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CONVOCAÇÃO
9 de março de 2002,
sábado, às 17 horas
A Escola de Artes Visuais
convoca artistas, amigos, alunos e demais integrantes da comunidade cultural
brasileira para um ato de apoio à permanência da Escola nas dependências
do Parque Lage, no momento ameaçada pelo término do Contrato de Cessão de
Uso em maio de 2002.
Despejar uma Escola
que dá certo ?! Despejar 600 alunos e toda uma comunidade artística ?!
Escola de Artes Visuais do Parque Lage
Rua Jardim Botânico 414 - Rio de Janeiro
Tel: 21 2538-1879 / Fax: 21 2537-7878
www.eavparquelaje.org.br
eav@eavparquelaje.org.br
Escola de Artes Visuais do
Parque Lage e Despejo, o Pesadelo Continua
Clarisse Tarran
Para se compreender a complexa rede, que circunda
os anos de luta pela permanência da Escola de Artes Visuais do Parque Lage,
no Rio de Janeiro, devemos retroceder no tempo para anos antes de sua fundação
em 1975, sob a direção de Rubens Gerschman. Neste longo e perverso jogo político,
as intenções são "claras" apenas nos corações gananciosos de homens e instituições
poderosas. Em nenhuma ocasião, desde a desapropriação do Parque após a morte
de seu proprietário, o poderoso armador e industrial Henrique Lage, foram
considerados os interesses comunitários, urbanísticos, ecológicos e culturais,
da cidade.
Este Parque, de utilidade pública desde 1976
e reconhecido como Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, já correu vários
riscos, tais como ser transformado em cemitério ou condomínio de luxo (projeto
este que resultou em Comissão Parlamentar de Inquérito) até à infeliz pretensão
de Museu de Taxidermia, pouco antes da ECO 92. É indigno e bizarro que nesse
país continuem acontecendo situações como esta pela qual novamente passa
a Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Despejar
uma Escola que dá certo ?! Despejar 600 alunos e toda uma comunidade artística
?!
Esta Escola sobrevive de recursos arrecadados
de seus estudantes, apesar de ser estadual. É viva, e pulsa entre momentos
de brilho artístico e outros de retomada de fôlego após as batalhas que trava
pra existir. Ainda é referência cultural nacional e internacional, instituição
única neste país. Apesar de não ter a atenção e os recursos da imprensa e
dos cofres públicos, como temos visto no processo de entrada da Fundação
Guggenheim no país, por exemplo, ela insiste em sua existência e continua
a formar grandes artistas, tais como, Adriana Varejão, Beatriz Milhazes,
Brígida Baltar, Chico Cunha, Cristina Canale, Cristina Salgado, Daisy Xavier,
Daniel Senise, Ernesto Neto, Franklin Cassaro, José Bechara, Leda Catunda,
Livia Flores, Tatiana Grinberg entre muitos, além de diretores e professores
como, Anna Bella Geiger, Celeida Tostes, Charles Watson, Fernando Cocchiaralle,
Iole de Freitas, Ligia Pape, Luís Ernesto, Luíz Áquila, Nelson Leirner,
Paulo Sergio Duarte, Reynaldo Roels, Roberto Magalhães, entre outros.
Uma Escola reconhecida e parceira de instituições
como a Ècole de Beaux Arts, em Paris, Instituto Goethe e British Council,
que expõe, Cildo Meireles, Regina Silveira, Nelson Félix, Luís Alphonsus,
Iberê Camargo, Burle Marx, também citando apenas alguns, deve ser perpetuada
não por 10 anos como foi no último acordo, mas por cem. A casa, de ecletismo
arquitetônico singular, foi projetada para abrigar os caprichos e vaidades
de uma cantora lírica em suas apresentações e célebres festas. Um cenário
para uma diva. Com palcos de mármore italiano, estrelas douradas em teto
celeste, piscina em pátio interno e outras peculiaridades. Seria absurdo
e incoerente cerrar suas portas ao público e ali abrigar escritórios fechados,
postos, vestiários, frotas, acervos e todo tipo de aparato para instituições
burocráticas, como atestou o próprio Iphan anos atrás, quando quiseram transformá-la
em Museu de Botânica. Não há maior coerência, do que a afirmação de que aquele
lugar é destinado à Arte e à Natureza. Devemos portanto ser "conservadores"
neste sentido, agentes preservadores e criadores de recursos. Não vamos desistir
! Continuaremos a aguardar uma ação de restauração, maior adequação da casa
à escola e uma atitude definitiva e justa por parte de nossos governantes,
para que nossa única e portanto essencial escola de arte livre, permaneça
onde está e oxalá continue de portas abertas a todo e qualquer cidadão que
ali entre, quer seja para aprender, pesquisar, ou apenas conhecer um pouco
da nossa história e beleza.
