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setembro 26, 2008
Pedido de corte ameaça 28ª Bienal, por Fabio Cypriano, Folha de São Paulo
Pedido de corte ameaça 28ª Bienal
Matéria de Fabio Cypriano, originalmente publicada na Folha de São Paulo no dia 26 de setembro de 2008
Entre outros itens, presidente da fundação quer cortar performances já anunciadas, programa educativo e traduções
Para secretário-adjunto de Estado da Cultura, obter recursos seria difícil com "falta de credibilidade" de Manoel Pires da Costa
A "Bienal do Vazio", programada para ser aberta ao público em um mês, corre o risco de ficar ainda mais vazia. No último dia 11, o presidente da Fundação Bienal de São Paulo, Manoel Francisco Pires da Costa, pediu ao curador da mostra, Ivo Mesquita, que cortasse nada menos que 40% do orçamento do projeto, indicando inclusive quais áreas deveriam sofrer redução ou mesmo ser eliminadas, entre elas as performances de Fischerspooner e do coreógrafo Ivaldo Bertazzo.
Tal corte foi contestado num e-mail enviado por Mesquita a Pires da Costa, no dia 12, ao qual a Folha teve acesso. "Agora é chegada a hora da presidência comparecer e fazer a parte dela [...]. Não podemos abrir a Bienal com ela parecendo desfalcada e mirrada", disse o curador na longa correspondência, com nove itens.
"Ajustes e acertos são absolutamente normais nesse processo. Mais ainda em projetos do porte e complexidade de uma Bienal. [...] Praticamente metade do orçamento previsto para a realização da exposição (R$ 8 milhões) já foi captado", afirma Pires da Costa, em nota enviada à Folha, ontem, após ter recebido sete questões da reportagem. Ao invés de responder as questões pontualmente, o presidente mandou um texto genérico, deixando de abordar alguns pontos, como o que se referia à manutenção da gratuidade da mostra para o público mesmo frente aos problemas de captação.
Verbas públicas
Nas últimas três edições, a Bienal teve a maior parte de seus gastos custeados pelo governo federal, por meio de emendas da bancada paulista no Congresso ao Orçamento da União. Em 2002, por exemplo, para a 25ª Bienal, foram alocados cerca de R$ 11 milhões dessa forma. Na Bienal passada, a contribuição da União foi de cerca de R$ 8 milhões -para um orçamento divulgado de cerca de R$ 12 milhões, que ainda não foram repassados na íntegra, segundo Pires da Costa.
Agora, em 2008, a Bienal não conseguiu repasse por meio desse dispositivo, já que ele foi alocado para o Projeto Guri, da Secretária de Estado da Cultura. "Isso não foi uma retaliação contra a Bienal, talvez nosso projeto fosse mais bem feito", diz Ronaldo Bianchi, secretário-adjunto de Cultura do Estado de São Paulo. Contudo, no ano passado, Bianchi enviou correspondência aos conselheiros da Fundação Bienal na qual defendia a renúncia de Pires da Costa e, segundo ele, alertou o presidente que com a sua "falta de credibilidade seria difícil a captação de recursos para a 28ª Bienal".
No Ministério da Cultura, há três projetos inscritos para captação de recursos para a 28ª Bienal, por meio da Lei de Incentivo à Cultura: um arquivado, no valor de R$ 3,1 milhões; outro retirado de pauta, no valor de R$ 6 milhões, por "falta de documentos e para ajustes na planilha orçamentária"; e o terceiro aprovado para obter R$ 3,6 milhões, mas que, até ontem, segundo o site do ministério, não tinha conseguido nenhuma captação.
Cortes graves
Em seu email, Mesquita comenta sobre os cortes propostos em seis áreas: educativo, arquitetura, traduções, assessoria de imprensa, documentação fotográfica da mostra e as performances do coreógrafo Ivaldo Bertazzo, do grupo norte-americano Fischerspooner e da banda Los Super Elegantes.
"Cortar o educativo é grave. Esta é uma instituição pública e que presta um serviço para a comunidade", escreve Mesquita. Para o curador, "o corte do mesmo seria extremamente danoso para a imagem institucional da fundação porque existem recursos alocados para a Bienal que contemplam especificamente o seu plano educativo e [...] eles até já foram usados sobre essa rubrica".
Outro trecho relevante da correspondência aborda o corte proposto para as traduções no site, no jornal e na tradução simultânea das conferências. "Eles [...] mostrariam que a Fundação Bienal de São Paulo, mesmo depois de 58 anos de existência, ainda não se tornou internacional e bilíngüe", afirma o curador.
Mesquita lembra a Pires da Costa que quando o empresário precisou da "competência e confiabilidade" do curador, ele esteve presente e ajudando a recuperar a imagem da Bienal. Diz também que já há compromissos firmados, entre outros, com os patronos da Tate Gallery, de Londres, e do Museu de Arte Moderna de San Francisco para que compareçam ao evento.