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julho 7, 2011
Fora de controle por Nina Gazire, Istoé
Fora de controle
Matéria de Nina Gazire originalmente publicada no caderno Cultura da revista Istoé em 7 de julho de 2011.
RUMOS ARTE CIBERNÉTICA/ Itaú Cultural, SP/ até 4/9
O termo cibernética vem do idioma grego e originalmente se relacionava ao comando do prumo de uma embarcação. Como ciência, a cibernética surgiu em 1948, quando o cientista americano Norbert Wiener escreveu o artigo “Cibernética e sociedade”, dando à palavra a função de definir o controle de qualquer sistema de comunicação, seja ele maquínico, seja animal. Assim como diferentes disciplinas se somaram às artes visuais, como a biologia, que resultou na bioarte, a junção entre arte e cibernética ganha uma vitrine dentro desta segunda edição do Rumos Arte Cibernética. Realizado desde 2006 pelo Itaú Cultural, o programa visa selecionar, por meio de edital, trabalhos de artistas que possuem pesquisa dentro deste campo.
Na arte cibernética é imprescindível que exista uma coprodução entre os diferentes sistemas que compõem a obra de arte. “Quando se fala em arte cibernética, pensamos em um conceito mais abrangente do que vem a ser a interatividade.
O artista transfere toda a poética e autoria para as reações que acontecem no sistema da obra, seja com pessoas, seja com máquinas”,
explica Marcos Cuzziol, gerente do Itaulab – Núcleo de Arte Cibernética do Itaú Cultural.
Um exemplo é o trabalho do paulistano Márcio Ambrósio, “12i – A Roda da Vida”. O artista realizou uma releitura de um zootrópio (foto), tambor circular com cortes, através dos quais o espectador pode observar desenhos colocados em seu interior que, ao girar, ganham movimento. Nessa obra, o público possui seus movimentos captados por uma câmera. Posteriormente, por meio de um tíquete inserido no zootrópio, o visitante pode ver 12 imagens de seus movimentos organizadas por um software que as transforma em uma animação. Dessa forma, tanto a autoria da animação, que fica a cargo do software e do público, quanto a exibição que acontece no zootrópio funcionam como sistemas independentes da ação do artista.
Além dessa obra, outros seis trabalhos, selecionados para o Rumos Arte Cibernética, participam da mostra que inclui também obras do artista Ricardo Nascimento e Juliana Cerqueira, selecionadas na primeira edição, em 2006.
A arte de desiludir por Paula Alzugaray, Istoé
A arte de desiludir
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada no caderno Cultura da revista Istoé em 7 de julho de 2011.
Espelhismos e simulacros diluem as fronteiras entre realidade e ficção em exposição em São Paulo
Assim é se lhe parece/ Paço das Artes, SP/ até 18/9
A desilusão teria sido o complô da arte contemporânea contra a representação do mundo em imagem. Quem argumenta é o filósofo francês Jean Baudrillard (1929-2007), teórico do simulacro, das aparências, dos artifícios e do “excesso de realidade” da cultura moderna. Desiludir seria combater o real – e todo espaço representativo herdado do Renascimento. Isso porque, ao contrário do que se poderia prever, “a ilusão potencializa o real”. Essas ideias, que durante a vida de Baudrillard fizeram barulho e geraram polêmica, revivem nas obras da exposição “Assim É Se Lhe Parece”, no Paço das Artes, em São Paulo.
A mostra é formada por 11 obras de artistas brasileiros e estrangeiros que jogam com as possibilidades do engano e da ilusão. “Lousa”, de Bruno Dunley, pode ser considerada uma imagem referencial, um ponto de partida para o entendimento desse tipo de partido artístico. Graças às qualidades de simulação atingidas pela técnica pictórica, o óleo sobre tela ganha a aparência de giz sobre lousa. Assim, a pintura de Dunley é um simulacro de uma lousa real. Com isso, evoca a expectativa, que vigorou do Renascimento ao modernismo, de que a pintura é uma janela para o real.
A fotografia, o cinema e o vídeo viriam depois a tomar emprestada essa função da pintura. E a exposição no Paço das Artes dá conta de informar que a ilusão é a linha que costura a pintura a todas as novas mídias: da fotografia à videoinstalação em animação 3D.
