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junho 12, 2019
Marcelo Silveira em Triunfo e Floresta, Pernambuco
Artista leva, em junho, a mostra Compacto com pacto às cidades de Triunfo e Floresta, no Sertão do estado
Não é de hoje que o artista Marcelo Silveira se preocupa em estabelecer diálogos. Em 2017, ele participou de uma residência em Belo Jardim, no Agreste do estado, durante dois meses, e uma das atividades era receber semanalmente moradores da cidade em torno da mesa para um jantar. Um ano antes, em 2016, apresentava a mostra Compacto com pacto, na Galeria Amparo 60, no Recife, na qual trazia obras de diversas fases de sua carreira postas em contato com trabalhos de outros artistas convidados. Agora, Marcelo se propôs a dialogar com duas cidades sertanejas e seus universos.
Como fica claro no nome da mostra, Compacto com pacto, a proposta é criar pactos, com + pactos. “Enquanto na mostra do Recife, eu colocava minhas próprias obras em diálogo, além de ampliar esse debate relacionando-as com trabalhos de outros artistas, propunha uma conversa entre os agentes do mundo da arte, as duas exposições de agora foram adaptadas, a essência ainda é a conversa, mas agora elas têm como interlocutores as pessoas desses lugares”, explica o artista.
A primeira parada acontece em Triunfo, a cerca de 400 km do Recife, no dia 14 de junho. Em visita preliminar a cidade, o artista teve contato com alguns elementos que fazem parte do imaginário local. Chamou-lhe a atenção a produção de relhos (espécie de chicotes em couro), realizada há anos por Seu Quadrado que, mesmo cego, tem perpetuado a tradição. Para essa conversa, Silveira buscou uma obra antiga que havia sido produzida por ele com chicotes, há cerca de 10 anos, intitulada de Compêndio de Doutrina. Essa conversa vai ser exposta na sala da base do teleférico da cidade administrada pelo Sesc.
Na sede da galeria que a instituição mantém na cidade, vão ser mostradas as obras que dão título à exposição, que foram produzidas a partir de fragmentos encontrados de cadeiras, quando emaranhadas, fixadas por uma tira de tecido ao teto, elas se movimentam pela movimentação dos visitantes na sala expositiva. Lá também estarão as propostas de troca do artista com a tradição carnavalesca da cidade, os caretas – figuras satíricas que andam mascarados durante o carnaval. Os adornos utilizados nas cabeças e suas tabuletas (placas em que são escritas frases satíricas como as típicas de para-choques de cami nhão) vão compor a mostra. “Ao est abelecer essa conversa com essas pessoas estamos falando de arte, de criação, de processo criativo. Tudo isso é muito interessante”, pontua o artista.
A comida também será novamente utilizada pelo artista como ponto de partida para o início de uma troca, afinal é na mesa que muitas conversas acontecem, ou, pelo menos, deveriam acontecer. O arroz vermelho, típico da região, mas muito pouco usado no restante do estado, surge como elemento central. Olhando para a sua história, o plantio desse tipo de arroz era bastante comum na região, mas com a chegada do arroz branco, ele perdeu espaço, chegando, inclusive, a ter seu cultivo proibido. “Todos os pacotes de arroz vermelho que encontrei não tinham a procedência de origem. Tinham tudo, até código de barra, mas não havia registro de onde eles teriam sido produzidos. Por que será? Vamos tentar refletir sobre isso juntando pessoas da região em torno de uma mesa”, explica o artista.
Marcelo Silveira também retomará, tanto em Triunfo como em Floresta, a intervenção sonora Tudo Certo, produzida durante a residência artística desenvolvida em Belo Jardim. Trata-se de um trabalho sonoro formado pela reprodução ininterrupta de um disco de vinil com gravação de dezenas de vozes de membros do coral da cidade agrestina, em diferentes timbres e entonações, a expressão "tudo certo". Uma escola em cada uma das cidades sertanejas será palco de uma nova experiência para o projeto.
Além do desenvolvimento de Tudo Certo, em Floresta, que fica a 433 km do Recife e 128 km de Triunfo, Compacto com pacto será inaugurada no dia 20, seis dias após a abertura na cidade vizinha, ficando, ambas em cartaz, concomitantemente. A mostra conta com o apoio da Galeria Casa Pedra Branca, fundada pelo arquiteto Fred Goyanna, que vai receber mais um recorte da série Compacto com pacto, entre outros trabalhos de Silveira.
O diálogo proposto pela mostra será com dois artistas e criadores locais, a pernambucana, natural de Floresta e radicada durante muitos anos em São Paulo: Conceição Cahu, falecida há oito anos. À frente de seu tempo, Conceição desenvolveu um consistente trabalho como chargista e ilustradora durante a década de 1970, se envolvendo em causas feministas e políticas durante o período da ditadura militar. “Apesar de seu trabalho amplamente reconhecido, ela é muito pouco conhecida e falada em Pernambuco. Através dessa mostra, que propõe diálogos e trocas, me interessa muito fazer com que pessoas, trabalhos e nuances pouco vistos possam ser r econhecidos”, diz Silveira. A rede de diá logos se expande e também inclui uma performance do agitador cultural, também natural da cidade, Vavá Paulino (Vavá Schön -Paulino). “Acreditamos que dessa forma vamos conseguir mostrar Floresta de uma maneira diferente”, completa Silveira.
Assim como em Triunfo, um elemento da gastronomia da região foi escolhido para entrar na roda. Ao chegar à cidade na fase de prospecção Marcelo Silveira e sua equipe perceberam, entre as características da cidade, a grande consciência de patrimônio histórico, com o casario sendo conservado, mesmo sem qualquer imposição legal, e a grande quantidade de pés de tamarindo espalhadas pelas ruas. Logo, o fruto foi escolhido como esse elemento gastronômico a representar a cidade. Diferentemente da cidade vizinha, onde será promovido um encontro em torno do arroz vermelho, em Floresta o tamarindo vai entrar enquanto imagem na exposição.
Segundo a curadora, Joana D´Arc, os trabalhos em exposição trazem características marcantes do trabalho de Silveira, que utiliza, habitualmente, coisas e objetos esquecidos, técnicas e procedimentos obsoletos, na construção de sua poética, colocando diversas camadas de tempo em diálogo. “Nossa ideia é que esses pactos que criamos sejam refeitos ao longo do tempo, reposicionando algumas obras, vamos gerar novas conversas, novos ruídos, nossa ideia é brincar com essa ressignificação”.
Para o artista, além de colocar suas obras para conversarem com as duas cidades e seus elementos culturais, ele também está colocando as duas cidades para dialogar entre si, fazendo uma espécie de pacto, de troca, no momento em que ambas vão manter a exposição em cartaz concomitantemente e que gerarão interessantes reflexões. O projeto tem patrocínio do Funcultura e o encerramento das mostras nas duas cidades acontece em 3 de agosto de 2019.
ABERTURAS
Triunfo, 14 de junho de 2019, sexta-feira, às 19h30
Galeria de Arte Triunfo
Praça Dr. Artur Viana Ribeiro 59, Alto da Boa Vista, Triunfo, PE
87-3846-1341
Floresta, 20 de junho de 2019, quinta-feira, às 19h30
Casa Pedra Branca
Praça Antônio Ferraz 141, Centro, Floresta, PE
Segunda a sexta, das 9h às 12h e das 15 às 19h
87-99983-7085