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novembro 7, 2008
Bienal de contrastes, por Paula Alzugaray, Revista Isto É
Bienal de contrastes
Matéria de Paula Alzugaray, originalmente publicada na Revista Isto É edição 2034, no dia 29 de outubro de 2008
Com trabalhos que evocam desde salas de estudo até playgrounds, 28ª Bienal de São Paulo oferece um misto de reflexão e diversão
De um lado, o debate sobre o modelo das exposições bienais e o papel da Bienal de São Paulo no circuito internacional. De outro, uma autêntica praça pública, com uma intensa programação de dança, performances, shows e apresentações musicais. Se os trabalhos instalados no terceiro andar do Pavilhão da Bienal favorecem uma atitude reflexiva, o andar térreo propicia as trocas sociais. Entre uma e outra proposta, o segundo andar permanece inteiramente vazio. Segundo a curadoria da 28ª Bienal de São Paulo, a cargo de Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen, o espaço desocupado tem a função de simbolizar “a busca de outros sentidos e de novos conteúdos” para o evento. “A praça é um lugar orgânico, sensual e lúdico, enquanto o plano de leituras no terceiro andar é um espaço para a contemplação e a reflexão”, afirma Ivo Mesquita à IstoÉ. Mas a grande surpresa do evento que foi anunciado no começo do ano como um fórum de reflexões e logo ganhou o apelido de “bienal do vazio”, é a presença de um tobogã instalado na fachada do edifício. O objeto parece ter a função de conectar os três andares do pavilhão e atenuar os contrastes do projeto curatorial.
“O que está em jogo é a relação com a arquitetura. O tobogã é pensado como possibilidade de locomoção e transporte na construção de edifícios públicos”, diz Mesquita sobre a obra do belga Carsten Höller. Os escorregadores gigantes – que já foram instalados também na Turbine Hall da Tate Modern, em Londres – funcionam, segundo o artista, como uma alternativa aos elevadores e escadas rolantes. A escultura é proposta como o protótipo de um novo mobiliário urbano. Mas no contexto de uma exposição auto-crítica, como se pretende esta 28ª Bienal, o tobogã de Höller é a metáfora inevitável da combalida relação entre arte e espetáculo. A questão a ser respondida aqui é: como a diversão pode se prestar à reflexão?
Playground, de Carla Zaccagnini, oferece uma possibilidade real dessa integração entre diversão e reflexão. Instalada no Bosque dos cegos, do Parque Ibirapuera, e formada por três brinquedos, três bombas d’água e uma fonte, a obra lança ao usuário uma charada: qual a relação entre a água e a atividade das crianças? A exemplo da experiência de deslizamento propiciada pela escultura de Höller e da força propulsora das crianças sobre as máquinas da instalação de Carla Zaccagnini, a proposta da bienal é incitar no público variadas formas de relação com as obras. Haverá desde momentos “festivos” – como as performances musicais da dupla Los Super Elegantes e o espetáculo da companhia de dança de Ivaldo Bertazzo – até as pausas para reflexão, em que o público será desafiado a decifrar os trabalhos. Isso pode ocorrer no centro de documentação do Archivo Abierto, ou no projeto de Mabe Bethônico, que monta um pequeno museu sobre o Parque do Ibirapuera, com arquivos, entrevistas, publicações e palestras. Em Phenotypes - Limited forms, projeto colaborativo entre o artista italiano Armin Linke e o pesquisador belga Peter Hanappe, o público poderá montar e imprimir seu próprio livro de fotografias. “Nós oferecemos um arquivo de fotos e deixamos o público manifestar sua própria interpretação sobre elas”, diz Armin Linke.
Entre os grandes espaços em branco e a participação de grandes estrelas, entre os 42 artistas convidados – como Sophie Calle, Marina Abramovic, Eija-Liisa Ahtila, Joan Jonas e Carsten Höller – a 28ª Bienal pretende discutir a “crise vocacional” do modelo das bienais. “O importante é perceber que existem múltiplas possibilidades de se fazer uma exposição de arte contemporânea e que a Bienal de São Paulo não tem que ter 200 artistas com 2 mil obras”, diz Mesquita. Caberá, no entanto, observar em que medida o atual projeto contribui para a discussão da crise institucional e da rejeição pública que envolvem a Fundação, após as denúncias e escândalos que vieram à tona nas últimas gestões.
Floresta invadida
Salão Arte Pará - Mapas Orgânicos/ Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém/ até 30/11
A intervenção urbana é uma prática bastante freqüente na arte contemporânea, mas desta vez a proposta é outra: nove artistas invadem uma área da Floresta Amazônica, em Belém. Convidados pelos curadores do Salão Arte Pará – evento que expõe obras de 23 artistas em quatro museus da cidade –, os artistas instalaram esculturas, pinturas e instalações no Parque Zoobotânico do Museu Paraense Emílio Goeldi, integrando-se e modificando ambientes como o Lago do Tambaqui, o Tanque do Peixe-boi e a Samaumeira. Walmor Corrêa e Armando Sobral inventaram animais e frutos inexistentes. Em Aliteração e heterogonia, Corrêa criou novas espécies animais, a partir de aves, roedores e jabutis empalhados. Em Artefatos, instalação feita com cuia e madeira, Sobral criou frutos gigantes em uma grande árvore. Já Clayton Nascimento, na instalação de cerâmica Metrópolis, e Melissa Barbery, no vídeo Apartamento 1102, optaram por contrastar o ambiente florestal à vida urbana.