|
fevereiro 3, 2009
Uma janela para as artes plásticas, por Suzana Velasco, O Globo
Matéria de Suzana Velasco, originalmente publicada no Segundo Caderno do jornal O Globo, no dia 1 de fevereiro de 2009
Artistas de Rio, Niterói, São Paulo, Belém e Ourinhos ganham o Prêmio Marcantonio Vilaça
É raro que artistas plásticos tenham a chance de ganhar R$30 mil, o acompanhamento de um crítico de arte por um ano, uma exposição itinerante pelas cinco regiões do Brasil e a publicação de um catálogo. Trinta tinham a chance, mas cinco foram os vencedores da terceira edição do Prêmio CNI-Sesi Marcantonio Vilaça, entregue na quinta-feira no Museu da Indústria, de Fortaleza. No dia seguinte, o carioca Eduardo Berliner, a niteroiense Rosana Ricalde, o paraense Armando Queiroz e os paulistas Yuri Firmeza e Henrique Oliveira aproveitaram para conhecer um pouco do trabalho um do outro.
— Ouvindo o Eduardo falar sobre seus cadernos de desenhos, pensei no meu processo de acumulação de objetos, que ficam num quarto de serviço — comentou Queiroz.
Quatro dos cinco já tinham tentado ganhar o prêmio
Com trajetórias de oito a 15 anos de criação, os cinco já têm parte de seus quartinhos de objetos particulares preenchida. Estão num momento crucial da carreira, em que já não são mais iniciantes, mas ainda podem ver suas vidas mudarem a partir de um prêmio. Persistentes, quatro deles já tinham se inscrito no prêmio, que homenageia o galerista e colecionador Marcantonio Vilaça, morto em 2000.
Quando se inscreveu pela primeira vez, Berliner já se dedicava à pintura, após ter se formado em design pela PUC-Rio, onde hoje dá aulas. Enquanto fazia um mestrado na Inglaterra, ele começou a experimentar aquarelas e colagens.
— Passei um ano fazendo colagens, mas pensando em forma de pintura. Quando experimentava no computador, às vezes me proibia de usar o comando “desfazer”, porque isso não seria possível na pintura — conta Berliner, de 30 anos. — Na faculdade, meus trabalhos já eram muito pessoais. O projeto final, em 1999, foi um livro com textos e desenhos meus, e desde então mantenho a prática diária de desenhar.
É um processo que se relaciona com o de Queiroz. O artista paraense também começou fazendo anotações regulares, porém sob a forma do acúmulo de objetos com os quais tinha um vínculo afetivo.
— Já passei quatro anos sem entrar no quarto de objetos. Eu acumulo, e às vezes vem uma água e limpa tudo — diz o artista, que, do trabalho com objetos diminutos, iniciado em 1993, passou a intervenções nas ruas de Belém, como numa instalação no telhado do mercado Ver-o-Peso, em 2005. — Percebi que os objetos poderiam dialogar com os espaços e as pessoas.
Queiroz, de 40 anos, também cria poemas visuais, com objetos e palavras. É aí que ele vê um vínculo com a obra de Rosana. A artista, que hoje vive em Rio das Ostras, faz um trabalho todo vinculado à palavra. Para ela, o momento em que conseguiu unir o conteúdo do texto à sua forma foi na obra “Alfabeto de verbos” (2000), em que todos os verbos da língua portuguesa foram datilografados em painéis.
— Ali eu comecei a fazer algo consciente. Mas, ainda hoje, o resultado visual da minha obra é consequência da escrita — diz ela, que, aos 37 anos, já fez obras inspiradas em textos como “Cidades invisíveis”, de Italo Calvino, e “As palavras e as coisas”, de Michel Foucault.
Rosana se inscreveu na primeira edição do prêmio, mas não foi selecionada. Agora, como os outros quatro, ela foi escolhida pelo crítico de arte Paulo Herkenhoff, pela historiadora e crítica de arte Aracy Amaral e pelo artista plástico Eduardo Frota. Originalmente, foram 353 artistas inscritos.
Premiado ficou famoso ao inventar artista japonês
O único entre os cinco que ainda não havia concorrido ao prêmio é Yuri Firmeza, cuja obra foi chamada de audaciosa e “sem empáfia” por Herkenhoff. Nascido em São Paulo, Firmeza morou 22 dos seus 26 anos em Fortaleza, onde estudou artes na faculdade. Seu nome se tornou conhecido há dois anos, quando ele inventou um artista japonês, Souzousareta Geijutsuka, e divulgou para a imprensa cearense uma exposição no Museu de Arte Contemporânea do Ceará, com a chancela da instituição. Muitos jornais publicaram reportagens sobre o genial japonês.
— Isso tem repercussão até hoje — conta ele, que costuma se inserir na obra, seja em fotos, vídeos ou performances, muitas vezes nu. — Começaram a dizer “o Yuri é aquele que fica nu”, então vesti roupa de novo.
Também nascido em São Paulo, porém no interior, em Ourinhos, Oliveira foi se fazendo artista aos poucos. Depois de estudar comunicação e artes, ele fez um mestrado em artes na USP, onde, num tapume que viu se decompor durante dois anos, criou sua primeira pintura sobre madeira. Hoje, sua obra ganhou escala monumental e está no limiar entre a pintura e a escultura.
— Até hoje meu pensamento se constrói na pintura. Trato a sobreposição dos planos de madeira como pinceladas, mas essas texturas acabam influenciando minhas telas também.