20/02/2002
Clarisse Tarran
Produtora e assistente da Direção da EAV de
1990 a 1994, Artista Gráfica e Plástica, e atual aluna.
Este texto consigna idéias surgidas em debates
entre alunos e artistas neste período, e teve a colaboração de Marcelo Catalano,
Mauro Espíndola, Claudia Hersz, Naila El Shishimi, Alexandre Lambert, Hileana
Menezes, André Alvim, Patrícia Assunção, Marcelo Valls, Regina Jourdan e
Patricia Canetti.
A ESCOLA DE ARTES VISUAIS
E O PARQUE LAGE
Introdução
A Escola de Artes Visuais (EAV) , órgão
da Secretaria de Estado de Cultura,foi criada em 1975, substituindo o antigo
Instituto de Belas Artes (IBA), criado em 19 de junho de 1950 e que inicialmente
funcionava na Praia Vermelha. Em 1966, o Governador Negrão de Lima regulamentou
a transferência do IBA para o Parque Lage.
Em 1976 o Parque Lage passou para o domínio
da União que em 77 cedeu-o ao IBDF (hoje, IBAMA- Instituto Brasileiro do
Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) para ampliação da área
do Jardim
Botânico, sob a forma de utilização gratuita,
pelo Decreto Presidencial nº 80.494, de 05/10/77. Após caloroso período de
manifestações de toda a classe artística e tentativas de negociação com o
IBAMA, a Escola de Artes Visuais foi autorizada a permanecer no Parque Lage
pelo prazo de dez anos, através de Decreto Presidencial datado de 15 de abril
de 1991.
Em 18 de dezembro de 1996 a 23ª Vara de
Justiça determinou que a ocupação da Escola de Artes Visuais do Parque Lage
ficasse restrita ao conjunto arquitetônico, composto pela Mansão dos Lage
e seus anexos,
voltando a administração da área verde para
o IBAMA.
ASSOCIAÇÃO DOS AMIGOS DA
ESCOLA DE ARTES VISUAIS -AMEAV
Em 25 de fevereiro de 1992 foi assinado um
termo de convênio entre o estado do Rio de Janeiro, através da Secretaria
de Estado de Cultura e a Associação dos Amigos da Escola de Artes Visuais
- AMEAV, sociedade civil sem fins lucrativos, visando uma cooperação técnica
para o desenvolvimento e aprimoramento das atividades da Escola de Artes
Visuais. Cabe a AMEAV auxiliar na administração e no custeio da manutenção
da Escola.
A ESCOLA DE ARTES VISUAIS
Resumo Histórico
A Escola de Artes Visuais foi fundada pelo
pintor Rubens Gerchman em 1975. Até então, funcionava no Parque Lage desde
1969, o Instituto de Belas Artes, o IBA, que seguia uma orientação de ensino
tradicional
e acadêmica. Gerchman mudou inteiramente a filosofia
da escola e convidou diversos artistas para compor o quadro de professores.
Entre eles se destacavam Roberto Magalhães, Eduardo Sued, Celeida Tostes,
Dionísio Del Santo, Gastão Manuel Henrique, Hélio Eichbauer e Alair Gomes.
A escola, neste período ainda marcado pela ditadura militar, tornou-se então
um espaço de resistência extremamente dinâmico, uma espécie de território
livre, aberto a todo tipo de manifestação que, impedida pela censura e a
repressão, encontrava no Parque Lage um espaço ideal. Muitos shows de música,
exposições, projeções de filmes, poesias e peças teatrais foram realizados
na época. Paradoxalmente a escola era mantida pelo prório estado, que pagava
os professores e materiais básicos, tornando os cursos bastante baratos e
consequentemente atraindo um grande número de alunos. Ao final de sua gestão,
em 1978, Gerchman
já se ressentia do corte progressivo de verbas
vindas do estado, gerando dificuldades financeiras para a escola.
