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dezembro 7, 2006
Coletivos ganham vulto nos anos 2000, por Juliana Monachesi
Coletivos ganham vulto nos anos 2000
Matéria de Juliana Monachesi, originalmente publicada na Folha de São Paulo, no dia 6 de dezembro de 2006
Ondas de "artivismo" surgem no Brasil nos últimos anos da década de 90 e início dos anos 2000, em sintonia com os movimentos antiglobalização e as tensões culturais e políticas à flor da pele vivenciadas em Seattle (1999), Gênova (2001) e Davos (2003). O papel dessa nova geração, que prefere as ruas ao espaço institucional e que privilegia as ações da troca direta com o público em lugar de obras no museu, é recriar a politização na arte.
O coletivismo brasileiro de início dos anos 2000 tinha um ar quixotesco como nas ações do grupo Laranjas, de Porto Alegre, cujas ações consistiam em distribuir gratuitamente suco de laranja aos pedestres em ruas movimentadas da capital gaúcha, instalar longas faixas de lambe-lambe cor de laranja (sem quaisquer frases de mobilização) em túneis da cidade ou, como fizeram em uma intervenção em 2003, bater de porta em porta (todos devidamente uniformizados com macacão laranja) e oferecer aos moradores de Porto Alegre o "Minuto Laranja", vídeo de um minuto de duração em que o monitor de TV era preenchido pela cor. O grupo registrava a visita às casas daqueles que os convidavam a entrar e a reação das pessoas.
Os artistas gaúchos Cristina Ribas, Cristiano Lenhardt, Fabiana Rossarola, Jorge Menna Barreto e Patrícia Francisco, integrantes do grupo, hoje espalhados pelo Brasil, continuam atuando como coletivo em certas ocasiões, como em recente exposição na Fundação Joaquim Nabuco, em Recife, quando montaram um QG na galeria disponibilizada para sua exposição, que funcionou como pólo irradiador de suas intervenções nas ruas do Recife.
Peça-chave
Uma figura central na articulação dos coletivos brasileiros foi a artista Graziela Kunsch, que manteve entre 2001 e 2003 o Centro de ContraCultura de São Paulo, espaço dedicado a residências artísticas -sua própria casa, na Vila Mariana-, por onde passaram grupos como Urucum, de Macapá; Transição Listrada, de Fortaleza; EmpreZa, de Goiânia; GRUPO, de Belo Horizonte; TelephoneColorido, de Recife, além do próprio Laranjas.
Vários dos coletivos dessa época se desfizeram ou se reagruparam em novos -é da natureza desses grupos ter um tempo limitado de vida uma vez que, conforme ensina Hakim Bey em "TAZ - Zona Autônoma Temporária", uma das balizas teóricas dos coletivos, a potência transformadora, cristaliza-se, torna-se poder.
O que havia de romântico nas ações de início de 2000 ganhou tom mais explicitamente político a partir de iniciativas como a ocupação artística em dezembro de 2003 em edifício na av. Prestes Maia, ocupado pelo Movimento dos Sem-Teto do Centro.
Sintomático desta "virada" é a atuação de Graziela Kunsch em anos recentes: engajada no CMI (Centro de Mídia Independente), a artista defende o uso da bicicleta contra a poluição em São Paulo, organiza manifestações em "comemoração" do aniversário da Rede Globo e atua em jornais como "O Independente", de Florianópolis.