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setembro 20, 2004
Movimento carioca
Matéria de Adriana Pavlova, publicada originalmente no Segundo Caderno do jornal O Globo no dia 19 de setembro de 2004.
Adriana Pavlova
Para os mais desavisados pode até parecer uma desforra à carioca do rega-bofe artístico de primeira que vai acontecer em São Paulo a partir do próximo domingo. Só parece, apressam-se em dizer os galeristas que estão por trás do "Arquivo geral", evento-exposição carioca que pega carona na 26 Bienal de São Paulo para atrair olhares estrangeiros para a cidade. A mostra que já nasce histórica porque nesses anos todos de bienais de artes plásticas na cidade vizinha nunca houve nada do gênero por aqui é apenas a ponta de um movimento que só tende a crescer no Rio durante toda a semana, divulgando artistas brasileiros, sim, para as personalidades de fora, mas oferecendo também uma espécie de bienal à carioca para o público da cidade.
Revanche por causa de São Paulo? Longe disso. Estamos todos nos ajudando explica a marchand Heloísa Amaral Peixoto, da HAP. Quanto mais eventos aqui e lá, é bom para todo mundo. Além disso, quem vem de fora vai ver que não é só um reduto, mas muitos juntos. Os próprios colecionadores daqui estão animados com a idéia e ajudando a divulgar. Caso de Gilberto Chateaubriand, que já está no grupo de apoio. Tenho certeza que todo o movimento aqui vai repercutir na Bienal em São Paulo.
Donos de galerias querem retomar papel do Rio nas artes
À espera de um grupo de cerca de 70 curadores, críticos, colecionadores de arte de todo o mundo que antes de chegar a São Paulo passam pelo Rio, o "Arquivo geral" abre suas portas amanhã à noite em pleno Jardim Botânico. São 42 artistas escolhidos a dedo por seis galerias da cidade em exposição num charmoso galpão o Arquivo Geral reformado e no meio do verde botânico. Um mistura digna de seleção brasileira das artes encabeçada por Hélio Oiticica e Amilcar de Castro e que tem também Daniel Senise, Miguel Rio Branco, Nelson Leirner, José Bechara, Anna Bella Geiger, Antonio Manuel, Gonçalo Ivo e muitos outros, que, em alguns casos, criaram obras especialmente para a ocasião. A exposição, que tem apoio da Secretaria municipal das Culturas, é apenas o começo.
Tenho certeza de que a mostra será uma grande retomada para que o Rio volte a ser o celeiro de arte que sempre foi, mas que, por causa de sucessivas crises econômicas, entregou esse poder aos paulistas diz a marchand Silvia Cintra, da galeria que leva o seu nome. Se pelo menos 80 por cento dos mais importantes artistas do país vivem na cidade, não dá para não usar isso a nosso favor.
Pelo menos todas as seis galerias envolvidas na preparação do evento também tiraram do baú seus próprios acervos para atrair a atenção dos estrangeiros poderosos e em alguns casos até lançaram mão de convidados de fora, caso da Lurixs, em Botafogo, que além de abrir mais uma sala de exposição apresenta o trabalho do português Daniel Blaufuks e do francês François Morellet. As outras galerias estão espalhadas pela cidade como a HAP no Jardim Botânico, Anita Schwartz na Barra e no Leblon, a Silvia Cintra e a Laura Marsiaj em Ipanema, e a Mercedes Viegas na Gávea. Uma reunião histórica, como lembra a veterana Anita Schwartz:
É um momento de virada. Há 20 anos estou à frente de uma galeria no Rio e nunca vi um movimento como este e, principalmente, evento que aproveitasse a programação da Bienal de São Paulo para lançar o Rio internacionalmente. Tenho certeza de que todos vão ganhar: público, galeristas mas, sobretudo, os artistas que precisavam ser lembrados além de São Paulo.
O roteiro da minibienal à carioca prossegue ainda com os eventos relacionados entre si: o mesmo Morellet terá uma mostra inteira no Centro de Arte Hélio Oiticica, enquanto no Arte Sesc (Flamengo) será inaugurada a mostra "Reprodutores de sentido", com exemplares da arte contemporânea portuguesa. Esta última, que faz parte do evento "Brasil-Portugal: uma ponte para o futuro", antecipa a participação lusitana na Bienal de São Paulo, reunindo estrelas das artes daquele país. A turma de curadores/artistas/críticos/colecionadores portugueses que anda por aqui também vai engrossar a lista dos convidados do "Arquivo geral".
O que a gente sentia até a última bienal é que os convidados de fora estavam muito interessados em conhecer a produção carioca mas tudo acontecia de uma forma muito isolada. Os coitados até vinham para o Rio, encaixando a cidade no roteiro da viagem, mas aqui precisavam ficar pulando de galeria em galeria, sem nada muito organizado. Perdiam eles e nós também afirma Heloísa, da HAP.