A qualidade de colocar a realidade em suspensão está presente, por exemplo, nas fotografias do argentino Leandro Erlich. As três fotos apresentadas partem de uma instalação, na qual é utilizado o recurso do reflexo. Nela, as pessoas desafiam as leis da realidade quando, num jogo de espelhos, se posicionam sobre imagens de fachadas de prédios e casas.
Os trabalhos expostos em “Assim É Se Lhe Parece” assimilaram a crise da representação e ao mesmo tempo devolvem à ilusão o seu papel decisivo. O título faz referência à peça homônima do dramaturgo italiano Luigi Pirandello (1867-1936) – “Così È, Se Vi Pare”, escrita em 1917.
julho 5, 2011
Exposição O espaço aberto faz reflexão sobre os limites da obra de arte por Nahima Maciel, Correio Braziliense
Exposição O espaço aberto faz reflexão sobre os limites da obra de arte
Matéria de Nahima Maciel originalmente publicada no caderno Diversão e Arte do jornal Correio Braziliense em 5 de julho de 2011.
As paredes brancas da galeria podem ser o limite físico, mas existe um outro que não se rende à fronteira de tijolos e doma o espaço conforme a idealização do artista. É esse o universo de interesse da curadora Ana Rocha. Ela quer entender até onde é possível uma obra subverter a estrutura de um espaço a partir de uma perspectiva poética, mas também física. Foi esse o termômetro para convidar Eliane Prolik, Cléverson Sálvaro, Deborah Bruel e Joana Corona e incutir nos artistas a missão de criar uma obra especialmente projetada para as galerias Piccola 1 e Piccola 2 da Caixa Cultural. O espaço aberto inaugura hoje com uma proposta de site specific para um espaço estreito e de difícil manipulação.
As duas galerias têm estruturas de corredores e é difícil imaginar alguma outra configuração com paredes tão próximas umas das outras. “Eu queria uma exposição em que a obra é uma intervenção no espaço. É uma reflexão sobre os limites da obra de arte. Então escolhi artistas que já vinham trabalhando com isso”, avisa a curadora.
Perspectivas
Para brincar com área de tamanho reduzido, Deborah manipula perspectivas. Um jogo de espelhos serve de instrumento para confundir o público a induzir à percepção de profundidades muito maiores que as originais. Na Caixa, Deborah fotografou parte da galeria e plotou a imagem na parede para provocar a sensação de amplitude. Um espelho completa a obra. “A tendência é que o espaço expositivo não interfira nos trabalhos e tenho sempre essa vontade de fazer o espaço aparecer. A arquitetura do lugar é o que me interessa”, explica a artista.
O volume da escultura de Eliane engana tanto quanto os espelhos de Deborah. Com 12m de comprimento, a peça é grande e toda vazada, o que confere um aspecto de transparência à escultura. “E esse aspecto dá uma leveza ao olhar”, avisa Ana. Joana brinca com a mesma ideia ao tomar sua formação em letras como base para a intervenção. Suas letras vazadas e translúcidas projetadas na parede dialogam de maneira perspicaz com o trabalho de Eliane.
Já Cléverson é o mais radical do grupo. Não lhe basta o aspecto reto e monótono do corredor. Ele não reconhece o espaço e cria uma curva com placas de MDF para quebrar a rigidez da galeria. “O percurso normal dos espectadores num espaço não é muito percebido pelo próprio público e meu trabalho é um gesto muito simples que amplifica a percepção desse gesto de caminhar pela galeria.”
O ESPAÇO ABERTO
Exposição de obras de Eliane Prolik, Cléverson Sálvaro, Deborah Bruel e Joana Corona. Curadoria: Ana Rocha. Abertura hoje, às 19h, nas galerias Piccola 1 e Piccola 2, na Caixa Cultural (SBS Qd 4 Lote 3/4)
Cliques modernos por Adriana Martins, Diário do Nordeste
Cliques modernos
Matéria de Adriana Martins originalmente publicada no caderno 3 do jornal Diário do Nordeste em 5 de julho de 2011.
