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novembro 25, 2019
Fabio Szwarcwald é exonerado da direção da Escola de Artes Visuais do Parque Lage por Jan Niklas e Nelson Gobbi, O Globo
Fabio Szwarcwald é exonerado da direção da Escola de Artes Visuais do Parque Lage
Matéria de Jan Niklas e Nelson Gobbi originalmente publicada no jornal O Globo em 21 de novembro de 2019.
Diretor diz que recebeu com surpresa decisão; Associação de Amigos da EAV vai definir se mantém parceria com o Estado
RIO — O diretor da Escola de Artes Visuais (EAV) do Parque Lage, Fabio Szwarcwald, foi exonerado do cargo nesta quinta-feira. Ele estava suspenso de forma preventiva desde o fim de outubro, para que fossem apuradas supostas irregularidades em sua gestão . A decisão foi publicada no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro .
O agora ex-diretor da EAV diz ter recebido com surpresa a notícia da exoneração. Ele foi notificado na segunda-feira por uma funcionária do RH da secretaria de Cultura e Economia Criativa do estado do Rio (Secec) e não ouviu qualquer explicação sobre a decisão por parte da pasta.
— Não vou recorrer. Eu não trabalho mais com esse secretário de Cultura (Ruan Lira) — afirmou Szwarcwald — Quando fui afastado, eu me reuni com ele e apresentamos todas as explicações sobre as denúncias. Mesmo assim ele tomou essa decisão sem motivo nenhum, de forma esdrúxula.
O afastamento havia sido decretado pelo secretário, Ruan Lira, após o Tribunal de Contas do Estado (TCE) encaminhar à pasta cinco denúncias anônimas feitas contra a gestão de Szwarcwald.
O ex-diretor disse que todas as questões levantadas pelo TCE eram relacionadas à Ameav (Associação de Amigos da EAV), responsável pela gestão do espaço. Ele deveria responder apenas pela alegação de duplicidade no ressarcimento de uma nota de passagem aérea, que ele teria se prontificado a devolver quando soube do equívoco.
Em nota, a Secec diz que concluiu que “não houve má-fé por parte do servidor”, e pediu a devolução da verba recebida em duplicidade. O texto, no entanto, informa que Lira decidiu pela exoneração por entender que a por sua exoneração por entender “que a relação de parceria e comunicação entre o servidor e a Secec tornou-se irremediável e sem sintonia, no momento em que a direção da EAV do Parque Lage é um cargo de confiança”. No comunicado, a Secretaria indica que “as atividades atuais do Parque Lage e da Escola de Artes Visuais serão mantidas” e que “não há, por hora, a necessidade de nomeação de um novo diretor”.
Projeto prejudicado
Szwarcwald afirmou que seus advogados não tiveram acesso aos autos do processo, mesmo entrando com vários pedidos.
— Nem na época da ditadura aconteceu isso — acusa o ex-diretor.
Entre as possíveis irregularidades que deveriam ser apuradas estavam a falta de licitação para renovação do contrato do bistrô que atende o local; o pagamento de vale-transporte e tíquete-refeição a funcionários do estado que estavam com salários atrasados; e empréstimo a um funcionário, que também estava com salário atrasado.
Ele afirmou ainda que o projeto para reformar o palacete, que estava tocando, agora será paralisado. Szwarcwald disse que já havia avançado em negociações para conseguir recursos via Lei Rouanet e com o Iphan para as obras que se iniciariam no ano que vem, quando a escola completará cem anos.
— Vários patrocinadores já me ligaram dizendo que não vão renovar com a escola após essa decisão acontecer dessa forma — afirmou.
Há duas semanas, artistas fizeram um manifesto a favor da gestão da Ameav e pela permanência do diretor da escola. Um dos signatários do abaixo-assinado, Vik Muniz diz que a preocupação vai além da defesa de uma determinada gestão ou do que a classe deseja para o espaço.
