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maio 6, 2010
Mostra reúne trabalhos de artistas da galeria Gentil Carioca por Walter Sebastião, Estado de Minas
Matéria de Walter Sebastião originalmente publicada no jornal Estado de Minas em 22 de abril de 2010.
Arte contemporânea, mostrando o melhor da produção atual. A capacidade de revirar o cotidiano e encontrar, em paisagem dilacerante, alguma poesia. Assim é a mostra Uma gentil invenção, que será aberta amanhã, na galeria Arlinda Correia Lima do Palácio das Artes. Dezenove artistas cariocas trazem um jeito diferente de fazer arte, com produção que provoca o espectador, marcada pela urbanidade delirante e pela irreverência. Essa opção, não poucas vezes, valeu polêmicas e problemas aos autores. Cultivado desde a metade dos anos 1980, esse caminho está presente na exposição por meio de João Modé e Ricardo Basbaum, nomes históricos dessa prática.
O evento é mais que mera exposição. Traz a Belo Horizonte o trabalho da galeria Gentil Carioca, dirigida por artistas que decidiram enfrentar todos os problemas que afligem a cena das artes visuais – da falta de espaço à venda de obras. Somando programação regular, incentivo a novos nomes e programas educativos, o espaço ganhou respeito internacional. A importante revista nova-iorquina Flash Art pôs a Gentil Carioca entre os 100 espaços mais interessantes da arte contemporânea mundial.
Palestra
“É uma galeria diferente”, avisa a artista plástica Laura Lima. Ela vai fazer palestra com Márcio Botner, outro fundador da Gentil, amanhã, às 14h, no Cine Humberto Mauro. Desde 2003, o espaço funciona num sobrado do início do século 20, no Centro do Rio de Janeiro. Lá ficava o ateliê de Márcio Botner. Os bate-papos com o amigo dos tempos de cursos no Parque Lage trouxeram a ideia de transformar o ateliê em galeria. Márcio ouviu a proposta com curiosidade e, um mês mais tarde, topou, chamando Laura para sócia. A dupla convidou o artista plástico Ernesto Neto para a empreitada.
“Quem manda na Gentil são os artistas. Criar a galeria foi um gesto político numa época em que havia muita gente produzindo sem ter onde mostrar. Faltavam bolsas, projetos e investimento em arte”, explica Laura. “A gente gosta de arte. Então, batalhamos para apresentar os artistas, sejam ou não representados por nós”, observa.
Uma gentil invenção é o retrato do momento que a galeria vive. “O ideal é que se veja a mostra e se pesquise o que têm feito artistas”, recomenda ela. O evento surgiu do desejo do Sesc de promover mostra itinerante e foi transformado pela equipe da Gentil Carioca em experiência de formação de acervo público. O Sesc, inclusive, comprou as obras e viabilizou uma espécie de museu itinerante.
Projetos
Laura Lima conta que, aberta a galeria, chegaram-lhe dezenas de portfólios “de um monte de gente maravilhosa sem ter onde expor”. Criou-se então a mostra anual Abre-alas, dedicada aos novos. Uma exposição para crianças trouxe a certeza de que educação e convivência com a arte são questões importantes para a formação de público. A cada mostra, a Gentil Carioca passou a chamar artistas para conversar, além de bolar camiseta, sempre com a palavra educação, vendida a preço de custo. Atualmente, elas já são 20.
A equipe convenceu colecionadores a patrocinarem a Parede Gentil, na face externa do espaço, defendendo a ideia de que colecionar é construir pensamento, não apenas ter um objeto. “Fazemos o que uma boa galeria deve fazer: possibilitar que o artista e suas obras estejam no maior número de eventos possível. Galeria é só sede onde se tem informação sobre o artista”, defende Laura.
Há dramas nessa missão, concorda ela. “Não é fácil vender arte. O número de colecionadores está crescendo, mas eles ainda são poucos”, conta. Há solução para o problema? “Mostrar que coleção pode ter vários perfis”, responde ela. O acervo particular pode ser pequeno, grande, ter um tema ou ser dedicado a uma linguagem, por exemplo.
Atualmente, a Gentil Carioca representa cerca de 20 artistas, selecionados observando-se o respeito ao realizado e a afinidade dos proprietários com o que eles apresentam. “Não são só amigos. Se fosse assim, seriam duas mil pessoas”, brinca Laura. “Artista tem de sair do casulo, trabalhar melhor seu romantismo e cair no mundo”, conclui ela.
UMA GENTIL INVENÇÃO
Trabalhos de Alexandre Vogler, Carlos Contento, Ducha, Ernesto Neto, Jarbas Lopes, João Modé, Laura Lima, Márcio Botner & Pedro Agilson, Maria Nepomuceno, Marinho, Marssars, Paulo Nenflídio, Pedro Varela, Renata Lucas, Ricardo Bausbaum, Simone Michelin e Thiago Rocha Pitta. Galeria Arlinda Correia Lima do Palácio das Artes, Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro, (31) 3236-7400. Abertura sexta-feira, às 19h. O espaço funciona de terça-feira a sábado, das 9h30 às 21h, e aos domingos, das 16h às 21h. Até 30 de maio.