De passagem por Fortaleza, o artista visual Christian Caselli realiza a exposição "Foto-celular", de imagens feitas com câmeras de telefones
Há alguns anos, os telefones celulares deixaram de servir apenas para completar ligações. Hoje, eles só não fazem café - mas permitem navegar na internet, mandar mensagens, e-mails, ouvir música, gravar vídeos e fazer fotos. Essa última função, por exemplo, é a mais importante do aparelho do artista visual carioca Christian Caselli, idealizador do projeto "Foto-celular", cuja exposição abre em Fortaleza no próximo dia 8.
O objetivo da mostra é expor e discutir com o público a existência de uma possível nova linguagem fotográfica, proveniente do uso das telefonias móveis. A exposição contará com mais de 500 projeções de imagens, exibidas a cada 10 segundos. Uma parte delas será fotografada em Fortaleza, poucos dias antes da abertura. Será a primeira vez que Caselli clica cenas da capital cearense. Amanhã, ele ministrará ainda uma oficina gratuita sobre o projeto.
Segundo o artista, o evento mostra todo o ecletismo do formato celular, que pode registrar tanto fatos banais do cotidiano a flagrantes únicos, passando também por paisagens marcantes a experimentos gráficos.
"Tudo começou espontaneamente, foi interessante. Trabalho mais com audiovisual, na parte de cinema e vídeo. Uma vez fiz um vídeo chamado ´O paradoxo da espera do ônibus´. Ele fez um certo sucesso na internet, foi muito visto e comentado. Por isso, resolvi inscrevê-lo no Art.Mov, um festival de cultura que acontece em Belo Horizonte. Fiquei em segundo lugar e ganhei um telefone celular, com o qual faço as fotos até hoje", recorda Caselli.
"Como qualquer criança com seu brinquedo novo, quis testar suas possibilidades. Fui tirando fotos, tirando fotos e quando percebi estava ficando com um material legal. Foi quando me veio a ideia da exposição", explica o artista visual.
Para Caselli, uma das vantagens que a da telefonia móvel trouxe às artes visuais é a possibilidade de construir imagens a qualquer instante. "Tipo quando você se pergunta ´e se eu estivesse com uma câmera agora?´. Estamos sempre com celular, podemos tirar fotos a qualquer momento do dia. Isso rende vários baratos interessantes, desde flagrantes até ideias mais elaboradas. Já fiz a exposição ´Foto-celular´ no Rio, e estou no segundo ano com ela. Acho que aqui em Fortaleza também vai ser bacana", comemora.
Para além da questão da mobilidade e do imediatismo, Caselli ressalta outra contribuição importante das novas tecnologias da imagem. "O celular proporciona o surgimento de uma nova linguagem, e daí emerge uma discussão interessante. Se o aparelho não tem qualidade tão boa para fazer vídeos ou fotos, você tem aquele resultado meio pixelado, tremido. Isso não deixa de ser uma estética própria, e é bacana testar suas possibilidades", esclarece.
Olhar sensível
Vale destacar também a relativa democratização do acesso aos meios de produção promovida por essas novas tecnologias. Se antes a fotografia era um processo complexo, caro e demorado, hoje qualquer pessoa pode se tornar geradora de conteúdo - sem entrar no mérito da qualidade do mesmo.
É cada vez mais comum, por exemplo, o público contribuir para os veículos de comunicação com flagrantes de situações importantes registrados em fotos ou vídeos amadores. Mesmo a foto posada, comum em ambiente familiar ou de amigos, não deixa de ter valor. No futuro, constituirá o registro de uma época, uma moda, uma estética. Sem contar a possibilidade de explorar detalhes do cotidiano, entre cores, texturas, detalhes, paisagens e outros elementos.
"A oficina vai ser bem por aí. Quero passar aos alunos uma sensibilização, que permita observar melhor coisas do aia a dia. A gente presta pouca atenção ao nosso entorno, há muitas coisas maravilhosas e esteticamente interessantes", avisa o artista carioca.