— É um absurdo que a exoneração seja decidida sem qualquer indício de irregularidade, só por motivação política e ideológica. Na época da montagem da "Queermuseu", disse ao Fábio que tinha medo da repercussão, porque grupos políticos conservadores sempre tentam usar a polêmica contra o que condenam — comenta Vik, sobre a coletiva censurada em 2017 no Sul e remontada na EAV no ano passado. — Somente quando for divulgado o nome do novo diretor é que vamos saber as verdadeiras intenções por trás desta exoneração.
A Ameav, que até o momento não se manifestou sobre a exoneração de Szwarcwald, terá uma reunião hoje para decidir se mantém ou rescinde o contrato firmado com a Secretaria, durante a gestão anterior, na qual a Associação assumiria toda a folha de pagamento, ficando o Estado responsável apenas pelas despesas com limpeza, jardinagem e segunrança. Um dos imbróglios envolvendo o contrato é o destino do R$ 1,2 milhão que a escola tem em caixa hoje, proveniente de doações e campanhas realizadas recentemente. Em caso de rescisão de contrato, este valor iria para a Secretaria.
Outra questão é o destino dos funcionários e professores, já que todos são contratados pela Ameav, sem vínculo com o Estado. Há a preocupação por parte do corpo docente que todos possam ser dispensados com as mudanças na instituição.
— Desde que foi criada Rubens Gerchman, há 45 anos, a escola mantém essa dinâmica, em que os professores são pagos proporcionalmente pelo número de mensalidades dos seus cursos. Só assim a EAV consegue ter artistas, críticos e curadores atuantres no mercado como professores — observa Suzana Queiroga, que dá aulas na EAV desde 1985. — Tudo aconteceu sem nenhum comunicado aos professores, da mesma forma que não conseguimos nos reunir com ninguém da Secretaria. O que está acontecendo agora vai além da administração do Fábio, o modelo de ensino consagrado pela EAV pode ruir.
A partir do afastamento do ex-diretor, uma equipe da Secretaria vem acompanhando todo o trabalho da área administrativa da EAV em tempo integral. Uma fonte da escola, que não quis se identificar, disse que o clima é de "intervenção e caça às bruxas" e que os funcionários estariam "constrangidos e com medo".
Szwarcwald estava à frente da EAV desde março de 2017. Em julho de 2018, ele chegou a ser exonerado pelo então secretário estadual de Cultura, Leandro Monteiro, que apontou como motivação discordâncias administrativas e seu perfil alinhado mais à iniciativa privada do que à gestão de equipamentos públicos. Monteiro, no entanto, voltou atrás no dia seguinte.
Leia a nota da Secec na íntegra:
O servidor Fábio Szwarcwald, afastado até então da direção do Parque Lage, foi exonerado após conclusão da comissão do processo administrativo, onde foi constatado que não houve má-fé por parte do servidor, mas a decisão conclui pela devolução à SECEC da verba recebida em duplicidade.
Com sua exoneração, e conclusão da comissão, seu processo é finalizado. Também, os demais objetos de verificação da apuração se dão por finalizados, já que um novo processo se encontra em andamento sobre as prestações de contas da AMEAV — atual parceira da EAV.
O Secretário de Estado de Cultura e Economia, Ruan Lira, decidiu por sua exoneração por entender que a relação de parceria e comunicação entre o servidor e a SECEC tornou-se irremediável e sem sintonia, no momento em que a direção da EAV do Parque Lage é um cargo de confiança.
As atividades atuais do Parque Lage e da Escola de Artes Visuais serão mantidas. Desde o afastamento, uma equipe robusta da Secretaria está à frente da gestão do Parque Lage e não há, por ora, a necessidade de nomeação de um novo diretor.
Ruan deseja sorte e faz questão de agradecer pelo ótimo trabalho desempenhado por Fábio ao longo desse tempo à frente do equipamento.