|
março 18, 2013
Prefácio do Catálogo Cantos Cuentos Colombianos por Hans-Michael Herzog e Ruth Schmidheiny
Texto de Hans-Michael Herzog e Ruth Schmidheiny originalmente publicado no catálogo Cantos Cuentos Colombianos.
Cantos Cuentos Colombianos, Casa Daros, Rio de Janeiro, RJ - 24/03/2013 a 08/09/2013
Após anos de intensa procura por um local adequado para o nosso espaço cultural e anos mais de um meticuloso trabalho de restauração e reforma, finalmente estamos prontos: a Casa Daros, no Rio de Janeiro, abre suas portas ao público.
Quando, bem no início do novo milênio, começamos a desenvolver uma coleção de arte latino-americana contemporânea, quase ninguém fora da América Latina sabia do seu poderoso potencial intrínseco. A visão estrangeira que se tinha da arte latino-americana era prejudicada pela ignorância e pela arrogância.
Queríamos rebater essa percepção. Já em 2002 começamos a apresentar a coleção em Zurique em exposições minuciosamente planejadas com esse intuito, acompanhadas de publicações cuidadosamente elaboradas.
La Mirada – Looking at Photography in Latin America Today foi a primeira de uma série de mostras realizadas no nosso museu, situado na antiga cervejaria Löwenbräu, em Zurique. Entre muitas outras exposições, apresentamos as instalações de luz cinética dos anos 1960, feitas por Julio Le Parc (Le Parc Lumière, 2005), uma justaposição de trabalhos da América Latina, com outros da Europa e dos Estados Unidos (Face to Face, 2007/08), uma ampla exibição de vídeos (For You, 2009) e, finalmente, mostras individuais dos trabalhos de Antonio Dias (2009) e Luis Camnitzer (2010).
Nosso objetivo foi sempre o de chamar atenção para a incrível variedade da arte latino-americana. Cada projeto representava uma estreia europeia, permitindo que o público se familiarizasse com artistas e questões até então desconhecidos.
O propósito das exposições era apresentar as facetas mais variadas da produção artística latino-americana, enfatizando sua relevância internacional e fixando-a, definitivamente, no contexto da arte dos séculos XX e XXI. Para tal, a obra de arte não era encarada como representante de um projeto específico de curadoria, mas sim como o ponto de partida para uma análise sofisticada de forma e conteúdo, e para uma interpretação de suas inúmeras camadas de sentido.
O fio condutor de todas as nossas atividades foi a coleção, sediada em Zurique, que no momento consiste em 1.160 obras feitas por 117 artistas. É uma das mais completas coleções desse tipo, assim como nossa biblioteca de cerca de 7 mil volumes, que foi construída paralelamente à coleção e está aberta ao público interessado na nossa sede administrativa, em Zurique.
Embora tenhamos planejado a coleção de forma sistemática, não buscamos uma completude enciclopédica. Para nós é importante que ela seja composta por obras que não representem simplesmente a arte pela arte, mas que possam ser vistas em vários níveis; obras que não tenham somente relevância estética, mas também social; obras que sejam singulares em vários contextos diferentes e que conjuguem meio e conteúdo de uma forma significativa. Graças a nossa autonomia, o trabalho de reunir a coleção prescinde de preocupações políticas ou mercadológicas.
Mas o que seria dessa coleção sem os nossos artistas? São eles o foco do nosso interesse.
Junto com eles, buscamos desenvolver e nutrir uma relação de confiança caracterizada pelo respeito mútuo. Entendemos que o diálogo franco e a troca permanente de ideias, assim como o conhecimento e a informação, são a base para uma relação de apoio e promoção recíproca e duradoura.
Quando começamos a organizar nossa coleção, decidimos procurar um local na América Latina onde pudéssemos ampliar e divulgar nossas atividades.
Ao fechar o nosso espaço de exposição em Zurique, em 2010, transferimos o foco das atividades públicas para a nossa Casa Daros, no Rio. Desejamos dar continuidade aqui ao princípio – testado ao longo dos anos – de organizar grandes exposições de arte latino-americana, além de várias novas atividades. A Casa Daros será uma casa aberta, uma plataforma para as artes e para a cultura que naturalmente será, também, receptiva a questões sociais e políticas.
Damos enorme importância à educação: junto com os artistas e o nosso público, queremos aprender e entender, por meio de um encontro com as próprias obras de arte, o que significa o ato de criação.
A Casa Daros se imagina como um eixo unindo o Rio de Janeiro, o Brasil, a América Latina e o resto do mundo. Como um ponto de encontro que aproxima vários protagonistas por meio da arte, que abre e expande os horizontes através de suas redes de informação e que desafia pensamentos e opiniões arraigados. A parte inovadora é a ideia de prover um serviço que finalmente una artistas da América Latina na América Latina, e assim compense a “fuga” centrífuga de latino-americanos (para a Europa e a América do Norte) com um movimento centrípeto.
Pretendemos lançar um campo gravitacional permanente e consistente para além das ingerências políticas e sociais, onde se deem impactos duradouros e embates produtivos entre o Brasil, os outros países da América Latina e o mundo todo.
Gostaríamos de expressar nossa imensa gratidão aos nossos leais companheiros, alguns dos quais têm estado conosco há muitos anos.
A Casa Daros não teria sido possível sem vocês e seu envolvimento! Resta-nos esperar que não desapontemos a confiança depositada em nós.