|
julho 25, 2011
Pinacoteca ou museu de arte? por Ricardo Resende, O Povo
Pinacoteca ou museu de arte?
Artigo de Ricardo Resende originalmente publicado em especial para o caderno Vida e Arte do jornal O Povo em 24 de julho de 2011.
EX-DIRETOR DO MAC, do Centro Dragão do Mar, Ricardo Resende lança a questão para os gestores da cultura no Ceará: pinacoteca ou um museu de arte para o Ceará?
Esta seria a pergunta que eu faria se estivesse no lugar de quem deverá decidir sobre a criação de um museu para abrigar o acervo da Secretaria do Estado do Ceará hoje guardado na reserva técnica do Museu de Arte Contemporânea do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura. Acervo este composto essencialmente por pinturas e esculturas.
No limiar do século XXI, depois de todos os questionamentos que a própria arte se fez desde o século passado marcado por transformações de nossa concepção de arte e após duas exposições em Fortaleza que tratavam da arte efêmera, as mostras de Esculturas Efêmeras de 1986 e 1991, organizadas pelo artista Sérvulo Esmeraldo, não me parece possível imaginar que ainda possa prevalecer a concepção novecentista de museu, para uma cidade como Fortaleza.
Já o conceito de pinacoteca está mais ligado à arte do Século XIX, quando a pintura reinava sobre as outras linguagens artísticas. A escultura não tinha o mesmo status de arte que teve no século seguinte. A fotografia apenas despontava. Não existia o cinema, nem a vídeoarte e nem as performances. Um museu a ser criado em 2011 não deveria vir engessado nesta nomenclatura equivocada para a compreensão de arte na contemporaneidade.
A ideia de um Museu de Arte para o Ceará deveria ser mais abrangente, capaz de contemplar todas as linguagens artísticas e manifestações culturais. Não deveria se restringir a uma ideia ultrapassada e acadêmica da arte. Deveria apresentar mostras de artes plásticas ou em seu conceito expandido de artes visuais, abrigar, por exemplo, a arquitetura, o design, a moda, a arqueologia, a arte clássica, a arte grega, a pré-colombiana, a arte marajoara e assim por diante, sendo capaz de absorver todo o acervo da secretaria, sem, no entanto ofuscar a política de exposições do Museu de Arte Contemporânea do Centro Dragão do Mar.
Alguns dos museus que apresentam estas características são os Museu de Arte de São Paulo, o Museu Metropolitano de Nova York, as Galerias Nacionais de Washington, Londres e Berlim, como alguns dos mais expressivos exemplos.
A Pinacoteca do Estado de São Paulo talvez seja atualmente a melhor referência de museu no Brasil, particularmente por sua programação, capaz de contemplar o melhor da arte dos séculos passado e deste, exibindo desde as pinturas acadêmicas do século XIX até as artes moderna e contemporânea. Uma instituição secular que soube se renovar e ampliar o seu universo expositivo, nos seus mais de 100 anos.
De qualquer forma, seja qual for o nome a ser adotado, sempre será bem vinda a criação de mais uma instituição museológica. Que ele funcione adequadamente, dentro dos mais rigorosos critérios museológicos e com a menor inferência político-partidária.
Ricardo Resende é diretor do Centro Cultural São Paulo (CCSP), curador independente e mestre em História da Arte pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Entre 2005 e 2007, foi diretor do Museu de Arte Contemporânea (MAC) do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura.
Leia também:
Que Pinacoteca é essa? por Mariana Toniatti, O Povo
Para além do acervo por Mariana Toniatti, O Povo
Acervo escondido por Mariana Toniatti, O Povo
Desafios das artes por Mariana Toniatti, O Povo