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julho 11, 2017
Prefeitura do Rio decide não pagar o Programa de Fomento às Artes 2016 por Luiz Felipe Reis, O Globo
Prefeitura do Rio decide não pagar o Programa de Fomento às Artes 2016
Matéria de Luiz Felipe Reis originalmente publicada no jornal O Globo em 28 de junho de 2017.
Representantes do setor cultural foram informados por subsecretários de que o passivo de R$ 25 milhões não será quitado
RIO — A Prefeitura do Rio de Janeiro decidiu, na tarde desta quarta-feira, que não irá pagar os R$ 25 milhões devidos para os contemplados no Programa de Fomento às Artes de 2016, o conjunto de editais culturais lançados anualmente pela Secretaria muncipal de Cultura (SMC).
Representantes do setor cultural da cidade estiveram reunidos na tarde desta quarta-feira com subsecretários da pasta e foram informados de que a Prefeitura não irá quitar a pendência.
— Hoje, três subsecretários da pasta nos deram a resposta definitiva de que a Prefeitura não irá pagar o fomento, e de que não há previsão futura — disse o pesquisador e diretor teatral Gustavo Guenzburger, representante do Reage Artista e dos Movimentos pela Cultura. — O prefeito não se sensibilizou a fazer o remanejamento de recursos necessários. Há dinheiro para outras iniciativas, então o que não há é vontade política de resolver esse grave problema. Essa decisão representa um enorme retrocesso e aponta para o fim dos editais da Prefeitura. Precisamos conscientizar não só os artistas para essa luta. A cidade inteira tem que entender que fomentar a Cultura é fomentar o futuro.
Presente na reunião, o vereador Tarcísio Motta (Psol) lamentou a decisão em uma nota publicada em sua página oficial no Facebook: "Seis meses depois, Prefeitura consolida o calote. Lamentável decisão".
— A comunidade artística carioca está de luto — diz o produtor Eduardo Barata, que preside a Associação dos Produtores de Teatro do Rio, a APTR. — Foi enterrada a única política pública democrática, através de editais e com dinheiro do orçamento da Prefeitura, o Programa de Fomento à Cultura Carioca. Mesmo com a cláusula condicionante à disponibilidade para a liberação dos R$ 25 milhões, caracterizando a seleção como expectativa de direito do proponente, mesmo sabendo que a gestão passada era responsável pelo pagamento; havia e há uma obrigação ética, moral e de visão desenvolvimentista para o setor cultural.
Ao longo da tarde desta quarta-feira, a reportagem do GLOBO solicitou à assessoria de imprensa da SMC uma entrevista com a secretária e um comunicado sobre a decisão, porém foi informada que a secretária não comentaria o asssunto. Até o momento, a Prefeitura não enviou qualquer comunicado à imprensa sobre a decisão.
PROMESSA NÃO CUMPRIDA
Em janeiro deste ano, em seu primeiro ato público, realizado no Teatro Carlos Gomes, a secretária municipal de Cultura, Nilcemar Nogueira, respondeu com a seguinte declaração à plateia que lhe cobrava um posicionamento sobre o pagamento do Fomento:
— Conhecemos o nosso passivo e temos compromisso. Vamos chegar lá — disse.
O imbróglio teve início no fim do ano passado, quando o ex-prefeito Eduardo Paes e o então secretário municipal de Cultura, Junior Perim, não honraram o compromisso de pagar os R$ 25 milhões em prêmios que haviam sido garantidos publicamente, na cerimônia de lançamento do Programa, realizada em junho de 2016, no Palácio da Cidade. À época, Eduardo Paes afirmou que o pagamento do edital seria executado até o fim daquele ano, e que os projetos contemplados deveriam ser implementados entre 1º de janeiro e 31 de dezembro de 2017.
— Queria dizer que a Prefeitura do Rio se compromete a fazer esses pagamentos em novembro para que os projetos sejam executados em 2017 — disse Paes à época.
Ao fim de 2016, a gestão Paes anunciou que a receita do município havia sido menor que a expectativa, e que, por tal motivo, não teria verbas para repassar os R$ 25 milhões. No texto do edital o item 2.5 informava: "A liberação do valor destinado a este Processo Seletivo está condicionada à disponibilidade orçamentária e financeira". Representantes do setor cultural dizem que tal cláusula — presente em editais anteriores da SMC — abre brecha para manobras orçamentárias e não garantem, de modo definitivo, o pagamento dos prêmios anunciados.
Em fevereiro, em entrevista ao GLOBO, a secretária havia dito não ter como garantir quando os R$ 25 milhões do edital seriam pagos: "O valor será pago, mas não tenho como dizer quando". Na mesma entrevista, declarou que teria "R$ 15 milhões aprovados para o fomento em 2017" e que planejava usar esse montante em um novo edital relativo a 2017, em vez de usá-lo como parte de uma estratégia para quitar o anterior. Porém, tal intenção não foi bem recebida pelo setor, e o impasse em relação ao pagamento do Programa de Fomento permaneceu sem resolução até esta tarde.
Em relação aos R$ 15 milhões mencionados anteriormente pela scretária, o GLOBO apurou que 25% desse montante foram contingenciados.
Do restante, R$ 6 milhões já teriam sido utilizados para pagamento de despesas, e a Prefeitura planeja utilizar R$ 5 milhões para o lançamento de um conjunto de editais. Será o menor investimento da pasta dos últimos anos, em editais de apoio direto — em 2016 foram anunciados R$ 25 milhões (não pagos), enquanto em 2015 e em 2014 a SMC investiu R$ 29 milhões em seu conjunto de editais, R$ 31,5 milhões em 2013, R$ 34 milhões em 2012 e R$ 27 milhões em 2011.
Neste último edital, 2.480 projetos foram inscritos, e 204, contemplados. Em fevereiro passado, a atriz e produtora cultural Natasha Corbelino realizou um levantamento numérico que buscou identificar o impacto econômico gerado pelo não pagamento do edital de 2016.
— Com os 204 projetos pagos teríamos 6.300 contratos previstos, sendo 4.800 contratos diretos com trabalhadores da cultura, como artistas, técnicos, produtores, e 1.500 contratos de serviço, além dos números indiretos que geramos — diz. — Somos muitos e geramos renda. Movimentamos comércio, prestadores de serviço e mobilizamos o público e os bairros de toda a cidade.