centro de arte Jeu de paume (Paris; SAM, 2011_; Ida e Volta : Ficção e Realidade, Fundação Gulbenkian (Lisboa, 2008); Body Sound, Liedts-Meesen Foundation (Gante – Bélgica, 2010); entre outros. Escreveu diversos catalogues raisonné e monografias e lecionou arte contemporânea versus video na universidade Paris VIII entre 1998 e 2001.
Paula Alzugaray é curadora independente, crítica de arte e jornalista especializada em artes visuais. Mestre em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicação e Artes da USP, e Doutora em Comunicação e Semiótica da PUC-SP. Edita a seção semanal de artes visuais da revista Istoé e é diretora de Redação da revista cultural seLecT. É autora do livro "Regina Vater: Quatro Ecologias" (Oi Futuro/Fase 3, no prelo). Entre seus projetos curatoriais recentes incluemse as exposições "Latin America Uncontained", na LOOP Fair Barcelona (Maio 2012); "Video Brésilienne: un Anti-Portrait", no Centro Georges Pompidou (Paris, outubro de 2010) e “Observatórios”, no Itaú Cultural, em Belo Horizonte e Vitória (2009). É autora do documentário “Tinta Fresca” (2004), prêmio de Melhor Media Metragem na 29ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, e de "Shoot Yourself" (2012), documentário realizado durante residência no Centre International d’accueil et d’échanges des Récollets, em Paris, Prêmio em Poéticas Investigativas, no Cine Move Arte 2012.