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julho 9, 2009
A ascensão de um artista paulistano no Rio por Eduardo Fradkin, O Globo
Matéria de Eduardo Fradkin originalmente publicada no Segundo Caderno no jornal O Globo, em 8 de julho de 2009.
Depois de duas coletivas, Felipe Cohen estreia hoje uma individual na cidade e também cresce em São Paulo
Em 2008, quando abriu uma ampla galeria de arte na Gávea, Anita Schwartz inaugurou lá a série “Trajetórias em processo”, dedicada a promover exposições coletivas de cinco jovens artistas em ascensão, dos quais um é selecionado para uma individual no ano seguinte. O escolhido entre os cinco do ano passado foi Felipe Cohen, de 32 anos, que abre hoje sua exposição no segundo andar do prédio, enquanto o primeiro piso abriga uma nova edição de “Trajetórias”.
— Esse é um projeto que o curador Guilherme Bueno trouxe para a galeria. Queremos mostrar talentos novos, que tenham conceitos novos. Mas são artistas que já têm uma trajetória e uma linguagem estética consolidada. Não são iniciantes — diz a galerista.
De fato, o início de carreira de Cohen foi há dez anos, no Centro Cultural São Paulo, num programa que convida cinco artistas para uma coletiva feita de individuais simultâneas, em que cada um ganha uma sala. Este ano, ele participa do programa Rumos Itaú Cultural, que já passou por São Paulo, está em Curitiba e, depois, virá ao Rio.
Natural de São Paulo, o artista já expôs em outra coletiva no Rio, na galeria Box 4, mas agora ganha sua primeira individual na cidade.
— Acho que o mercado vem crescendo de um jeito profissionalizante. Você vê isso pela SP Arte, e pela participação das galerias brasileiras em feiras internacionais. Isso está ajudando a criar uma estrutura para o artista viver de seu trabalho. Era muito frequente o artista chegar aos 40 anos e ainda ter que trabalhar com outras coisas. Ainda é comum, mas hoje a chance de sobreviver do trabalho é maior pelo crescimento do mercado — opina ele, que já teve uma série de colagens formando paisagens, semelhante a uma que está em exposição na galeria Anita Schwartz, comprada pela Pinacoteca de São Paulo.
Embora tenha largado há quatro anos seu último emprego fixo, de pesquisador no banco de dados de uma associação de videoarte em São Paulo, Cohen ainda faz trabalhos como ilustrador freelancer:
— Já ilustrei livros infanto-juvenis, revistas, livros didáticos. Foi ilustrando um livro infanto-juvenil chamado “A infância de Zeus e outros mitos gregos”, há dois anos, que eu comecei a trabalhar com colagens. Então, o trabalho de ilustração acabou influenciando o outro, de arte.
As obras expostas no Rio custam entre R$5 mil e R$16 mil. Nada mau para quem hesitou em cursar Artes Plásticas.
— Fiquei em dúvida entre Arquitetura e Artes Plásticas, mas foi mais por medo de fazer Artes Plásticas do que por gosto pela Arquitetura. Fiz vestibular para ambas, mas entrei em Artes mesmo. Meus pais me apoiaram. Em São Paulo é muito comum o artista fazer arquitetura, pensando na segurança profissional, e, durante a faculdade, ver que dá para ser artista. Conheço muita gente que se formou em Arquitetura, mas foi trabalhar com Arte — conta.
A faculdade deu a Cohen a chance de ter contato com artistas experientes, que formavam o corpo docente, e embasamento teórico. Ele sabe o caminho que quer trilhar.
— A forma como a arte se fechou nela mesma é um problema. Às vezes, vai para um hermetismo estéril, deixa de ser uma resposta para o mundo e fica falando dela mesma. É a cobra comendo o próprio rabo. Não é à toa que muitas pessoas reclamam da arte contemporânea, de não conseguir entendê-la. O artista tem que tentar dar respostas à sua relação com o mundo — argumenta.
Instalação atualiza tema da anunciação com lâmpada
Admirador de Tunga, Waltércio Caldas, Giorgio Morandi e de arte pré-renascentista e renascentista, ele explica que uma obsessão em sua obra é atualizar questões simbólicas do passado em esculturas atuais. Um exemplo é a instalação “Anunciação”, que pode ser vista na Anita Schwartz.
— Ela remete às pinturas antigas com o tema da anunciação, mas o anjo é representado por uma lâmpada que desce do teto de um contêiner, e há uma taça de cristal que recebe a luz, como a Virgem. A luminosidade e o desenho da lâmpada, que se encaixa na taça, fazem com que se crie um objeto único. Parece que a lâmpada está escorrendo para o chão ou a taça está ascendendo — descreve Cohen, que compara as galerias a pequenos museus e especula que poderiam existir mais espaços dedicados à arte contemporânea, para trabalhos mais ousados e experimentais.