A pequena bienal terá direito ainda a uma festona para convidados no Museu de Arte Moderna e a um jantar, mais íntimo, na casa de um colecionador carioca.
Entre os visitantes, o diretor da Tate e o curador de Basel
Neste vão estar os convidados VIPs da delegação internacional. Nomes que podem dar o que falar às artes cariocas se o que virem por aqui cair nas suas graças. Na lista há Samuel Keller, que comanda as feiras de arte de Basel e de Miami; Nicholas Serotta, diretor da Tate Gallery de Londres; além de todo o comitê da mesma Tate responsável pelas aquisições de obras latino-americanas. A ambição dos galeristas daqui não é nada pequena.
Nosso sonho, claro, é lançar com a presença das personalidades internacionais o embrião para uma feira de artes na cidade diz Ricardo Rêgo, da Lurixs. Estamos, inclusive, agendando uma reunião do secretário das Culturas, Ricardo Macieira, com Samuel Keller, que, segundo uma revista americana, está entre as cem personalidades mais importantes das artes plásticas no mundo. O nome de Keller pode servir como uma grife para atrair outros interessados.
A torcida carioca das artes agradece.
Informações:
Arquivo Geral
21 de setembro a 17 de outubro de 2004
Jardim Botânico do Rio de Janeiro
Rua. Jardim Botânico 1008
21-2294-9349
Terça e quinta a domingo, das 11h às 17h; quarta, das 11h às 21h
Preço R$ 4
Parece correto pegar carona na histórica Bienal de São Paulo, mas minibienal é triste.O Rio de Janeiro sempre foi um celeiro das artes visuais,mas isso é resultado de "um jeito de corpo" quase sempre sem apoio institucional mesmo.Esta "minibienal"não é uma virada, e não me parece ser este o nosso caminho.Também não lançará o Rio internacionalmente. Ora o RJ apareceu internacinamente com os trabalhos de Sérgio Camargo, Hélio Oiticica e Ligia Clark. Ali, sim, acontecia algo relevante, mas que eu saiba sem apoio algum, além do Sérgio que falou de Helio e Ligia para o Guy Bret. Eles praticamente não venderam nada. Usaram os recursos que dispunham. Ainda hoje vivemos do reflexo da ação deles. Eles são o nosso Jackson Pollock na capa da revista Life.Alguma coisa aconteceu ali e mudou o rumo da arte brasileira e a Bienal de São Paulo está aquém desse evento. A natureza do RJ não está ligada a uma bienal de espaço enclausurado. O RIO é uma " Cidade Aberta" , o neo-concretismo é prova disto.Talvez nossa NATUREZA seja a de estar à luz do sol e à luz da chuva, à luz do vento e da Maresia. Precisamos inaugurar um evento que não é mesmo uma Bienal, mas algo que esteja pelas ruas, com o povo, nas calçadas, nas roupas e na pele e nos sentidos...na "carnalidade" da cidade.
Posted by: alberto saraiva at setembro 22, 2004 11:02 AMA iniciativa é ótima para todo o meio artístico, temos mais é que pegar carona com a Bienal (consagradíssima). Sou paulistana, publicitária e me mudei para Piracicaba (interior de São Paulo)a um ano. Aqui em nossa cidade tbém vamos ter dois eventos paralelos o SAC (Salão de Arte Contemporânea, que já existe a 36 anos) e o Temporâneo1 (salão Contemporâneo Alternativo.
Desde que me mudei para Piracicaba venho desenvolvendo arte com consciência ecológica. Crio painéis decorativos com madeira ou ferro de demolição. Visitem meu site, gostaria de opiniões de pessoas ligadas a arte.
www.atelie.brasilarteiro.nom.br
Prezados,sou fotógrafo carioca e venho por meio deste complementar ,sob o ponto de vista dos artistas cariocas,ainda não reconhecidos,evidentemente por falta de oportunidades que as presentes galerias não nos dão.Estou achando bastante interessante estes comentários de marchands que já tive oportunidade de encontrar e até deixar portifólios para valiação,falando que o mercado carioca não vem recebendo o merecido olhar no quadro brasileiro.Na verdade só querem saborear os artistas já consagrados que não estão no momento precisando daquele belo apoio que todos nós precisamos no início: nos deixar mostrar nossas obras,vendê-las e nos incentivar a produzir mais.Será que todos nós artistas que não participamos de panelinhas,e que não temos quem nos indique,pois contamos apenas com nosso talento e força de vontade,teremos que seguir os passos do artista plástico Antônio Veronese que foi embora pra França,já que o mercado aqui não o absorveu??Fica esta a pergunta e um abraço a todos!
Josué Júnior