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junho 3, 2009
Fronteira diluída entre arte e tecnologia por Eugênia Bezerra, Jornal do Commercio
Matéria de Eugênia Bezerra originalmente publicada no Caderno C do Jornal do Commercio em 3 de junho de 2009.
Questionamentos recorrentes da arte contemporânea persistem na segunda exposição do 47º Salão de Pernambuco
Encontros entre arte e tecnologia marcam a segunda exposição do 47º Salão de Artes Plásticas de Pernambuco. A coletiva O lugar dissonante será inaugurada hoje, às 19h, na Torre Malakoff, com instalações de Lourival Cuquinha e Hrönir, Giselle Beiguelman e Maurício Fleury (SP), Paulo Nenflídio (SP), Fernando Velázquez (Uruguai/SP) e Ricardo Carioba (RJ).
A curadoria é do artista plástico paulista Lucas Bambozzi e da pesquisadora e crítica de arte pernambucana Clarissa Diniz. Ele explica que a exposição tem um título ambivalente. “O lugar não é físico, mas talvez o lugar onde se encontra dentro do trabalho o seu ponto de interesse, conflito, dissonância”.
É como se essas obras estivessem ligadas pela maneira como lidam com o instante em que elementos confluem e adquirem uma forma ou sentido (seja ele consonante ou dissonante). “Encontramos nos artistas convidados a ressonância do interesse crítico diante dos contextos e suas relações sociais e físicas específicas, o que configura uma produção artística cada vez mais context-specific, que retira a arte de uma lógica objetual para pensá-la como experiência a um só tempo perceptiva-cognitiva-semântica, cujo foco se desloca exclusivamente para o sujeito”, relatam os curadores.
Segundo Bambozzi, a exposição nasce com uma diretriz definida e na expectativa da realização de outras mostras de arte e tecnologia (o que, de fato, está relacionado ao perfil que a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) pretende consolidar na Malakoff). “Buscamos trabalhos que se sobressaem não pelo uso da alta tecnologia, mas por tematizarem a tecnologia. Todos lidam com uma reorganização social, não só dentro da exposição, mas do espaço público”.
São obras que, além de exemplificarem a diluição das fronteiras entre as artes visuais e a música, permitem refletir sobre questões como a autoria, simultaneidade, erro, interação – entre outras. Nesses trabalhos, como ressalta Bambozzi, a tecnologia não leva as pessoas para a frente de um computador, mas para o espaço público.
Com Ouvidoria (2008), Lourival Cuquinha & Hrönir ressaltam a relação entre o público e o privado. Durante a exposição, as pessoas poderão utilizar gratuitamente alguns telefones públicos instalados na Malakoff – mas o áudio dessas ligações será transmitido para um espaço expositivo escuro e também mixados por um software (explicações sobre esse procedimento serão colocados nos orelhões).
Já Paulo Nenflídio estabelece uma relação entre o high e o low tech em Teia (2008). O trabalho é uma instalação sonora, que lembra um sistema nervoso, equipada com um sensor capaz de captar a proximidade de um corpo e acionar a emissão de sons.
Da parceria entre a artista plástica Giselle Beiguelman e o músico Maurício Fleury nasce Suite 4 mobile tags (2009). Neste ready-made, a dupla utiliza tags do QR-code, que podem ser lidos por celulares com câmera (que serão disponibilizados no local). Com a interação do público, os equipamentos tornam-se instrumentos para composição musical.
Outra experiência de criação coletiva acontece em Your life, our movie (2007), de Fernando Velázquez. “Queria criar um cenário de imagem em movimento, feito coletivamente e em tempo real”, explica o artista. Para isso, ele toma como base de dados as imagens e tags do Flickr (www.flickr.com). A partir de palavras sugeridas pelo público, o sistema busca as imagens no site e cria três vídeos que são projetados simultaneamente. Outro aspecto da obra é seu caráter transitório, já que os filmes não são armazenados.
Com Ylom (2009), o carioca Ricardo Carioba, dá continuidade às suas pesquisas com animação gráfica e áudio. A obra partiu das imperfeições em uma marcação sonora, causadas pela interferência dos processos analógicos de transmissão. Ele utiliza essa marcação para guiar o movimento de uma projeção na parede. O espectador é imerso neste espaço hipnótico, no qual o artista pretende provocar uma “interação que é, mais do que
física/mecânica, reflexiva”.
Até o fim da mostra (26 de julho) o 47º Salão promove outras ações relacionadas ao tema. Há planos para levar atividades ao Nascedouro de Peixinhos, e trazer o projeto Orquestra YouTube, do músico Marcelo Camelo.