Formando em Jornalismo, Christian Caselli é mais conhecido no audiovisual alternativo carioca por sua produção acelerada (cerca de 40 obras, entre clipes e curtas) de baixo orçamento, sempre fazendo direção, roteiro e edição de todos. Seus filmes podem ser facilmente encontrados no Youtube.com e no site Curta o Curta. É também curador e responsável pela parte videográfica da Mostra do Filme Livre, que teve sua décima edição no Centro Cultural Banco do Brasil (RJ e SP) em 2011, além de professor em oficinas de vídeo e fotografia.
MAIS INFORMAÇÕES
Exposição "Foto-celular". Abertura no dia 8 de julho, às 18 horas, no CCBNB (Rua Floriano Peixoto, 941, Centro). Em cartaz até 30 de julho (horários de visitação: terça-feira a sábado, de 10 horas às 20 horas; e aos domingos, de 12 horas às 18 horas). Oficina sobre o projeto: de amanhã até sexta-feira (8), de 14 horas às 18 horas. Inscrições até hoje na recepção do CCBNB. Gratuito.
julho 4, 2011
Fantasias maquínicas por Paula Alzugaray, Istoé
Fantasias maquínicas
Matéria de Paula Alzugaray originalmente publicada no caderno Cultura da revista Istoé em 1 de julho de 2011.
MÁQUINAS/ Oi Futuro, Belo Horizonte/ de 29/6 a 21/8
A fábrica é assunto de fascinação do cinema desde seus primeiros frames de vida. Os irmãos Lumière começaram a história do cinema filmando a saída de operários de uma fábrica na França, em 1895, e essa imagem se tornaria um ícone, citada e apropriada inúmeras vezes nos séculos 20 e 21. A partir dela, o cineasta alemão Harun Farocki criou a videoinstalação “Workers Leaving the Factory in Eleven Decades” (Trabalhadores deixando a fábrica, em 11 décadas), em 2006. Um ano depois, Farocki continuaria imerso no universo das fábricas ao filmar “Comparison Via a Third” (Comparação via um terço), em que coloca lado a lado imagens de uma olaria tradicional na África e uma fábrica com tecnologia de ponta, na Europa. Esse é um dos trabalhos expostos em “Máquinas”, no Oi Futuro de Belo Horizonte. Com curadoria de Alfons Hug e de Alberto Saraiva, a exposição reúne 15 trabalhos em vídeo, performance e audioinstalação que exploram as fantasias maquínicas que povoam a arte contemporânea.
A ideia que orienta as escolhas da exposição é a de que a máquina como sinônimo de progresso não é uma visão compartilhada pela arte. O artista – seja ele turco, brasileiro, chinês ou canadense –, invariavelmente, expressa um posicionamento crítico em relação ao poder e ao efeito das máquinas na sociedade. A abordagem do tema pode ser mais inventiva – caso do coletivo mineiro “O Grivo”, que na instalação “Quarteto para Gravadores” (foto) confere nobreza ao som produzido pelas engrenagens dos aparelhos – ou problematizante, como no vídeo do taiwanês Chen Chieh-Jen, que denuncia a exploração das operárias em uma fábrica têxtil.
Performance em alto-mar por Nina Gazire, Istoé
Performance em alto-mar
Matéria de Nina Gazire originalmente publicada no caderno Cultura da revista Istoé em 1 de julho de 2011.
Com exposições em Fortaleza e São Paulo, a artista pernambucana Amanda Melo apresenta sua visão do litoral brasileiro
AMANDA MELO - ÁGUA VIVA/ Centro Cultural Banco do Nordeste, Fortaleza/ até 31/7 ESPLENDOR/ Galeria Moura Marsiaj, SP/ até 30/7
No livro “Água Viva”, publicado em 1971, a escritora Clarice Lispector se queixou sobre essa restrição que temos em vida de “não podermos andar nus nem de corpo e nem de espírito”. Clarice sugere que sejamos como a água, fluida e transparente, e é a partir desse preceito que a artista pernambucana Amanda Melo vem realizando uma série de ações performáticas que têm como pano de fundo as diferentes paisagens litorâneas brasileiras.
O resultado desta navegação artística pode ser conferido em duas exposições simultâneas em cartaz na Galeria Moura Marsiaj, em São Paulo, e no Centro Cultural Banco do Nordeste, em Fortaleza.
