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agosto 29, 2012
Hector Zamora + Pablo Lobato na Luciana Brito Galeria
Para o mês de setembro, paralelamente à 30ª Bienal Internacional de São Paulo, Luciana Brito Galeria apresenta, pela primeira vez, mostras individuais dos artistas Héctor Zamora e Pablo Lobato.
Radicado no Brasil desde 2007, o mexicano Héctor Zamora é mundialmente conhecido por seus trabalhos em lugares públicos, que na maioria das vezes rearticula as características físicas de ambientes urbanos e arquitetônicos. Normalmente evocando as comunidades locais para um esforço coletivo, o artista se utiliza de materiais pesados para desenvolver estruturas aparentemente leves ou que apresentam um aspecto de fluidez.
Já o artista mineiro Pablo Lobato nunca teve seu trabalho mostrado em exposição individual na cidade de São Paulo. Ele faz parte de uma geração de jovens realizadores brasileiros que focam suas pesquisas na produção de obras híbridas, promovendo um forte diálogo do cinema e do vídeo com as artes plásticas.
Héctor Zamora - Inconstância Material
O fator surpresa permeia o trabalho de Héctor Zamora, “Inconstância Material”. Com um caráter totalmente experimental, o projeto trabalha a arte da ‘performance’ (digase: o artista não gosta muito dessa denominação) de forma extraordinária. A ideia é envolver o espaço arquitetônico da galeria numa coreografia de narrativa confrontadora e dinâmica, que nos leva a questionar o comportamento humano e seus desdobramentos lúdicos e práticos.
A transformação e a dinamicidade do espaço temporal e concreto são assuntos levantados pela ação proposta por Zamora. Por meio de vinte pedreiros e vários milheiros de tijolos, o artista se utiliza da técnica “formiguinha” ou “passa mão” (ação de jogar tijolos que ajuda os trabalhadores da construção civil a dinamizar o processo das grandes construções) não só para ilustrar a realidade cultural dos hábitos locais, como também chamar a atenção para a inconstância do material orgânico que utilizamos para subir as paredes que nos cerceiam. Segundo Zamora: “chamar a atenção para a inconstância da matéria, que em vez de pesada é leve, em vez de estática, é movimento, em vez de sólida é fluídica. A terra que se transforma em cerâmica, tijolo, e que cresce em construções”.
Como num processo quase simbiótico, a ação traz, ainda, uma intervenção discursiva do artista Nuno Ramos: “Gigante”. Ele se associa do contexto coreográfico da obra de Zamora para enfatizar a força popular das tradições que nos rodeiam. A ‘inconstância material’ aqui é utilizada como um instrumento para ajudar Nuno Ramos a compor a poesia, com um quê de concreta, que embala a ‘dança’ proposta por Zamora. “Inconstância Material” surge como o resultado de anos de estudos sobre a ação e o dinamismo como objetos principais de suas obras.
A maquete que possibilitou todo o estudo por parte de Héctor Zamora, bem como vídeo documentário sobre o trabalho, também fazem parte da exposição e funcionam como suporte para entender a obra nos intervalos das ações.
Pablo Lobato - Do Corte
Nessa sua primeira individual na Luciana Brito Galeria, Pablo Lobato trabalha sua vocação em sensibilizar frações do mundo que nos cerca através de noções a respeito do ‘corte’. ‘O corte’ nas obras de Pablo Lobato é uma maneira de ver que define os limites entre o que é capturado e o que é excluído pelo observador, ou pelo próprio artista em sua obra. O crítico Jacopo Crivelli Visconte, aproxima ‘ o corte’ de Pablo Lobato ao conceito de “corte” da filósofa e cientista norte-americana Karen Barad. De acordo com Barad, todos os elementos, humanos e não-humanos, que compõem o universo em que vivemos, estão numa condição de “inseparabilidade ontológica”, a tal ponto que pessoas e coisas não antecedem sua interação, mas passam realmente a existir apenas no momento da sua “intra-ação” [intra-action].
