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abril 1, 2017

Para que eu possa ouvir por Douglas Negrisolli

Para que eu possa ouvir

DOUGLAS NEGRISOLLI

Para que eu possa ouvir, Adelina Galeria, São Paulo, SP - 04/04/2017 a 20/05/2017

O condicional é de propósito, ele depende de você para agir. Depende de uma ação. Como o próprio nome diz, condicional é gerador de uma condição, de uma proposta, de um valor. Aqui há uma relação simples como propusemos e o sentido de se ouvir uma exposição de artes visuais. Como se ouve uma exposição que é visual?

É com o coração. Se ouve com o silêncio ou com o barulho, da forma que você se sente melhor para refletir.

A exposição que traz artistas diversos da mais recente produção brasileira e latino-americana convida a pensar sobre uma questão fundamental, que é o conceito de alteridade. O olhar com alteridade é aquele que olha para uma pessoa e se coloca no lugar dela, e a partir desse olhar é que se pode perceber, tentar compreender uma parte do que aquela pessoa é/vive. É um processo difícil pois consiste em destruir idiossincrasias que estão enraizadas no nosso ser e proporcionar um olhar novo, aberto ao novo.

Todos os artistas que participam desta mostra falam sobre um silêncio. Alguns de forma mais brutal como João Tolomei Opriê, no meio da floresta e em conexão com o homem natural, com a raiz daquilo que nos cerca, metaforicamente falando, como um retorno a paz. João parte da referência da natureza e do corpo nu para se apropriar do silêncio que a mata lhe proporciona, e pode incitar diversas dúvidas e questionamentos, esperando que os gritos silenciosos possam dar vazão a dor do ser no mundo capitalista, artificial e da angústia da solidão.

Cristina Suzuki se refere às chitas, a herança da azulejaria portuguesa e de outros ícones como os panos de chão populares, e dá um tom politizado à mostra. A artista quer nos passar a essência da burocracia, do antagonismo entre o progresso e a ordem, de uma forma quase como um expurgo de tudo isso.

Erica Kaminishi faz do seu silêncio (ou dos silêncios, pois ele não é único), uma série composta por poemas escritos incansavelmente que falam sobre o lugar. Erica evoca o seu não-lugar, e assim nos intriga com nosso lugar espiritual, a conexão que temos com o outro, o metafórico.

Rodrigo Linhares traz na série Taurus uma série de autorretratos que com uma lembrança do minotauro, provoca um misto de dor e desespero. O interessante é que aqui, Linhares nos coloca como parte de sua experiência, ou somos nós que nos colocamos através de seu corpo?

Renan Marcondes apresenta duas obras inéditas: o púlpito serve para elevar e para dar atenção a alguém quando a pessoa vai falar, e tem seu uso intensivo em Igrejas, de várias dominações, além de ser uma peça presente na política. O confete cita sobre a discussão da Igreja com os LGBTs. É a necessidade do convívio que liga esses púlpitos, que os cola. O vídeo de Marcondes é uma constante espera, uma constante ação que irá desencadear algo estarrecedor, mas ele nos deixa apenas na espera, sem um fechamento possível.

Thiago Toes parte de uma experiência também da solidão, um pouco diferente do que João Tolomei Opriê. Parece que Thiago Toes está numa relação do seu eu interior com o eu social, usando a solidão no contemporâneo como o mote principal em suas pinturas.

Beatriz Lecuona e Óscar Hernández produzem obras que permeiam entre discussões do espaço e da forma, especialmente ligados ao consumo da imagem interior-exterior. A dupla cita nas obras o papel do prazer na sociedade contemporânea, até como permeiam a relação do espaço-corpo, do corpo emergindo no espaço.

Francisco Valdés experimenta com imagens bucólicas que refletem sobre a própria história dos objetos e de uma maneira geral, sobre a paisagem. A imagem que ele monta e remonta na pintura são como lembranças, vultos daquilo que uma hora existiu.

Stephan Doitschinoff traz nesta exposição uma pintura inédita, que dialoga em meio aos símbolos que utiliza, como os sacos de lixo no pódio, questionando talvez, o próprio lugar que ocupamos e da noção de progresso, de mérito, de vencidos e vendedores, criando essa relação de equilíbrio e desequilíbrio com o outro.

Douglas Negrisolli
curador

Posted by Patricia Canetti at 1:25 PM