Tudo começou em 2007, com a ação registrada no vídeo “Enquanto Tudo Passa”. Nesta performance, a artista usa um salto alto e se equilibra em cima de uma pedra na praia de Boa Viagem, no Recife, recebendo em seu corpo o choque das ondas na arrebentação. Em 2009, quando ganhou uma bolsa do Salão de Artes Plásticas de Pernambuco, decidiu dar continuidade ao projeto. Realizou uma viagem de um ano pelo litoral brasileiro, partindo da Barra do Chuí, no Rio Grande do Sul. Amanda percorreu diversas cidades, registrando, por meio de desenhos, fotografias e vídeos, as diferentes orlas marítimas do País até Calçoene, no Amapá, a cidade litorânea mais ao norte do Brasil. “As imagens dessa vivência são como os registros de uma performance de longa duração”, diz ela.
Na exposição “Água Viva”, em Fortaleza, com curadoria de Bitu Cassundé, se concentram os trabalhos fotográficos em que foram retratadas três meninas deitadas em um recife, em referência às ninfas mitológicas. Já “Em Paragens”, cujo título faz menção ao termo usado por navegadores quando estão ancorados, a artista aparece flutuando como uma água-viva à deriva em um conjunto de imagens subaquáticas. Ao contrário do título, as fotos sugerem movimento e instabilidade.
Na segunda exposição, “Esplendor”, em São Paulo, estão reunidos os vídeos e a série de desenhos “Sal é Mar”, um apanhado dos registros feitos das praias brasileiras. Entre os vídeos está a videoperformance que dá nome à exposição. Nessa obra, a artista criou uma fantasia em parceria com a Associação dos Destaques das Escolas de Samba Paulistanas, feita de espelhos e objetos brilhantes. De volta à praia de Boa Viagem, seu ponto de partida, a artista realiza uma ação vestida com a fantasia, despindo-se de seus adereços e amarrando-os em uma corrente que, aos poucos, é jogada no mar. Ao final, Amanda fica nua sobre o rochedo e livre como a água-viva sugerida por Clarice Lispector.
Todos por um por Catharina Wrede, O Globo
Todos por um
Matéria de Catharina Wrede originalmente publicada no caderno Cultura do jornal O Globo em 4 de julho de 2011.
Parque Lage faz leilão beneficente de arte, com obras de 36 artistas contemporâneos, para ajudar galerista Sandra Spritzer
RIO - É uma oportunidade rara. Artistas como Daniel Senise, Ernesto Neto, Raul Mourão, Niura Belavinha, Matheus Rocha Pitta, Laura Lima, Roberto Cabot e Bob N e se uniram para montar um leilão beneficente na Escola de Artes Visuais (EAV) do Parque Lage hoje à noite, em prol de uma causa nobre: ajudar a custear os tratamentos médicos da galerista Sandra Spritzer, que sofreu um derrame no ano passado e está internada, em fase de recuperação. Quem teve a ideia, organizou e reuniu todo mundo foi o artista plástico Matheus Rocha Pitta, amigo de Sandra. O leilão começa às 20h e deve ter três horas de duração.
- Mais do que pelo dinheiro que vamos arrecadar, esse leilão é um gesto afetivo - diz Matheus. - Convidei pessoas que tinham uma ligação com a Sandra e que eu sabia que iriam participar. Estamos fazendo um esforço para concentrar essa energia positiva. E não é uma coisa hippie. É não ficar parado de braços cruzados observando o que pode ou não acontecer.
Obras de R$ 300 a R$ 15 mil
Ao todo, 36 artistas participam do evento, com uma obra cada um. São esculturas, desenhos, pinturas, fotografias e gravuras, que estão expostas desde anteontem na EAV para visitação.
Os lances mínimos vão de R$ 300 (a fotografia "Arquipélago", de Pedro Motta) a R$ 15 mil (a obra "Quadros superpostos", de Renata Lucas). O leilão conta com trabalhos bastante representativos da arte contemporânea brasileira, como uma litogravura de 2005 de Daniel Senise (R$ 3 mil); a obra "Embriolóbulos", tela em caneta e aquarela, de Ernesto Neto, (R$ 11 mil); uma pintura-foto de Niura Belavinha, da série "Performed painting - Espelho móvel/interferência urbana Pampulha" (R$ 3 mil); e fotografias de, entre outros, Marcos Bonisson, Matheus Rocha Pitta e Bob N.
