|
maio 27, 2011
A cultura como palco de carreira política por Lucas Bambozzi
A cultura como palco de carreira política
Leia também as matérias e respostas que compõem o Dossiê MIS e Paço das Artes: A morte anunciada de um modelo de gestão.
Me permito dar uma palavra sobre as questões que envolvem o MIS porque acompanho os caminhos do Museu com uma atenção bem especial. Vim morar em São Paulo em função de um convite do Amir Labaki (com Ricardo Ohtake na Secretaria de Cultura) para coordenar o departamento de vídeo do MIS. Foi uma empatia imediata, com todos que ali trabalhavam, e também pelo que o Museu era e poderia vir a ser – uma perspectiva particularmente fascinante. Era uma de suas melhores fases, entre 93 e 95, tudo fervilhando, muitas possibilidades e acontecimentos em todas as áreas, mas música, cinema, vídeo, design e fotografia, os departamentos existentes, ainda eram coisas mais ou menos separadas. As confluências se intensificaram nos anos seguintes, deixando perdidos muitos que se julgavam donos e detentores de uma linguagem estanque.
Esse incômodo, de que os meios se transformam, de que as linguagens se cruzam e o que era absoluto deixa de ser, era sentido na programação, nos debates, nos corredores e nas reuniões de coordenação – instigados pela necessidade de intersecção e reflexão que as mudanças instigavam. O Museu ficava cheio constantemente, mas tenho a sensação de que isso acontecia não apenas pela programação, mas em especial por conta das reuniões semanais da ABD e pelo bar e restaurante, que sendo único na região, reunia e fazia permanecer muita gente ali, não apenas por conta das mostras e exposições, mas muitas vezes concorrendo com ela. Ou seja o público que realmente se adentrava nas salas não era exatamente maior do que o de hoje, quando havia menos engarrafamento na Av Europa e há muito mais ofertas de fruição de imagem e som, dentro de casa, diante das telas que se multiplicam e relativizam a hegemonia do cinema. Não haviam oficinas, não havia estrutura de produção, não haviam possibilidades de trabalhos laboratoriais, não havia um público tão diversificado (e diferenciado – sic) como há hoje.
É lamentável que esse pensamento de que cultura e arte se faz apenas com números, vem exatamente de onde não deveria vir. Enquanto as empresas privadas, parecem disfarçar a ganância e cada vez mais aceitam fazer menos marketing e investir em situações processuais, laboratoriais e de pesquisa, o Estado deixa de dar bom exemplo e transforma em mercado o que deveria ser estimulado por vias de apoio e fomento. Não são filas que medem a qualidade de um serviço, bem como não é a quantidade de views de uma ‘videocassetada’ na rede que o torna um bom trabalho artístico. Quem se envolve com produção cultural sabe o quanto é difícil fazer as pessoas enfrentarem todo tipo de dificuldade para atenderem a seus eventos, e que isso depende de outras estratégias, para além da qualidade da programação.
Se aprofundamos um pouco essas questões, vemos que o debate que existe em torno do MIS hoje deveria deixar de lado o tom personalista e de favorecimento de um ou outro nome, a favor de uma política de atuação, em consonância com uma atualização de suas vocações. Esse sim me parece um posicionamento político mais essencial.
É inegável o sinal de retrocesso na gestão cultural do governo (para além dos anacronismos do Minc) algo que vem sendo gerado em São Paulo como um dos piores exemplos de como se faz cultura. Já vi isso acontecer de perto outros desmandos, como por exemplo a ação da Secretaria de Cultura (Claudia Costim) que acabou com todo o acervo digital da Casa das Rosas, eliminando da história o que foi produzido na Internet (em atividades pioneiras, no mundo) quando o Aguilar foi diretor. Uma outra história, claro, mas conectada a um pensamento igualmente torto. Os argumentos de intervenção e mudança conceitual da vocação do MIS por parte dos senhores da Cultura são mesmo falhos e fracos. Apenas nos afirmam que pouco se interessam por cultura (nem cabe falar de arte) e a fazem apenas como palco para suas carreiras políticas, igualmente anacrônicas, interesseiras, toscas e feias.
Canal Contemporâneo recomenda:
Leia e participe do abaixo-assinado SOS MIS - Contra a intervenção do Governo do Estado de São Paulo no Museu da Imagem e do Som - MIS-SP no Petição Pública.
Penso que as instituições precisam se renovar sempre. E uma forma disso acontecer é promovendo links e conexões, seja em ações, projetos ou diálogos que explicitem a expansão crescente dos próprios limites da arte, em debate, mas que seja de fato público, desafiador em termos de uma abertura inédita. Não apenas no caso do MIS, caberiam formatos que pudessem sugerir à "governança" novos modelos de decisão. Como tem sido comentado em algumas listas, é necessário abrir a “caixa institucional” para a sociedade civil, de forma pública e com a devida seriedade. Falemos de discussão abertas, envolvendo a participação dos interessados, em processos verdadeiramente compartilhados, em convites estendidos aos vários segmentos da arte (sim, há nichos, infelizmente), evitando o lado obscuro das decisões que nos afetam. O MIS não é apenas uma comunidade ou um segmento, deve ter um compromisso com a sociedade de forma mais ampla.
Posted by: Lucas at maio 30, 2011 1:12 AM