Assim como para Barad, Pablo Lobato trabalha ‘o corte’ como um modo de ‘fazer ver’. Um olhar atento e flutuante do artista, dedicado ao mundo a sua volta, captando situações e materiais imprevistos, transmitindo à construção de cada ‘corte’ sensações e forças disponíveis. Tais procedimentos ecoam experiências do artista no campo do cinema. “Castell” (2012), obra inédita da exposição, talvez seja a que mais enfatiza essas questões. Crivelli assim explica: “no começo do vídeo, o corte operado pela câmera coincide com o centro dos acontecimentos, mas quando as duas lógicas (a da câmera e a dos acontecimentos) descolam-se, o espectador sente fisicamente a violência do ato e é levado a colocar em questão a “suposta naturalidade” do que está vendo. É levado, em outras palavras, a sentir que vê”.
Já em “Bronze Revirado” (2011), videoinstalação que também faz parte da exposição, o corte se manifesta na repetitiva e violenta caída do sino, que dita a coreografia intensiva de seus manipuladores. Na série de fotografias coletivamente intituladas Front Light (2012), o negro aveludado, que evoca a manière noire de antigas gravuras, age como se nos dissessem em em silêncio – ‘há algo para ser visto’. O que sempre nos pareceu apenas um plano, revela ser, também, um corte na paisagem.
Na série de fotografias “Um a zero” (2012), nunca antes apresentada ao público, Pablo Lobato leva seu corte para o universo do futebol e, bem como explica o historiador de arte Júlio Martins, “no instante glorioso do gol, por um intervalo breve de tempo toda a malha hexagonal, antes regular, reage às reverberações e conforma uma nova configuração que percorre sua fibra antes que recupere o repouso. Interessa ao artista, nessa topografia instantânea que se desenha, a incorporação de uma geometria flexível, sensual, plena em suas potências mais urgentes de desarranjo”.
Ainda como parte da exposição, serão apresentadas duas outras obras inéditas, a videoinstalação “Nascente” (2012) e a instalação “Escada” (2012), ambas pensadas dentro de uma economia que também nos faz voltar, finalmente, a ver o mundo e a criar consciência sobre o que estamos vendo.
Sobre os artistas
Héctor Zamora
1974, Cidade do México, México. Vive e Trabalha em São Paulo, Brasil. Formado em Design Gráfico pela Universidade Autônoma Metropolitana – Xochimilco, Héctor Zamora teve suas obras reunidas em diversas exposições individuais, como no Zeppelin Museum, na Alemanha; em Auckland, na Nova Zelândia; Itaú Cultural, em São Paulo; Garash Galería e La Torre de los Vientos, Cidade do México. Além disso, participou das exposições, como o 32º Panorama da Arte Brasileira, em São Paulo, Resisting the Present, Amparo Museum, México, 53ª e 54a Bienal de Veneza, Itália, 12ª Bienal Internacional do Cairo, Egito, Disponible, SFAI, em São Francisco, EUA, FGAP, Pinchuk Art Centre, Kiev, Ucrânia, Bienal de Liverpool, GB, além da Paralela, em São Paulo, Trienal de Aichi, Nagoya, no Japão, 27th Bienal Internacional de São Paulo, Brasil, Bienal de Pusan, Coreia do Sul, 9º Bienal de Havana, em Cuba, Reina Sofía, em Madri, na Espanha, etc.
Pablo Lobato
Nasceu em Bom Despacho, Minas Gerais (1976), e vive em Belo Horizonte. Antes de ter as artes plásticas como principal campo de atuação, sua prática artística concentrou-se no cinema. Atualmente sua pesquisa é mais orientada pelos sentidos que determinadas matérias e experiências informam do que por linguagens específicas. Um dos criadores da Teia - Centro de Pesquisa Audiovisual (BH). Diretor do filme "Acidente", premiado como melhor documentário Ibero-Americano em Guadalajara, México (2007). Foi, ainda, selecionado pelo projeto Bolsa Pampulha (2008), além de bolsista da John Simon Guggenheim Foundation, New York (2008-2009) e merecedor do Prêmio Marcantonio Vilaça, Funarte (2009-2010). Tem participado de exposições individuais e coletivas em galerias e em instituições de arte como MAM, São Paulo; Bienal de Cerveira, Portugal; Museu Tamayo, México; Akademie der Kunst, Berlim; New Museum, New York, entre outras. Está prestes a lançar seu mais novo longa metragem, “Vento de Valls”.