- O preço que colocamos não é o de mercado, porque esse não é um leilão como o da Bolsa de Arte, por exemplo. Por isso, estamos tendo um certo cuidado para diferenciá-lo. O grande lance é juntar dinheiro para a Sandra - explica Matheus, que está colocando à venda hoje, por R$ 4 mil, uma obra sua que na galeria custaria R$ 6 mil.
Matheus diz que a ideia é, assim que acabar o leilão, levar pessoalmente o cheque para a mãe de Sandra, em Porto Alegre e, junto com ele, um vídeo para a galerista assistir. O artista está pegando depoimentos de todos os envolvidos no leilão, não só os artistas, mas moldureiros, galeristas e leiloeiros que contribuíram de alguma forma.
- O vídeo é para a Sandra ver e sentir um estímulo na recuperação. Ela acordou de um coma de três meses contra todos os prognósticos dos médicos, então queremos ajudar a pagar a fisioterapia, a fonoaudióloga... Nada é garantido, a não ser que nós, e quem for ao leilão, estaremos ajudando a renovar uma esperança.
O mundo da mulher aranha por Fabio Cypriano, Folha de S. Paulo
O mundo da mulher aranha
Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 4 de julho de 2011.
Maior exposição de Louise Bourgeois já realizada no Brasil, no Instituto Tomie Ohtake , revela como a psicanálise transformou a carreira da artista francesa
"Arte é uma forma de sanidade" está escrito em uma das 112 obras que compõem a mostra "Louise Bourgeois: o Retorno do Desejo Reprimido", a maior já dedicada à artista no país.
Por meio de desenhos, objetos, pinturas, esculturas e instalações, concebidas por Bourgeois (1911-2010), entre 1942 e 2009, o curador Philip Larratt-Smith traça um perfil da obra da artista em sua relação com a psicanálise.
A tese central da mostra é como "seu afastamento do mundo da arte e imersão na análise resultaram em um completo novo corpo de trabalhos, no início dos 1960", escreveu o curador à Folha.
A exposição, no Instituto Tomie Ohtake, será inaugurada na próxima quinta.
Três voos cargueiros trouxeram as obras da Argentina, onde a exposição começou.
As obras seguem depois para o Museu de Arte Moderna do Rio. Na capital argentina e no Rio, a mostra apresenta "Mamam", a imensa aranha que Bourgeois exibiu na Tate Modern (Londres), em 2000, mas que não coube na parada paulista.
Bourgeois é uma das artistas centrais no século 20, ao vincular sua biografia como inspiração para sua arte.
Em 1982, quando fez sua retrospectiva no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), ela divulgou uma espécie de manifesto intitulado "Abuso Infantil".
Ele revelava a relação de seu pai com sua tutora, enquanto sua mãe convalescia. O caso inspirou a instalação "A Destruição do Pai" (1974).
Larratt-Smith conviveu com Bourgeois nos últimos nove anos de sua vida, trabalhando como seu arquivista. O cerne da mostra são os escritos descobertos em dois momentos, 2004 e 2010, por Jerry Gorovoy, assistente de Bourgeois por muito tempo.
Os textos, realizados enquanto ela estava passando por sua mais intensa fase de análise, de 1952 a 1967, consistem em sonhos recordados, notas e relatos.
"Os escritos vão recalibrar radicalmente nossa compreensão da obra de Bourgeois e da importância da psicanálise como um campo de exploração para sua arte e vida", diz Larratt-Smith.
Uma seleção de fac-símiles dos textos originais será apresentada, e o segundo volume do catálogo reunirá 92 textos comentados.
Sendo que a própria artista indicou a importância de sua vida para a hermenêutica de sua obra, não há, para o curador, um problema em revelar diários tão íntimos.
Ele diz que os textos irão demonstrar que "sua real situação psicológica era muito mais complexa e suas atitudes para com seus pais mais ambivalentes".