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julho 25, 2011
Desafios das artes por Mariana Toniatti, O Povo
Desafios das artes
Matéria de Mariana Toniatti originalmente publicada no caderno Vida e Arte do jornal O Povo em 24 de julho de 2011.
No dicionário, pinacoteca quer dizer coleção de quadros de pintura ou museu de pintura. No século XIX, quando as pinacotecas se consolidaram, a pintura era mesmo a expressão artística por excelência, e as outras formas artísticas eram bem definidas: desenho, escultura. Hoje, no século XXI, a arte tem inúmeras linguagens e possibilidades e o conceito de pinacoteca tem que acompanhar essa transformação.
“A pinacoteca que se projeta no século XX mantém o nome e o vínculo com o mundo da pintura, mas têm um desafio, dialogar com a produção artística contemporânea que não se expressa exclusivamente pelo campo da pintura e rompe com segmentações. Nisso que chamamos artes visuais, temos instalações, performances, combinação de imagens em movimento, produção sonora, um conjunto de possibilidades expressivas”, explica Mário Chagas, diretor do Departamento de Processos Museais do Instituto Brasileiro de Museus.
O melhor exemplo disso é a Pinacoteca de São Paulo, fundada em 1905, hoje um dos melhores museus do país, entre outras coisas, por conseguir reunir um acervo importante dos séculos passados e de arte contemporânea. Nesse momento, a Pinacoteca exibe uma mostra do trabalho do cearense Sérvulo Esmeraldo com 117 trabalhos, entre esculturas, pinturas, gravuras, desenhos e objetos.
Mesmo levando em conta que a função extrapola o sentido original da palavra, Mário Chagas vê mais sentido em batizar de museus os novos equipamentos. “O museu pressupõe uma complexidade, muito mais polifônico. No meu entendimento comunica de modo mais intenso e direto com o mundo contemporâneo”, diz.
Além de espaço de exposição, a pinacoteca tem outro papel fundamental: montar e preservar um acervo significativo e amplo de obras de arte. A missão de guardar e zelar pela memória artística. A chamada reserva técnica, onde essas peças que não estão em exibição são guardadas, exige investimentos. O local tem que ser climatizado, protegido de umidade e ter os equipamentos certos para acomodar as obras como mapotecas, um móvel que tem gavetas grandes para telas, e traineis, uma espécie de suporte para guardar peças penduradas.
No Ceará, o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, que guarda o acervo estadual de três mil peças, é o único equipamento com reserva técnica adequada. Na Vila das Artes, as obras só estão embaladas. O desafio não é só montar o espaço físico da reserva técnica. Compor um acervo significativo também é problemático. No Ceará, a doação dos próprios artistas ainda é o caminho mais frequente de aquisição de novas peças. As últimas obras que entraram para o acervo municipal foram três telas de Descartes Gadelha doadas pelo próprio artista.
“Há uma lacuna de investimento do poder público na aquisição de acervo. Não se tem uma compreensão de que disso depende a continuidade dos processos criativos para as gerações futuras. Onde os jovens vão poder conhecer obras dos próprios artistas brasileiros contemporâneos se os governos não estão adquirindo peças novas? Para onde as obras estão indo?”, preocupa-se Mário. Os acervos do século XIX e XX são mais expressivos, chegam a cobrir o Modernismo. Mas depois das décadas de 60 e 70 do século passado, Mário vê grandes lacunas.
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