|
julho 9, 2009
Artistas interpretam o espaço íntimo do devaneio e do aprisionamento por Mauro Ventura, O Globo
Matéria de Mauro Ventura originalmente publicada no Segundo Caderno no jornal O Globo, em 6 de julho de 2009.
Exposição na Laura Marsiaj mostra diferentes visões sobre o tema alcova
“Você vai ficar na saudade, minha senhora”, de Walmor Corrêa
“Timidus”, de José Rufino: a cama pela perspectiva do artista
Laura Marsiaj convidou o curador Marcelo Campos para ocupar o anexo de sua galeria, em Ipanema. Ele olhou o minúsculo espaço, de cerca de seis metros quadrados, e pensou:
— Isso aqui é uma alcova. O que fazer para potencializar um lugar tão pequeno?
A partir daí, surgiu o projeto de montar uma exposição referente ao tema. Laura gostou tanto que resolveu transferir a mostra do anexo para a galeria principal, de cerca de 50 metros quadrados.
— Uma galeria, com esse formato de um cubo branco, sem janelas, é uma espécie de alcova — diz Campos.
O resultado está em “Alcova”, exposição que será inaugurada amanhã, às 19h, com obras de 20 artistas, como Barrão, Ana Miguel, Lenora de Barros, James Kudo, Erika Verzutti, Leo Videla, Lucas Bambozzi, Márcia X, Tiago Carneiro da Cunha, Waléria Américo e Pedro Varela. Campos buscou inspiração nas casas de época brasileiras.
— E aí Machado de Assis é fundamental. Pesquisei sobre diversos ambientes em vários de seus romances. E a alcova é recorrente também na História da arte.
Originalmente, a alcova ficava em um compartimento superior da casa, disfarçado, com pé direito baixo. As mulheres podiam bordar ou se recolher, enquanto os homens recebiam visitas fora do convívio familiar. Campos trabalhou com dois aspectos de uma alcova.
— Ela tem um lado de aprisionamento, mas também tem um lado de sonho, de devaneio.
E, neste último sentido, Machado também se encaixou à perfeição.
— O quarto de um escritor é um lugar de invenção, é um espaço de criação.
As noções de liberdade e prisão se refletem nas obras. Walmor Corrêa botou um esqueleto de pássaro dentro de uma caixa de música. Daniel Murgel fez um desenho de uma gaiola dentro de uma casa. Regina Parra pintou um retrato com imagens de câmeras de segurança.
— Dá uma sensação de clausura para a pintura — diz Campos.
A maioria dos trabalhos já existia. É o caso das duas obras de Brígida Baltar. A primeira, “Canto brocado”, faz parte de uma série chamada “Passagem secreta”. É uma quina no chão, de cerca de um metro por um metro, irregular, que tem brocado com pó de tijolo da casa em que ela vivia.
— É um trabalho bem efêmero. Bota-se o pó na montagem, e, no fim da exposição, termina — detalha ela.
Pássaros na parede e máquina de escrever
Do chão para a parede. A outra obra, “Miniparede”, é feita com pequenos tijolos moldados a partir do mesmo pó.
— É uma parede para colocar numa parede. Essa sobreposição dá um estranhamento — diz Brígida.