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fevereiro 25, 2010
Arquitetos criticam projeto do Masp Vivo por Silas Martí, Folha de S. Paulo
Matéria de Silas Martí originalmente publicada na Ilustrada da Folha de S. Paulo em 25 de fevereiro de 2010.
Críticos veem "fisionomia empresarial" em reforma que elimina fachada original
Após veto de projeto original, com megatorre, desenho é adaptado, tem aprovação nas esferas estadual e municipal e passa por crivo da Lei Rouanet
Não é certo ainda que o Masp Vivo terá essa casca de vidro como prevê o projeto aprovado e obtido pela Folha. No estágio inicial das obras, também fica difícil saber como será a cara final do anexo do museu, mas os croquis da reforma, com a extensão de pé-direito triplo no topo da laje original, já despertam críticas dos arquitetos.
Feito por Julio Neves, arquiteto que ficou 14 anos no comando do Masp, o projeto foi adaptado e conseguiu a aprovação dos órgãos de preservação do patrimônio histórico nas esferas estadual e municipal.
Embora não seja tombado, o Dumont-Adams precisa de aval público para passar por reformas porque fica no entorno de um bem protegido, no caso, o edifício modernista desenhado por Lina Bo Bardi nos anos 60.
Na tentativa de evitar a descaracterização da região, o projeto inicial, com a torre gigantesca, foi vetado pelo município e um novo desenho só foi aprovado em 2007. Mas arquitetos ouvidos pela Folha não veem melhoras na versão que começa a sair do papel agora.
"É uma pena que o Masp, que já teve duas sedes vanguardistas projetadas por Lina Bo Bardi, tenha de se contentar com essa arquitetura de fisionomia empresarial", diz Renato Anelli, conselheiro do Instituto Bardi, que cuida do espólio da arquiteta. "Vai na contramão do que ocorre com projetos de museu do mundo todo."
Gesto desesperado
Embora não veja como "má ideia" a construção de uma torre com mirante ao lado do museu, o crítico de arquitetura Guilherme Wisnik vê problemas nos motivos por trás da obra, que considera um "gesto desesperado de "salvar" um museu que ficou decadente, enfatizando seu lado comercial".
"É evidente que o museu se depauperou, se descaracterizou e perdeu prestígio e representatividade", diz Wisnik. "Quer dizer então que uma obra como essa não viria no sentido de coroar um processo de crescimento do museu, como nos casos do Louvre, MoMA, da Tate e do Reina Sofía."
Críticos também apontam a contradição da reforma numa cidade como São Paulo, afeita à construção de neoclássicos. Exemplo desse estilo arquitetônico, o Dumont-Adams, em vez de preservado será recoberto por uma capa de "arquitetura corporativista", nas palavras do arquiteto Paulus Magnus.
Ponto central da discórdia, essa fachada de vidro, que deve custar R$ 3,5 milhões, mas que também pode ser substituída por uma versão mais modesta, levanta outra polêmica.
Na opinião do arquiteto Álvaro Puntoni, professor da FAU-USP, o anexo em forma de torre envidraçada arrisca ofuscar o prédio horizontal de Lina Bo Bardi. "Acho que o edifício atual deveria ser preservado", diz Puntoni. "O receio é que parece que o anexo compete com o Masp, em vez de construir uma relação serena."
Mas como tudo pode na Paulista, uma avenida longe da harmonia almejada por arquitetos, há quem prefira não criticar. "É antiético dizer que o projeto é ruim", diz o arquiteto Carlos Lemos. "Se tudo fosse térreo, seria questionável, mas não é. A Paulista tem dessas coisas."