Com sua saída muitos artistas deixaram a
EAV. Rubem Breitman, o diretor então nomeado, convidou vários pintores para
preencher o quadro docente, entre eles Luiz Áquila, John Nicholson e Charles
Watson, preparando assim o caminho para a formação dos artistas da chamada
geração 80, que participariam anos depois da polêmica exposição "Como vai
você, Geração 80?" Evento que marcou fortemente a história da EAV, realizado
em 84, durante a direção de Marcus Lontra. Posteriormente ocuparam a direção:
Frederico de Morais, Luiz Áquila, João Carlos Goldberg, Luiz Alphonsus de
Guimaraens e atualmente Luiz Ernesto Moraes. Durante a gestão de Goldberg
foi criada a Associação de Amigos da Escola de Artes Visuais, a AMEAV, que
presidida pelo pintor Carlos Scliar e pelo colecionador João Leão Sattamini
Neto (atual presidente), tem viabilizado a administração financeira e o
funcionamento da escola.
Estrutura e Filosofia de Ensino
A Escola de Artes Visuais tem sua filosofia
de ensino comprometida com as questões da arte contemporânea. Seus quase
50 cursos são orientados por artistas e críticos de reconhecida atuação em
suas áreas. Seus programas são organizados por cada professor e submetidos
à direção da escola. Esta característica tem permitido uma grande flexibilidade
de estrutura, diversidade de abordagens e orientações, já que as particularidades,
interesses e experiências singulares de cada
artista ou crítico/professor serve de base na
elaboração do programa de seus cursos. Os alunos podem se matricular livremente
nas aulas que melhor se adequem ao trabalho que estão desenvolvendo, construindo
assim um percurso individualizado . A EAV é uma escola aberta, sem pré-requisitos,
onde os alunos podem frequentar variados cursos e individualizar seu currículo
de acordo com sua disponibilidade e interesse, experimentando um espaço de
convivência intenso, dinâmico e livre.
Considerando que uma escola não deve se limitar
a ser uma mera repassadora de conhecimentos, modelos e prescrições já estabelecidos
e autorizados histórica e socialmente, mas discutí-los, repensá-los, e atuar
de forma não passiva, a EAV mantém uma reavaliação constante de seus cursos
e de sua própria estrutura no sentido de atualizá-los, acompanhando o desenvolvimento
das artes plásticas contemporâneas.
A Escola é responsável pela formação de uma
inumerável quantidade de artistas do Rio de Janeiro , alguns dos quais com
projeção internacional. No entanto, a EAV não visa, necessariamente, a formação
de artistas, mas sim dar uma formação em arte, oferecendo um espaço a todos
aqueles que buscam um lugar diferente para explorar seu potencial e ampliar
seus horizontes. A filosofia da Escola de Artes Visuais tem sido o de estimular
uma inquietação produtiva em seu projeto de ensino , contribuindo na busca
de novos significados para a arte na sociedade e novos modos de expressá-los.
Outras Atividades
Desde sua construção, a Mansão dos Lage,
vem reafirmando sua vocação como espaço para as mais diversas formas de manifestações
culturais. "Terra em Transe" de Glauber Rocha e "Macunaíma" de Joaquim Pedro
de Andrade, foram dois importantes filmes que utilizaram a Mansão como locação.
Em 1981, morre Glauber Rocha e seu velório acontece no Salão de Mármore
da Escola do Parque Lage.
Dando continuidade a esta vocação a Escola
de Artes Visuais é palco de inúmeras formas de expressão artísticas que
vão de lançamento de livros a espetáculos teatrais e shows de música, de
exposições à
palestras e seminários. Seus espaços são utilizados
como locação de inúmeros
filmes e produções de TV.
"Asdrubal Trouxe o Trombone", importante grupo
teatral que revelou nomes como Regina Casé, Hamilton Vaz Pereira, Evandro
Mesquita, entre outros, realizou nos espaços da Escola, suas primeiras apresentações,
no
final dos anos 70.
De 1980 a 1984, Paulo Reis, diretor do grupo
teatral "Pessoal do Despertar", que contava com nomes como Maria Padilha
e Miguel Fallabela, montou "A tempestade" de Shaekespeare e "O Círculo de
Giz". Outros diretores como José Celso Martinez Corrêa e Christiane Jatahy
também realizaram peças de grande repercussão, sendo que esta última realizou
montagens para o público infantil, recebendo diversos prêmios.
Nos espaços da Escola também se apresentaram
importantes músicos como Gilberto Gil, Caetano Veloso, Rita Lee, Tim Maia,
Egberto Gismonte, Paulo Moura, Eduardo Dusek e muitos outros.
Entre as inúmeras exposições realizadas na
EAV, algumas foram particularmente marcantes para as artes plásticas brasileiras.
Entre elas "Como vai você, geração 80?", em 1984, com a participação de 123
artistas e que foi visitada por um público de 15.000 pessoas. Outras exposições
importantes foram "Território Ocupado", 1984, "Déjeuner sur L'art",1988,
"Olhar Van Gogh", 1989. Também em 89, com a curadoria do crítico Frederico
Morais, foi realizada a primeira mostra de Arthur Bispo do Rosário, um interno
da colônia Juliano Moreira, e que hoje tem suas obras apresentadas em importantes
instituições internacionais.
Em 2000, a Escola inaugurou um novo espaço
de exposições aberto ao público no prédio anexo à Mansão, as Cavalariças,
que desde sua inauguração vem apresentando uma programação que já a tornaram
um dos
espaços mais instigantes do Rio de Janeiro.
Nomes como Cildo Meireles, Regina Silveira, Ana Tavares, Nelson Félix, Daniel
Senise, Wanda Pimentel e Luiz Alphonsus são alguns dos artistas que desenvolveram
projetos específicos para este espaço.
Convênios
O reconhecimento internacional da Escola de
Artes Visuais tem se manifestado através de inúmeras parcerias com instituições
estrangeiras e consulados no Brasil o que tem viabilizado a visita constante
de artistas e críticos dos mais diversos países, muitos dos quais oferecendo
cursos e palestras na Escola. Nomes internacionais como Daniel Buren, Antônio
Muntadas, Jean Marc Bustamanti, Arman, Bill Woodrow entre outros vizitaram
a EAV, atraídos pela repercussão da escola no exterior.
Há cerca de três anos a Escola mantém com
a Ecole de Beaux Arts de Paris um programa de intercâmbio de alunos, recebendo
a cada semestre um aluno francês em seus cursos e enviando um aluno brasileiro
a Paris por período semelhante.
Em 2001, a Escola de Artes Visuais celebra
com a Universidade Cândido Mendes um convênio visando a elaboração e o oferecimento
de cursos inéditos no ensino de arte e comunicação visual de nível superior
e
de pós-graduação.
Programa de Restauro e Reestruturação
dos Espaços
"Mansão dos Lage"
Elaborado por iniciativa da AMEAV em conjunto
com a direção da Escola de Artes Visuais, o programa de restauro e recuperação
do conjunto arquitetônico do Parque Lage tem sido uma das prioridades adotadas.
Assim , a partir de estudos e projetos iniciados
em 1996 foi executada uma primeira etapa de obras emergenciais no palacete,
patrocinadas pelo Ministério da Cultura, através do Programa Nacional de
Apoio à
Cultura, com o acompanhamento e supervisão direta
da 6ª Coordenação Regional do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional. Nesta primeira etapa foi realizada a impermeabilização da cobertura
e o
aperfeiçoamento do sistema hidráulico e elétrico
da "Mansão dos Lage".
Dando continuidade ao Programa, em agosto
de 1997 foram contratados o projeto de reordenamento dos usos para as edificações
históricas, e a avaliação do estado de conservação de todo o interior e exterior
do
conjunto arquitetônico do Parque Lage. Este
projeto está aprovado na Lei de Mecenato do Ministério da Cultura, sob o
nº do PRONAC 97 3322.
Pavilhão das Cavalariças
Em 1998 foram iniciadas obras emergenciais
no Pavilhão das Cavalariças financiadas pela AMEAV. Já foram realizadas a
limpeza de calhas e tubos de queda, remoção do forro infestado de cupins,
recuperação do madeiramento do telhado e troca das telhas. Este espaço hoje
é destinado às exposições de arte da EAV, abertas gratuitamente ao público.
Está também previsto a instalação de um restaurante em um dos ambientes
deste pavilhão, oferecendo mais uma opção de
conforto e lazer para os visitantes do Parque e da Escola.